Voto a pensar em mim ou a pensar em Portugal?

António Capela

É frequente exigir-se ética à classe política. Sobretudo, em momentos de campanha eleitoral, é crucial o apelo à honestidade, à transparência, também à capacidade de evitar a excessiva crispação e polarização. É fundamental que os políticos sejam claros, que digam ao que vêm; que sejam sensatos, que não prometam o que não podem cumprir; que saibam ouvir as pessoas na rua, que não seja uma campanha só para vender ideias; que sejam nobres perante os adversários, que não caiam no insulto gratuito.

Porém, esta ética da classe política está incompleta se não for complementada com uma ética do votante. Aliás, se, por um lado, uma atitude responsável dos políticos ajuda a elevar o nível da democracia; também, ter votantes mais exigentes obriga os políticos a tornarem-se mais virtuosos. “Cada país tem o governo que merece.”

Um voto ético e responsável valoriza discursos de união, não procura o interesse próprio. Um jovem, um reformado, um funcionário público, ou um trabalhador privado não deve votar em quem promete mundos e fundos ao seu grupo particular. Um voto ético está simbioticamente ligado a um profundo sentimento patriótico. Todas as partes da sociedade beneficiam e precisam do bem do todo. Como diz muitas vezes o Papa Francisco: “A união é superior ao conflito” – eis um óptimo lema.

O voto deve estar inspirado nas questões: O que é justo para a sociedade? O que é o melhor para o país? O patriotismo é a receita que faz vencer os egoísmos e promove a verdadeira eficácia no voto. A política não deve ser o resultado do conflito, mas sim o apelo a algo maior, que supere o conflito; não deve ser um choque de interesses distintos, mas a sua integração e harmonização num interesse superior, no interesse de todos, no interesse nacional.

A irrelevância do critério de verdade, a desconfiança em relação à cultura de diálogo, a visão apaixonadamente futebolizante, tribalista e maniqueísta da política  são doenças que têm contaminado o nosso ambiente político. Infelizmente, esta forma de estar faz parte do código identitário de muitos partidos em Portugal; os agentes políticos, de um modo geral, têm tido dificuldade em ultrapassar esta visão e em centrar-se naquela que deve ser a sua única missão – procurar, propor e servir o interesse nacional.

Neste sentido, a boa atitude política não deve ser encarada como um jogo de ténis, no qual o objectivo de um lado é complicar a vida do outro, no qual uma facção quer aniquilar a outra. O exemplo a cultivar é outro: o das raquetes de praia, desporto no qual ambas as partes trabalham e cooperam para manter a bola sempre no ar, dois lados distintos comungam, participam e colaboram para um mesmo objectivo. Trata-se de ver que o bem do outro é também o meu bem; que cooperando (e não disputando) vamos mais longe; que assim, no fim, todos ficam a ganhar.

Numa das suas célebres citações, Sá Carneiro propõe que se coloque em primeiro lugar os interesses nacionais e somente depois os interesses partidários. É por aqui o caminho. Até podemos ir mais longe e afirmar que o objectivo da política deve ser a total superação do interesse partidário, de modo a que consciência dos eleitores esteja profundamente impregnada do interesse nacional. A receita não é escolher quem mais me beneficia, não é promover ódios e invejas sociais – é beneficiar os partidos que abraçam todos sob a mesma bandeira, que criam um desígnio, que superam a consciência de classe com a consciência nacional.

Claro que existem diferentes visões daquilo que é o interesse nacional. Daí existirem diferentes ofertas políticas. Este é o exercício do votante: primeiro, excluir as propostas que são divisionistas e que promovem interesses particulares; segundo, dentro das demais, escolher a visão que melhor serve o bem-comum.

O segredo está em lembrarmo-nos que, antes de sermos ricos, ou pobres; velhos, ou novos; trabalhadores do público, ou do privado; do campo, ou da cidade; do litoral, ou do interior; do norte, ou do sul – antes e acima de tudo isso – somos portugueses.

António Capela

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Agência ECCLESIA

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