«Mais brincadeira…»

Lígia Silveira, Agência ECCLESIA

Uma cena quotidiana de um filho de sete anos e os pais a tomar o pequeno-almoço:

«Menos brincadeira e mais pressa a tomar o pequeno-almoço», diz a mãe a olhar para as horas; «Mais brincadeira e menos limpeza», responde a criança perante a azáfama da mãe que despacha a arrumação para passar a outra etapa das manhãs de cada dia.

Aquela resposta foi um abanão na rotina automática e repetitiva – naquele instante soaram campainhas na cabeça que ora diziam: «raio do miúdo sabido com resposta certeira», ora soavam «o rapaz vê mais longe e desarmou-te».

Na rapidez e esperteza da resposta, eis a constatação do que realmente importa e o confronto com o que elegemos fazer e valorizar, mesmo que interrogados pela necessidade de responder às solicitações imediatas do dia.

Somos escravos das horas, das tarefas, das preocupações para que nada falte, para que tudo encaixe, para que as necessidades sejam atendidas, cumprindo afazeres e dando respostas a solicitações laborais e familiares, e, no entretanto, tentando não esquecer as pessoais, o lugar da brincadeira chega pela voz desarmante de quem deve continuar a privilegiar esta como a tarefa principal da sua vida.

«Mais brincadeira…» revelou a altura do olhar de uma criança que valoriza as coisas certas, perspetiva feliz o que tem à sua frente e com isso experimenta, constrói, sonha.

«Mais brincadeira…» é um grito vindo da inocência inteligente, sensível e assertiva de uma criança, que nos desarma com a verdade perante todas as responsabilidades que se vão adquirindo na vida adulta.

«Mais brincadeira…» convida a ir ao essencial da vida, um desafio para que se atenda ao espanto, ao lúdico, ao sem consequência, ao deixar o espaço e o tempo para depois, porque agora a brincadeira é a protagonista natural desse tempo e desse espaço.

«Mais brincadeira…» é um convite a escutar o tempo, a parar o tempo, a parar no tempo.

«Mais brincadeira…» é implicativo porque cria relação, revela confiança, desafia a mudar o olhar, cria empatia e alarga o mundo.

«Mais brincadeira…» mostra que hoje é isto que importa: brincar! E a perceber que, com o brincar, experimentamos o amanhã.

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