LUSOFONIAS – Boas, más e falsas notícias

Tony Neves, em Roma

A Missão também se escreve, mostra-se, ‘posta-se’, partilha-se…mas, sobretudo, vive-se, testemunha-se com convicção. Quem tem horizontes curtos e não cultiva a memória também não pode ter convicções profundas nem mentalidade aberta. Isto tudo a propósito do Dia Mundial das Comunicações Sociais que a Igreja católica celebra em cada festa da Ascensão. A Igreja – na sua tradição multimilenar – aprendeu a comunicar os seus valores de geração em geração. Quando o Concílio Vaticano II quis valorizar a comunicação social dentro da Igreja, o Papa Paulo VI avançou com a criação do Dia Mundial das Comunicações Sociais, celebrado pela primeira vez em 1967. Daí para cá e até hoje, todos os anos, o Papa publica uma mensagem. A deste ano é muito forte, lá iremos.

‘Evangelho’, é uma palavra que vem do grego e significa ‘Boa Notícia’. Ora, a missão da Igreja é, desde a primeira festa da Ascensão (no dia mesmo em que Cristo subiu ao Céu…), anunciar boas notícias. Mas – todos o sabemos e sofremos – narrar maus acontecimentos dá mais audiência aos media hoje e suscita mais partilha e debate. E pior estamos quando – por opção deliberada de pessoas e organizações – se inventam notícias para atingir determinados objectivos. Dou exemplos: o jornal ‘Público’, a 6 de maio, divulgou que já foram difundidas mais de 2700 notícias falsas sobe o covid’. Por exemplo, circulou uma informação que dizia que lavar as mãos não tinha qualquer utilidade! Adianto uma outra que, de muito elaborada e tendenciosa, pode fazer muito mal: li um grande texto, aparentemente muito bem fundamentado, a dizer que o Papa Bento XVI resignou por pressão e ameaça do governo esquerdista de Obama. Este e seus aliados de esquerda nos EUA impuseram, depois, à Igreja, o Papa Francisco!!! Ora, quem conhece como funciona a Igreja, sabe que ninguém tem poder para ‘subornar’ 2/3 dos cardeais num conclave. Portanto, esta notícia só pode ser falsa! Enfim, as ‘fake news’ andam por aí à solta, a ‘comer’ incautos que as engolem e reproduzem acriticamente!

Voltemos às mensagens para o Dia Mundial das Comunicações Sociais. O Papa Paulo VI, em 1967, deu o título de ’Meios de Comunicação Social’ à primeira mensagem. No ano seguinte, apresentou a Imprensa, a Rádio, a Televisão e o Cinema como meios ao serviço do progresso dos povos.

João Paulo II assinou a Mensagem de 1979 sobre a relação entre os media e as crianças, em Ano Internacional da Criança e abordou os temas da opinião pública em 1986, da defesa da justiça e da paz em 1987, da promoção da solidariedade e fraternidade à escala do planeta em 1988. Em1990 falou, pela primeira vez, da cultura informática actual, regressando ao tema em 2001. Em 2002 já se reflecte sobre o impacto da internet.

O Papa Bento XVI voltou à rede em 2006 (Os Media: Rede de Comunicação, Comunhão e Cooperação) e em 2009, onde escreve que ‘a nova arena digital, o chamado ciberespaço, permite encontrar e conhecer os valores e as tradições alheias’.

O Papa Francisco quis, em 2014, colocar a Comunicação ao serviço de uma autêntica cultura do encontro. Por ocasião do Jubileu da Misericórdia, em 2016, deu o mote à Mensagem: ‘Comunicação e Misericórdia: um encontro fecundo. Escreveu: ‘Também emails, SMS, redes sociais, chat podem ser formas de comunicação plenamente humanas(…) As redes sociais são capazes de favorecer as relações e de promover o bem da sociedade, mas podem também levar a uma maior polarização e divisão entre as pessoas e os grupos. O ambiente digital é uma praça, um lugar de encontro, onde é possível acariciar ou ferir, realizar uma discussão proveitosa ou um linchamento moral’. Em 2017, Francisco pediu boas notícias aos media e à Igreja: ’tudo depende do olhar com que enxergamos a realidade, dos ‘óculos’ que decidimos pôr para a ver: mudando as lentes, também a realidade aparece diversa’ .

Estas ideias, todas cruzadas, aparecem na mensagem para este 2020. O Papa pede que tomemos a sério quatro valores fundamentais a comandar a nossa relação com os media hoje: sapiência, coragem, paciência e discernimento. Convida-nos a olhar a realidade com os óculos da verdade e do amor.

Temos a obrigação moral de afastar para bem longe de nós todos os fundamentalismos e integrismos que nos embaciam a visão e nos fazem míopes e agressivos. Estes dias, circulou nas redes sociais um cartoon com um crente a contar a sua forma de viver em tempo de covid. Começa: ‘Eu não preciso de máscara, de gel…Deus vai proteger-me!’. Depois, ele grita aos quatro ventos: ‘Oh meu Deus. Eu confio no Senhor! Proteja-me!’ Mais tarde, já numa cama de hospital, ele barafusta com o Altíssimo: ‘Oh Deus! Eu confiei em Vós! Mas o Senhor não me protegeu!’. E Deus, lá do alto, responde: ‘Filho, dei-te uma máscara, sabão desinfectante e gel e orientei-te para o isolamento social; pedi para ficares em casa e, assim, te manteres em segurança…Mas tu não me ouviste!!!!’.

Se ‘Ascensão’ rima com ‘Comunicação’, ousemos apostar nas boas notícias que ajudam a construir um mundo de justiça, paz, amor e alegria. Estes são os valores vividos e anunciados por Cristo. Vamos por aí!

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