Novas linguagens da fé

O Catequista é um crente enviado por Deus, em Igreja, a anunciar uma grande novidade: Deus salva a humanidade. Esta comunicação é realizada através da catequese de iniciação. O primeiro elemento a destacar é o facto de a catequese de iniciação ser um acto de tradição viva, iniciação ordenada à revelação que Deus, em Jesus Cristo, fez à Humanidade, revelação essa que é guardada na memória da Igreja e nas Sagradas Escrituras e é constantemente comunicada por uma geração à outra, mediante uma tradição viva e activa. A Igreja transmite, assim, aquilo que Ela mesmo recebeu como dom e em que ela crê. Esta comunicação faz-se através da doutrina, vida e culto que a Igreja presta a Deus, pelo que não se trata da transmissão de meros conceitos ou regras de comportamento. São, acima de tudo, realidades: Deus, em Jesus Cristo e pelo Espírito Santo, salva a Humanidade. São as realizações e as obras do amor de Deus ao longo da história da salvação, ontem, hoje e sempre. Estas realidades expressam-se nos Símbolos da fé, celebram-se nos sacramentos da Igreja, mostram-se nos testemunhos das vidas dos santos e na herança espiritual dos Padres e no ensino dos pastores da Igreja. Todas estas são vias por onde se tem acesso à única verdade que salva: Jesus Cristo. Mas a transmissão da revelação acontece precisamente quando, para além das afirmações materiais, se torna efectiva a sua realidade interna sob a forma de fé, pelo que pertence à revelação, em certo sentido, também o sujeito receptor, já que sem ele não se produz a revelação. É o Espírito Santo que ilumina interiormente a pessoa para que se una a Cristo pela fé e entre em comunhão de vida com a Santíssima Trindade, através d’Ele, sendo a catequese apenas a mediação eclesial. Por isso, actualiza-se a revelação quando, pela acção do Espírito, entramos e permanecemos em comunhão com os testemunhos que contemplaram o acontecimento revelador de Jesus Cristo e cujo testemunho se prolongou fielmente nos escritos da origem e na memória vivente da Igreja do acontecimento de Cristo, ou seja, daquela experiência original, definita e insuperável, que os homens fizeram de Deus na vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo e que se expressa na Palavra proclamada, se revive na celebração, especialmente na Eucaristia, e se reafirma e historifica numa práxis em que se presencializa, nas novas situações dos homens, aquele modo de ser e de actuar do mesmo Jesus. A catequese há-de conseguir que, sob a acção do Espírito Santo, a revelação seja significativa para o homem de hoje. A sua função consiste em fazer ressoar a Palavra de Deus, viva e significante, de modo que toque a experiência do crente, a ilumine, o leve a interpretar a sua vida à luz da Palavra, lhe dê uma resposta positiva, com todas as implicações vitais que isso acarreta. Linguagem da fé Para que se verifique a transmissão da fé, é precisa uma linguagem própria: a linguagem da fé (Cf DGC 208). Jesus Cristo não se identifica em exclusivo com nenhuma cultura ou sistema de pensamento, mas revelou-se numa linguagem concreta. Foi certamente uma linguagem original e também normativa para qualquer outra linguagem que pretenda ser veículo da transmissão da Revelação, em fidelidade ao Magistério, a quem cabe discernir a sua autenticidade. A Sagrada Escritura, a Sagrada Tradição, a liturgia, os símbolos baptismais e os pronunciamentos do Magistério formam e mantêm a identidade da linguagem da fé em todas as culturas onde a Igreja confessa a única fé. À catequese cabe a missão de transmitir os documentos da fé (Cf MPD 9), que têm uma linguagem específica, capaz de dar acesso à Palavra de Deus e introduzir na dinâmica da salvação e nos acontecimentos salvíficos. A catequese tem a missão de tornar acessível ao homem actual, neste contexto cultural, a linguagem da fé. Este serviço há-de ser realizado na ‘tensão’ entre o Evangelho e a cultura actual. A inculturação da fé e o seu diálogo com a cultura será umas das tarefas que terá que assumir a catequese no seu processo de actualização da revelação divina, pelo que há-de possibilitar aos cristãos que não sejam meros repetidores de linguagens mortas, incapazes de dar razões da sua fé na sociedade hodierna, mas sim que dialoguem e dêem testemunho da sua fé. Para isso, a catequese leva a cabo uma hermenêutica tanto da existência humana actual como da Palavra eterna e historicamente dita que também fala hoje aos homens com toda a sua inigualável novidade. Testemunho O último elemento a fazer referência é que a grande novidade da transmissão da fé realiza-se através do testemunho. O testemunho de fé é a forma mais coerente com o modo como o próprio Deus se revelou. Mais ainda, pode dizer-se que a transmissão da fé é essencialmente testemunho. Trata-se de pôr à disposição da humanidade a verdade da fé, aquela realidade viva que impregna e envolve o ser da Igreja. Trata-se de ser testemunhas pessoais da salvação de Deus e mostrar aquilo que vimos e ouvimos (cf 1Jo 1, 1-3). Tal como Jesus dá testemunho do Pai e os apóstolos dão testemunho de Cristo, à Igreja cabe dar testemunho do Ressuscitado. Assim, através da Igreja, podemos chegar ao testemunho apostólico, e deste, ao de Jesus Cristo que nos revela o Pai. No exercício da transmissão da fé, o testemunho é essencial e permite, em virtude da sua própria natureza, mostrar mais palpavelmente a realidade da fé, a vitalidade da verdade da fé, a proximidade de Jesus Cristo. Graças ao testemunho, a Igreja poderá afirmar diante da humanidade a força e a beleza da fé e proclamar com alegria e entusiasmo: esta é a nossa fé, esta é a fé da Igreja. A catequese, ao estar vinculada à confissão de fé da Igreja, da sua vida, favorece a coerência entre o crer e o agir, por isso, é testemunho e exigência de testemunho. Luís Miguel FIGUEIREDO RODRIGUES luis@diocese-braga.pt

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top