Novas tecnologias, novas relações

Foi no Concilio Vaticano II que a Igreja assumiu com decisão a importância dos Meios de Comunicação Social (MCS) no mundo contemporâneo. Do Concílio saiu não só um documento (o decreto Inter Mirífica) como a instituição de um organismo (a Pontifícia Comissão para as Comunicações Sociais) e de um dia especialmente dedicado aos MCS (o Domingo da Ascensão), escrevendo cada ano o Papa uma carta sobre um tema neste âmbito. É neste contexto que surge esta Mensagem do Papa para o 43º Dia Mundial das Comunicações Sociais, com o título “Novas tecnologias, novas relações. Promover uma cultura de respeito, de diálogo, de amizade”. Já no ano de 2002 João Paulo II tinha falado da Internet como “novo foro para a evangelização”. Quis Bento XVI regressar a este tema, por causa das “mudanças fundamentais nos modelos de comunicação e nas relações humanas” que o desenvolvimento técnico tem provocado. Mudanças que afectam cada vez mais pessoas (em particular os jovens, a quem o Papa chama “geração digital”) e de um modo cada vez mais profundo. A sua influência não se fica pelas novas formas de comunicação e relação (como refere o título da mensagem), mas chega à própria auto-percepção que sobretudo os mais novos têm de si mesmos e do mundo à sua volta (pense-se nos sms que os adolescentes se enviam uns aos outros, e cujo número acaba por definir a sua “popularidade” e influenciar a sua auto-estima). No texto constata-se uma visão muito positiva do “potencial extraordinário das novas tecnologias”, “verdadeiro dom para a humanidade”. O “alcance global e omnipresença da Internet” permite uma velocidade de comunicação “impensável para as gerações anteriores”, e são inúmeros os benefícios desta “nova cultura da comunicação”, seja o acesso ao conhecimento ou o contacto entre amigos e familiares geograficamente separados. Bento XVI sublinha que este impulso não é novo, pois “está radicado na nossa própria natureza: […] quando nos abrimos aos outros, damos satisfação às nossas carências mais profundas e tornamo-nos de certa forma mais plenamente humanos”. E não esquece enumerar o uso das redes digitais para “promover a solidariedade humana, a paz e a justiça, os direitos humanos e o respeito pela vida e o bem da criação” (as campanhas da Amnistia Internacional são disso um bom exemplo). O Papa não deixa no entanto de alertar com acerto para os perigos envolvidos. Há que cuidar os conteúdos, pois é de “excluir aquilo que alimenta o ódio e a intolerância, envilece a beleza e intimidade da sexualidade humana”. Deve-se procurar manter a “busca da verdade”, em contraposição ao “mercado de possibilidades indiscriminadas” (cada vez mais se recorre à Internet para aceder à informação, sem preocupação ou sequer possibilidade de confirmar a veracidade e imparcialidade das fontes). Outros perigos identificados são o afã de novidade, onde “a escolha em si mesma se torna o bem”; a “banalização do conceito e da experiência da amizade” e a “obsessão” pelo virtual que provoca o isolamento no mundo real (quando jovens sem amigos na escola passam depois horas em “conversa” no chat ou assumindo uma identidade alternativa no Second Life). O que “acaba por perturbar as formas de repouso, de silêncio e de reflexão necessárias para um são desenvolvimento humano” (daí a maior necessidade nas novas gerações de estímulos constantes e a dificuldade em lidar com o silêncio). Há ainda um alerta para que os países mais pobres não fiquem excluídos do uso destes meios. Em síntese, a mensagem de Bento XVI revela uma Igreja atenta a este novo fenómeno, sem cair num fascínio acrítico nem num temor a entrar nele (expressão dessa atenção é a recente criação de um canal do Vaticano no YouTube). Curiosa é a humildade revelada pelo Papa, ao falar dos jovens que “sentem-se à vontade num mundo digital que entretanto para nós adultos […] muitas vezes parece estranho”. Daí o convite final que lhes é dirigido, a “assumir com entusiasmo” a “evangelização do continente digital”. Tarefa que não é fácil, dada a enorme quantidade de conteúdos disponíveis e a “luta” pela atenção sempre fugaz dos cibernautas. Num mundo pouco favorável a comunicações mais longas, ter-se-á que encontrar outros modos de levar à profundidade. E aí – como mais uma vez acerta Bento XVI – a beleza e a criatividade terão o seu papel, seja pela simples presença (o caso dos blogs e sites de inspiração católica), seja pela maneira simples e directa de expressar a Boa Nova (o exemplo dos vídeos do D. Manuel Clemente). Pe. Filipe Martins, SJ essejota.net

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