Um púlpito para escutar

Tradicionalmente, o púlpito serviu para o sacerdote transmitir o seu sermão aos fiéis. Actualmente, é o ambão o lugar de que ele se serve para fazer a sua homilia. Na Liturgia da Igreja, celebramos a fé através de palavras e gestos organizados em favor de uma comunidade que se reúne. A Liturgia é, sobretudo, de e para a comunidade, onde cada crente se integra. Desde o início da minha experiência pela Internet ressoou a pergunta: – Onde é que está o “púlpito” para dar voz aos fiéis, uma voz que não seja generalizadora, mas que seja a voz real de quem se dirige a Deus desde o seu profundo, muitas vezes sintomatizada em dramas que nem sempre encontram eco incisivo na “voz litúrgica”? Esta cisão não é um problema da Liturgia! Talvez seja um dos efeitos da rara disponibilidade que hoje os ministros de Deus têm para escutar os indivíduos. “Muitas vozes, poucos ouvidos” poderá ser a caracterização plástica de novos “mutantes” em que se poderão estar a transformar os homens na sociedade em que vivemos. É aqui que me parece que as novas tecnologias da informação e comunicação nos vêm dar um auxílio precioso no serviço de acompanhamento humano, preenchendo uma lacuna existente entre a relação entre pastores e fiéis. Hoje, para sublinhar o encontro humano de qualidade não frequente entre os padres e as multidões de fiéis, incluindo as multidões de não crentes, defende-se que não há nada que substitua o encontro pessoal. E nesta verdade se descansa, mesmo se não se dá muito tempo para acolher pessoalmente, tão atarefados que estamos, os presbíteros, com actividades e estruturas. E, aqui mesmo, paro para perguntar: – O que é mesmo o “encontro humano”? Quais são as suas características principais? Será só o encontro “em carne e osso”? E como definir a voz do “eu” profundo, capaz de verbalizar o que presencialmente é sempre difícil, a não ser pela ambígua aparência dos gestos e disposições físicas? Esta defesa do encontro humano também costuma protelar o real encontro cara-a-cara que as pessoas tanto esperam. Este encontro é mesmo muito importante, seja na forma presencial, porventura a mais marcante, seja noutras formas hoje possibilitadas através das novas tecnologias de informação e comunicação. Partilho a minha experiência: Em www.padretojo.net, para além da partilha de subsídios, apontadores úteis e conteúdo temático, encontra-se à disposição um “púlpito para escutar”. A ideia de desenvolver este discreto “púlpito” aconteceu quando, nas estatísticas experiência inicial daquele sítio, observei que as pessoas que me escreviam (mais de 50 %!) procuravam a palavra “padre” através do Google. Eram, na maioria, pessoas desconhecidas que procuravam um representante de Deus para desabafar os seus dramas mais profundos, sem crivos de preconceito. Desde então, leio as questões que me apresentam. Tento responder com a possível rapidez e brevidade. Se é necessária uma resposta mais qualificada, anuncio a mesma através de um “olá” simples que promete uma resposta mais qualificada. Depois de alguns anos, esta experiência “amarra-me” ao computador. Compaginando esta aventura da relação humana com muitas outras responsabilidades, acolho pessoas quer em encontros presenciais, quer através da Internet, umas vezes em tempo real (Instant Messenger, Skype…), outras, a maioria, através do “púlpito”, via e-mail. Este é o meio mais frequente para quem tem tido necessidade de pôr questões dramáticas, muitas vezes difíceis de apresentar em tempo real. Devo dizer também que este meio é o mais profundo, porque a pessoa é capaz de pôr as questões de forma mais descritiva, que muitas vezes não se tem em directo. Podemos dizer que a verbalização como ponto de partida psicológico para a resolução de problemas está hoje também na ponta dos nossos dedos. A possibilidade que estes novos meios oferecem de comunicar sem ser em tempo real possibilita-nos não estar sempre diante do computador, de forma a poder integrar este meio e a comunicação que com ele se desenvolve com a vida quotidiana, procurando e oferecendo em profundidade. Assim o centro da comunicação não será tanto o computador e a Internet, mas a pessoa e as suas circunstâncias. Enfim, estou certo de que estas novas formas de relação proporcionadas pelos novos meios de comunicação são um “lugar propedêutico” do encontro humano e sacramental que não se deve pastoralmente desaproveitar. Pe. António Jorge, padretojo.net

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