A renovação dos Marianos da Imaculada Conceição

Padre João Carlos Roma Leite Rodrigues, MIC

Uma experiência de Misericórdia e uma confirmação do Espírito Santo

A Renovação do Instituto dos Padres Marianos, ocorrida a 29 de agosto de 1909, foi a mais forte experiência da Misericórdia de Deus na história dos Padres Marianos, bem como uma importante confirmação de que o seu carisma é necessário à Igreja. De facto, o acontecimento propriamente dito da Renovação da Ordem que Santo Estanislau Papczyński (1631-1701) fundou na Polónia em 1670 não foi uma mera iniciativa humana de reformar as estruturas desatualizadas de uma Ordem religiosa obsoleta, mas antes uma intervenção misericordiosa de Deus, que enviou o seu Espírito Santo para regenerar e revitalizar um carisma de vida religiosa que, na lógica da mentalidade mundana, estava condenado à extinção.

 

A Renovação dos Marianos: uma experiência de Misericórdia

Quando no dia 8 de novembro de 1864, o governo do Império Russo editou o decreto de reorganização da vida religiosa em seu território, os Marianos começaram a vivenciar uma séria ameaça de extinção. Naquela altura, a Ordem dos Marianos encontrava-se já num período de crise profunda, possuindo aproximadamente 80 membros espalhados por apenas 8 conventos. Em 1865 existiam apenas 32 religiosos Marianos, e residiam todos num único convento, em Marijampolė, na Lituânia. O número de religiosos Marianos foi diminuindo subitamente ou porque alguns iam falecendo, ou porque outros iam saindo para a vida secular. E eis que em 1897 ficaram apenas três vulneráveis anciãos. A extinção da Ordem dos Marianos parecia ser um facto inevitável e mais fatal se tornou ainda, quando a 11 de agosto de 1908 faleceu o Pe. André Juraitis e três dias depois o Pe. Matias Gilis. Ficou só o Superior Geral, Pe. Vicente Senkus (1840-1911), de 68 anos de idade, o qual, apesar de todas as adversidades, continuou a acreditar que Deus, rico em sua misericórdia, não iria permitir que a chama lúgubre do carisma dos Marianos se apagasse na Igreja e no mundo. E Deus parece ter ouvido as suas fervorosas orações, porque em setembro desse mesmo ano, recebeu uma carta de um tal Pe. Jorge Matulaitis-Matulewicz (1871-1927), professor de sociologia da Academia Espiritual Católica de São Petersburgo, na qual, este manifestava o seu desejo de ingressar na Ordem dos Marianos, juntamente com um seu colega de universidade, o Pe. Francisco Bučys (1872-1951), professor de teologia fundamental na mesma Academia. Esta carta foi para o Pe. Vicente um sinal claro de que os Marianos eram queridos aos olhos de Deus e uma experiência profunda de alegria pascal.

O Pe. Jorge Matulewicz e o Pe. Francisco Bučys, enquanto adolescentes, haviam sido alunos do Colégio dos Marianos, em Marijampolė e, mais tarde, já como padres, juntos fizeram o doutoramento em teologia, na Universidade de Friburgo, na Suíça, nos anos 1899-1902. E foi ali que pela primeira vez foram movidos pelo desejo de ingressar na vida religiosa, e só não o fizeram no estrangeiro, porque tinham consciência da enorme necessidade de missionários que se fazia sentir no território do Império Russo. E assim movidos por este desejo de levar uma vida mais perfeita, os padres Jorge Matulewicz e Francisco Bučys foram passar as férias do verão de 1908 a Marijampolė e ali depararam-se com a necessidade urgente de fazerem diligências concretas para que os Marianos não desaparecessem de uma vez por todas. Perante a impossibilidade de restaurar legalmente a vida religiosa no convento de Marijampolė, o Pe. Vicente Sękowski perguntou com inquietação ao Pe. Jorge Matulewicz, no dia 24 de abril de 1909: “Será que existe ao menos uma fagulha de esperança, ou temos de desistir e preparar dois caixões: um para mim mesmo e outro para a Congregação?”. Era necessário renovar a Congregação de uma forma clandestina. Com efeito, o Pe. Jorge deslocou-se a Varsóvia no dia 12 de julho de 1909 e teve uma decisiva conversa com o bispo Casimiro Ruszkiewicz, legado da Santa Sé para as causas dos religiosos no território do Império Russo, que o recebeu com muita cordialidade e compreensão e que o aconselhou a viajar até Roma para expor a questão da renovação dos Marianos diante das autoridades máximas da Santa Sé. Uma semana depois desta conversa, o Pe. Jorge Matulewicz escreveu uma carta ao seu amigo, o Pe. Francisco Bučys, onde anotou com alguma excitação: “Vamos saber qual é a vontade da Igreja!”.

 

A Renovação dos Marianos: uma confirmação do Espírito Santo

O Pe. Jorge chegou a Roma no dia 18 de julho de 1909 e alguns dias depois foi recebido pelo cardeal espanhol da Ordem dos Capuchinhos, José Vives y Tuto, Prefeito da Congregação para os Religiosos, numa audiência que teve um papel crucial na definição do rumo a seguir para a realização da reforma da Ordem dos Marianos. Foi o cardeal José Vives y Tuto que encorajou o Pe. Jorge para que os Marianos resignassem do hábito e se vestissem como os outros padres; foi também ele que garantiu ao Pe. Jorge que o autorizaria a fazer a profissão religiosa, dispensando-o do noviciado; e foi ele que deu orientações concretas para que a legislação dos Marianos fosse adaptada às necessidades da Igreja daquele tempo. Com base nas sugestões do cardeal, o Pe. Jorge Matulewicz repensou os postulados da renovação dos Marianos e escreveu uma carta ao papa Pio X que o recebeu numa audiência privada, tecendo-lhe numerosos elogios e manifestando a sua aprovação relativamente à ideia da renovação dos Padres Marianos. O aval pessoal do papa foi uma importante confirmação do Espírito Santo de que o carisma dos Marianos continuava a ser necessário à missão salvífica da Igreja.

Fortalecido com esta convicção, o Pe. Jorge regressou à Polónia, no dia 5 de agosto de 1909, e logo mandou uma carta ao Pe. Vicente Senkus, dando-lhe as boas notícias da aprovação papal da Renovação dos Marianos, e convidando-o a deslocar-se para Varsóvia para que ele próprio e o Pe. Bučys pudessem ser admitidos na Congregação dos Marianos, antes que começassem as aulas na Universidade de São Petersburgo. Com efeito, no dia 29 de agosto de 1909, o Pe. Jorge Matulewicz emitiu a sua profissão religiosa nas mãos do Pe. Vicente Senkus, e o Pe. Francisco Bučys foi admitido para iniciar o seu noviciado em São Petersburgo, sob a orientação do Pe. Jorge. Tudo isto foi feito sob a autoridade eclesiástica do bispo Casimiro Ruszkiewicz, legado da Santa Sé para as causas dos religiosos no território do Império Russo, o qual emitiu um documento oficial para atestar a veracidade daquele acontecimento salvífico para a história dos Marianos. Mais tarde, com a perspetiva do tempo, o dia 29 de agosto de 1909 foi considerado como o “dia da ressurreição dos Marianos”, porque foi nesse dia que a Congregação dos Padres Marianos foi insuflada pelo Espírito Santo de um novo vigor, quando tudo parecia indicar que houvera chegado o seu fim. Desde aquele dia, os Marianos começaram a respirar com um novo fôlego e as estruturas estagnadas do Instituto começaram a regenerar-se e a revitalizar-se de tal maneira, que o último Mariano branco pôde expirar em paz com a certeza de que o Espírito Santo sopra onde quer e quando quer.

O facto de a Ordem dos Marianos ter sido salva da extinção foi sem dúvida uma ação regeneradora do Espírito Santo, pois a Renovação dos Marianos só foi possível, porque primeiramente houve algumas pessoas concretas que se deixaram reformar pelo Espírito Santo. E, por isso mesmo, é que se pode afirmar que a Reforma dos Marianos ocorrida sob o impulso apostólico do beato Jorge Matulaitis-Matulewicz foi a mais forte experiência da Misericórdia de Deus na história dos Marianos e uma importante confirmação do Espírito Santo de que o carisma dos Marianos é precioso para a Igreja, porque foi precisamente no período mais “miserável” da sua história que Deus enviou o seu Espírito que renova todas as coisas para suscitar no coração do Pe. Jorge Matulewicz o carisma de Renovador e para iluminar o coração do último Mariano branco para que ele pudesse acolher com serenidade a reforma das “coisas velhas” e aceitar com alegria as surpresas da novidade. Trinta anos após a Renovação, faziam-se as primeiras diligências para o regresso dos Marianos a Portugal, junto do Bispo de Bragança, D. Abílio Vaz das Neves, para guardar a memória do Venerável Frei Casimiro Wyszyński (1700-1755), que implantou a Ordem dos Marianos em Portugal, tendo falecido com fama de santidade no Convento de Balsamão.

Padre João Carlos Roma Leite Rodrigues, MIC
Superior do Vicariato Português dos Marianos da Imaculada Conceição

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Agência ECCLESIA

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