«O sagrado e as gentes»: Romaria à Senhora de Assedace tem uma «ligação profunda à terra» (c/ vídeo)

Festa da Serra da Estrela, na Diocese da Guarda, une dimensão religiosa e popular

Guarda, 09 jul 2020 (Ecclesia) – A romaria à Senhora de Assedace, em Folgozinho, na Diocese da Guarda, é uma marca para o povo serrano, uma “festa com ligação profunda à terra” e que “une o sagrado e o profano”.

A evocação à Mãe de Deus, ali Senhora de Assedace, acontece em duas datas distintas com profunda ligação à vida do campo, as sementeiras e as colheitas. 

“A primeira data, na segunda-feira de Páscoa, é o cumprimento do voto, uma promessa assumida pela gente de Manteigas mas depois cumprida pelo povo do Folgozinho, há séculos, quer chova quer neve, este ano foi a exceção por causa da Covid, não foi lá ninguém… Celebra-se a missa e vem-se embora, uma ligação profunda à terra, às sementeiras, entregam a terra à bênção da Senhora”, explica o padre António Morais, pároco de Folgozinho.

O sacerdote que ali vive e acompanha esta devoção há 50 anos recorda muitas romarias, “debaixo de chuva, trovoada e grande nevões” e aponta a data de 8 de setembro como ponto forte da romaria. 

“A romaria do 8 de setembro aqui na zona é a festa das sete Senhoras, e a Senhora de Assedace é uma delas, uma festa com uma vertente diferente, havia uma peregrinação a pé, serra acima, pela calçada romana e é uma mistura entre a festa profana e o sagrado”, descreve.

A festa começa na véspera quando as pessoas passam as noite na serra, onde “acontecem muitas promessas e devoção”, com muita gente a fazer romaria à capela que “está aberta toda a noite”, mas também quando “acontece a festa pagã”.

“Há um ambiente de silêncio em volta da capela, onde as pessoas pagam as suas promessas e não há uma única palavra, pode demorar horas e há sempre gente a fazer romaria à capela, ao mesmo tempo há uma estranha mistura entre o sagrado e o profano, que é uma concertina e as danças tradicionais”, refere.

O padre Morais olha para esta mistura “com a maior das simpatias” porque entendeu que só ao “entrar no coração do povo se percebe que não é tão profano quanto isso”. 

A festa de setembro termina com a rematação das ofertas à Senhora, onde havia “cabras, galinhas, ovelhas e queijo” porque “esta data tem outra ligação à terra, as colheitas, as pessoas vão agradecer”.

Foto: Jornal A Guarda

“Desde cedo me liguei à cultura tradicional, peguei no grupo folclórico de Folgozinho e sei que tem uma grande riqueza, fomos às raízes e a Senhora de Assedace deu-nos muita coisa, a tal festa pagã”, refere. 

Na sua entrega a esta serra e à romaria o padre Morais classifica duas coisas sagradas para o povo serrano: o pão e o gado, presentes nesta devoção, fazendo “daquela romaria algo extraordinário”.

“O pão e o seu ritual, sementeira, crescimento, ceifa, arrolhar, malha, pedia-se a bênção à Santa Mãe de Deus, neste caso Senhora de Assedace, porque a serra era toda centeio; outra coisa sagrado era o gado, ovelha bordaleira e o queijo da serra da Estrela e todo o ritual da tosquia e do queijo, eu benzi queijarias, e ouvi muitas queijeiras”, recorda.

Sem se saber a origem desta evocação, a que os mais antigos designam “como Sedarça, Sadarça ou ainda mais antigo Sedarcha”, o prior considera que “possa ser, provavelmente, por aquela zona ter sido cultivado muito linho, e o nome virá da seda”.

A capela, datada do século XII e zelada pela Irmandade das Almas, está aberta apenas nos dias de festa.

“Fiquei agarrado pela serra e não mais me desagarrei, aquela serra é um monumento, de beleza estonteante, mesmo agora tudo queimado, a serra ficou nua mas continua bela, quase original”, afirma.

SN

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