Beja: «Ainda é cedo para perguntar se as pessoas querem ficar ou regressar à Ucrânia» – Volodymyr Drabovskyy

Comunidade ucraniana no concelho de Odemira, em articulação com autoridades civis e de saúde, ajudam 17 famílias a encontrar «a paz e a tranquilidade»

Agência ECCLESIA/LS

Vila Nova de Milfontes, 23 mar 2022 (Ecclesia) – A comunidade ucraniana a residir no concelho de Odemira está a organizar-se para acolher cidadãos que fogem da guerra, em tarefas que incluem tratar da documentação, a inserção das crianças na escola e os cuidados de saúde.

Volodymyr Drabovskyy, natural da Ucrânia e a residir em Portugal há 22 anos, explica à Agência ECCLESIA que logo após as primeiras notícias do dia 24 de fevereiro, que davam conta da invasão russa, a comunidade residente de cerca de 500 pessoas no concelho de Odemira, “depois do choque inicial, quis perceber o que poderia fazer para ajudar”.

“No final de um dia reunimos para ver o que podíamos fazer e ao fim de três dias recolhemos alimentos e enviamos o primeiro camião para a fronteira da Polónia e a Ucrânia porque nessa altura já não se podia passar. Mas começamos depois a perceber que podíamos ajudar a receber as pessoas nas nossas casas”, conta o professor de dança, que hoje ajuda a fazer as traduções e a tratar da documentação.

Numa ação concertada com o Alto Comissariado das Migrações, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, a autarquia e as autoridades de saúde, uma equipa está a ajudar as famílias que chegam ao Colégio Nossa Senhora da Graça, em Vila Nova de Milfontes, para que acedam a documentação, “caminho que os vai fazer sentir mais seguros” e poder pensar na sua vida em Portugal ou no posterior regresso à Ucrânia.

“Neste momento eles querem paz e tranquilidade, mais nada. Estão cansados, desesperados. Deixaram a vida lá e vierem para aqui e tem de começar tudo de novo. A sua esperança é que isto termine o mais rápido possível. Alguns querem voltar, porque deixaram lá os maridos e a família não está completa, alguns pensam em ficar aqui. Mas esta pergunta é ainda muito cedo para fazer”, regista Volodymyr Drabovskyy.

Mas Viktoria Kachanovetska já sabe a resposta: quando puder, quer regressar à Ucrânia, à região de Vinnytsia, junto com dos dois filhos de 17 e 10 anos, e encontrar o marido que ficou a combater.

Os pais residem em Vila Nova de Milfontes e por isso veio para Portugal, local onde se sentem “seguros e protegidos” e onde “todos ajudam”, mas assume que tem o “coração triste e preocupado”.

Agência ECCLESIA/LS

“Estou à espera dos documentos e quero trabalhar. As pessoas aqui dão-nos o que comer, o que vestir mas nós queremos fazer por nós. Na Ucrânia, eu tinha um salão de beleza e tratava dos cabelos e dos rostos. E quero ajudar as mulheres a ficarem ainda mais bonitas. Mas estou disponível para fazer qualquer trabalho”, regista à Agência ECCLESIA, grata pela ajuda que está a receber.

O seu filho Igor, de 17 anos, está já incluído numa turma para continuar os estudos e apesar do pouco inglês falado, as traduções no telemóvel e os exercícios a Matemática ajudam a fazer pontes.

Na aula do 7º ano, a acompanhar o jovem Denis, está Vitoria Santos, filha de um português e de uma mãe ucraniana, que ajuda nas traduções para que o novo amigo se sinta acolhido.

A professora de Matemática dá conta do “espetacular” empenho dos seus dois novos alunos mas também da abertura e solidariedade que a comunidade escolar está a mostrar neste acolhimento de emergência.

Estamos num cordão solidário muito grande e isto vai-nos fazer crescer muito. Pedimos aos alunos que tragam roupa e material escolar e eles e as suas famílias estão a ajudar muito” – Eunice Castor.

O presidente da Associação de Estudantes do Colégio tem noção que a situação que agora atinge a população ucraniana podia acontecer a “qualquer outro cidadão”, talvez por isso, a consciência solidária entre todos seja muito forte.

“A associação de estudantes organiza visitas ao colégio para os integrar, porque entendemos que entre estudantes da mesma faixa etária nos entendemos melhor. Estamos também a ajudar financeiramente, na compra de material escolar e na recolha de roupa e calçado, para dar o que precisam neste momento”, conta Tomás Paz.

Uma comunidade escolar onde diariamente 21 nacionalidades se cruzam vê agora a sua rotina ligeiramente alterada num gesto que, todos reconhecem, vai marcar a comunidade em Vila Nova de Milfontes, com a acolhimento que hoje faz a 17 famílias – 42 crianças acompanhadas por 24 adultos.

Agência ECCLESIA/LS

Igor Meluir e Antonina Shtefan são médicos: ele cirurgião ucraniano, ela anestesista russa, estão a viver em Odemira há 12 anos, atualmente com a especialidade de medicina geral e familiar.

“Como somos médicos podemos ajudar na área de saúde. Pedimos que eles preenchessem um questionário para avaliar o seu estado, em termos de vacinação, medicação para doenças crónicas e mais informações que possam ajudar numa primeira avaliação”, contam à Agência ECCLESIA.

Os questionários vão ser avaliados entre colegas e profissionais de saúde que os poderão continuar a acompanhar no centro de saúde, assim que os seus documentos e registos estiverem em ordem.

Do ponto de vista psicológico, Igor Meluir adianta que encontrou “pessoas mais ou menos estáveis”.

Não posso dizer que estão completamente estáveis, porque a situação é complicada, mas dizemos que é importante manter a calma também pelas crianças que necessitam continuar a sua vida e se possível estudar” – Antonina Shtefan.

Volodymyr Drabovskyy reconhece que os ucranianos estão “feridos” mas que, neste momento, o que podem fazer é “ter fé e continuar a viver”.

LS

Beja: Comunidade escolar recebe cidadãos da Ucrânia, num gesto que está a marcar população local

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