Taizé: encontro de gerações e de memórias

Dominie partilha com a Agência ECCLESIA experiências que vive em Taizé desde 1974

A Comunidade ecuménica de Taizé, em França, junta gerações em torno da busca de Deus e do silêncio. A cada ano que passa, chegam mais jovens, mais adultos, mais crianças, mais famílias.

Foi esta crescente procura que levou os irmãos a questionarem-se sobre o que oferecer, o que propor a quem os procurava desde os anos 60 pedindo para passar um tempo com eles. Sem infra-estruturas, as pessoas que chegavam para passar alguns dias com a comunidade ficavam alojadas em CorMatin, a cerca de cinco quilómetros da pequena aldeia de Taizé e todos os dias se deslocavam para estar com os irmãos.

Partilhando o dia-a-dia com quase 4 mil pessoas, participando das reflexões de grupo, cumprimentando quem passa e perguntando apenas «de onde és?», facilmente se trocam experiências, se conhece quem viu, desde a primeira hora, crescer um movimento em torno de Taizé.

Dominie é professora de crianças com deficiência, em Oxford, Inglaterra, de onde é natural. Esta inglesa, com uma forte pronúncia, já perdeu a conta às inúmeras viagens que fez para Taizé desde 1974. São muitas as histórias que guarda da comunidade, do contacto com as pessoas e do quanto Taizé mudou tão pouco.

A igreja da Reconciliação era muito pequena no início. “Na parte de trás tinha uma grande tenda de circo, com cadeiras. O resto era tudo aberto”, recorda.

As acomodações eram em tendas, mas muito do espaço que hoje lhes é reservado, antes não existia. “Havia apenas duas casas de banho para as senhoras e outras duas para os senhores. Só havia dois chuveiros e a água era sempre fria”, recorda a rir.

A tenda F, que actualmente acolhe os adultos a partir dos 35 anos, não existia. “Não havia uma separação”. O local era apenas campo e a pouco e pouco surgiu uma tenda, depois o chão, recorda esta inglesa.

Inicialmente também o lago de Saint Etienne era exclusivamente usado pelos irmãos. “Não tenho noção que quantidade de lago havia. Creio que o abriram a todos no final dos anos 80”.

Dominie era adolescente quando foi a Taizé pela primeira fez. “No final dos anos 60 havia muitas pessoas que iam para Taizé”. Esta cristã da Igreja anglicana, estava na universidade quando a sua diocese, de Canterbury, organizou vários grupos de jovens para viajarem para Taizé. “A minha mãe inscreveu-me”.

Sem saber nada da comunidade, Dominie passou uma semana em Taizé. “Sabia apenas que era uma comunidade cristã, que todos falariam línguas diferentes, mas que isso seria indiferente e que eu estaria de férias em França durante 10 dias”.

A memória mais antiga que tem é de estar na igreja da Reconciliação e ouvir todos a rezarem na sua língua materna. “Foi nessa altura que percebi que Deus não era um senhor inglês que eu conhecia da minha igreja ao Domingo, mas era um senhor universal”.

“Essa consciência teve um profundo impacto em mim” recorda. Dominie assinala também o impacto de falar com pessoas de diferentes países “mesmo sem perceber tudo. Acabei por ficar num grupo alemão sem perceber uma única palavra da língua e eles a terem de traduzir tudo”. Mas esta partilha mostrou-lhe que as questões eram as mesmas.

“Eles tinham as mesmas dúvidas, procuravam as mesmas respostas, tinham as mesmas lutas com os seus pais, com a escola, com o futuro”, recorda. Esta primeira experiência “abriu o meu mundo”.

Dominie não hesita em dizer que foi em Taizé que a sua fé deixou de ser um conhecimento racional, para passar a ser uma relação de coração.

A mudança que não aconteceu
Na comunidade de Taizé é normal encontrar pessoas que, ou presenciaram a morte do Irmão Roger ou acompanharam as celebrações fúnebres. Uma normalidade também assumida pela própria comunidade religiosa que fala com naturalidade de um acontecimento tão trágico.

Dominie acompanhou as cerimónias fúnebres e recorda que durante três meses não caiu uma pinga de água, mas que nessa Terça-feira “choveu imenso”. Um dia que apenas foi diferente porque as pessoas que aí estavam a passar a semana não tiveram introdução bíblica, pois os irmãos estavam ocupados a preparar a cerimónia.

“Mas houve a oração de manhã e o pequeno almoço. Houve reflexão de grupos, ao mesmo tempo que iam chegando muitas pessoas e que um ecrã gigante ia sendo montado”.

Dominie acredita que a morte do Irmão Roger foi um teste à comunidade e à sua coesão. “Todos sabiam quem ia ser o sucessor e todos concordaram, por isso não foi um problema”.

A mudança não aconteceu. “Foi tudo muito natural. O Irmão Alois ocupou naturalmente o lugar do Irmão Roger na igreja da Reconciliação, dando apenas continuidade”. 

É sem fortes mudanças que Dominie recorda Taizé ao longo dos anos. “Houve melhoramentos, mas foi sempre havendo de forma natural. Ao longo dos anos nada mudou de estrutural”.

É esta continuidade que traz esta inglesa, quase todos os anos, a Taizé. Aqui ela sabe que a reflexão bíblica lhe vai ensinar muito. “É muito bom afastar-me e ter esta semana para mim”. O que aqui se passa é “muito bíblico”, indica a Dominie referindo-se aos pequenos grupos de reflexão.

Esta inglesa também já fez a semana do silêncio. “Foi desafiador, mas emocionante aos mesmo tempo”. Dominie recorda que foi nesse retiro de silêncio que “de facto ouvi Deus falar comigo pela primeira vez. É tudo uma questão de silêncio”.

É esta memória que revive inúmeras vezes.

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top