Esperar ou parar

João Aguiar Campos, Diretor do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais

1. Se aquela rua fosse uma pessoa, teria “imensa pena” dela, como costuma dizer-se. De facto, as máquinas rasgaram-na com periódica impertinência — como se um qualquer pretexto bastasse para mais dois sulcos e as correspondentes cicatrizes: todos sabemos, na verdade, como, uma vez remexido, o piso nunca mais volta a ser o mesmo…

Os motivos pareceram, contudo, sempre justificáveis: a rede de esgotos precisava de ampliação; o abastecimento de água carecia de mais polegadas; o gás queria chegar, dentro de dias, fora da tradicional botija; as operadoras adotavam caminhos novos de oferecer o sinal; etc., etc.

Nunca nada disto me espantou e até me sinto grato pelas benfeitorias. O que sempre estranhei foi cada necessidade a cumprir um calendário: o seu. Sem uma coordenação que imagino a rentabilizar máquinas, tempo e incómodos.

Não me atrevo a afirmar que a solução estivesse ao alcance de um telefonema entre serviços ou que uma reunião haveria de revelar-se indispensável. Sem dúvidas, porém, afirmo que – naquela rua ou noutras circunstâncias — muito se ganharia se cada um soubesse que não está só e, com os outros, preparasse o futuro de todos. Sem improvisos descuidados.

Não ignoro que a paixão pelo improviso é uma das piores características nacionais. 

Oiço mesmo falar deste defeito como se de uma virtude se tratasse: “somos bons a desenrascar-nos” – diz-se por aí. Sem nos darmos conta que assim se confessa, afinal, a frequência com que esquecemos o tempo e as horas…

 

2. Nesta edição de Ecclesia abana-se a árvore pacata dos nossos improvisos, procurando avivar a urgência de Portugal se preparar para o período pós-troika. Mas preparar mesmo, sublinhe-se!

Gato escaldado, não vejo desde já bons sinais nos discursos político-partidários inconsequentes e desgarrados em torno de nuances semânticas, esquecendo o fundamental: os adultos saudáveis andam pelo seu próprio pé e sujam as mãos; algumas vezes tropeçam e muitas outras caem; mas negam-se a prostração choramingas e a auto compaixão.

É tempo de nos sentirmos empurrados do ninho; é tempo de partir por dentro do céu ou, pelo menos, até à árvore mais próxima, saboreando o desconforto que nos faz crescer.

 

3 A espera é, nesta perspetiva, apenas um intervalo. É, além disso, um intervalo ativo, que se vive no caminho, em permanente tensão – de modo que nem o descanso seja paragem e, muito menos, desistência.

Melhor que muitos outros, nós, os cristãos, temos porventura mais viva esta obrigação de compreender que o que melhor conserva a vida é, afinal, o compromisso e nunca o frigorífico!… Realmente, «quem tem esperança, vive diversamente; foi-lhe dada uma vida nova», lê-se na abertura da Spe Salvi (n.9).

 

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