Imprensa tem empobrecido

Alerta lançado nas XI Jornadas de Ciências da Comunicação da Universidade do Minho O director-adjunto do “Público”, Manuel Carvalho, denunciou ontem o «empobrecimento da imprensa», fruto do emagrecimento das redacções provocado pelos constrangimentos económicos e das lógicas de concorrência. Este responsável, que falava no painel “O jornalismo é manipulação?”, integrado nas XI Jornadas de Ciências da Comunicação da Universidade do Minho, que chegam hoje ao fim, afirmou que «a imprensa diária tem cada vez menos recursos », uma vez que «a percentagem do mercado publicitário que é canalizada para a televisão só tem paralelo no terceiro mundo». O profissional disse que há a diminuição do número de jornalistas nas redacções, que trabalham com cada vez menos condições, pelo que se pratica um «jornalismo que exige menos investimento». Neste cenário, as âncoras de que os jornalistas se socorrem são os papéis que chegam às redacções. O jornalista sublinhou que o «empobrecimento da imprensa » também se verifica porque os jornais procuram cada vez mais o “vox populi” e o que vende. Na sua perspectiva, existe uma «atitude de carneirada perante os acontecimentos»: os alinhamentos são cada vez mais iguais e condicionados pela televisão. Na mesma linha, Carlos Rodrigues Lima, do “Expresso”, defendeu que «o campeonato dos jornais diários é muito complicado», existindo em alguns órgãos de comunicação social uma «visão mais concorrencial » do que a preocupação em «fazer jornalismo». Em seu entender, os jornais preocupam-se em ter «um título mais engraçado do que o do lado», mesmo que depois a notícia não corresponda às expectativas criadas. Referindo-se à área judicial, à qual está mais directamente ligado, alertou para o perigo de haver uma «manipulação com meias verdades». Na sua opinião, o caminho passa por «ter um bocadinho de paciência » e só publicar a notícia depois se ter conseguido uma versão sólida. Risco de manipulação é maior na Justiça O director da TSF sublinhou que «a maior parte do jornalismo não é manipulação », embora admita que «ela acontece». Paulo Baldaia mostrou-se particularmente preocupado com a manipulação na área judicial, considerando que este é o sector onde o risco é maior. Segundo este responsável, há fontes que decidem avançar para a condenação das pessoas na praça pública quando estão convencidas de que não vão conseguir condená-las nos tribunais. Em seu entender, a manipulação é, por vezes, involuntária, fruto da «pura ignorância », decorrendo do facto de haver cada vez menos jornalistas – e sobretudo jornalistas especialistas – nas redacções. Este responsável acrescentou que «a primeira manipulação » começa na cabeça dos próprios jornalistas, uma vez que, para a maioria, «a isenção é sinónimo de ser contra-poder». Por seu turno, José Pedro Marques, da RTP, defendeu que «quanto mais pobres e vazias de ideias» forem as agendas dos meios de comunicação social, mais facilmente serão manipuladas por agências que «conhecem tão bem ou melhor do que os jornalistas as fragilidades do sistema». «Não há fontes desinteressadas », advertiu. Contudo, este profissional não isentou de culpas os jornalistas, questionando o seu papel na «formatação das notícias ». José Pedro Marques explicou que, num evento, os jornalistas acabam por destacar os mesmos aspectos, daí resultando «reportagens que se não são iguais são muito semelhantes». Na sua opinião, para além da óbvia relevância das questões, há «um acordo subliminar entre os jornalistas », que resulta de vivências muito semelhantes, de ninguém querer «dar o tiro ao lado» nas matérias que selecciona e da pressão das chefias para que o órgão de comunicação tenha o que tem a concorrência. Manuel Carvalho defendeu que, neste contexto, é a existência de um código de ética e de deontologia que permite fugir aos riscos, advertindo que as leituras que se fazem desses documentos também podem ser condicionadas. O director-adjunto manifestou- se contra a «manipulação intencional com a clara cumplicidade dos jornalistas», que acontece quando eles cedem «a uma espécie de chantagem », que é não publicar uma notícia à espera de terem outra mais importante. As XI Jornadas de Ciências da Comunicação, subordinadas ao tema “Verdade ou Consequência?”, chegam hoje ao fim, com os painéis “Pós-produção ou efeitos visuais” (9h30), “A marca Portugal” (11h15), “O novo perfil do profissional de comunicação” (14h30) e “Consequências do curso: ex-alunos” (16h30). A partir das 22h00, na Velha-a- -Branca, ex-alunos contam os bastidores do estágio e peripécias da profissão. «Profissão de jornalista não está em vias de extinção» O professor da Universidade do Minho Joaquim Fidalgo considera que a profissão de jornalista não está em vias de extinção», embora tenha de refazer a sua vocação num cenário em que há cada vez mais circulação de informação. O especialista falava ontem, na Universidade do Minho, à margem da apresentação do livro “O Jornalista em Construção”, inserida nas XI Jornadas de Ciências da Comunicação, subordinadas ao tema “Verdade ou Consequência?”. Joaquim Fidalgo afirmou que mais do que apostar na revelação de dados, o jornalismo terá que enveredar pela «interpretação, sinalização para a navegação no mar de informação, credibilização, atribuição de um certificado de qualidade» que permita separar o trigo do joio. «Em rigor já não seria preciso haver jornalistas. As fontes primárias falam directamente para as pessoas», disse, sublinhando que, neste cenário, o papel dos jornalistas não será tanto o de divulgar a informação, mas o de ajudar as pessoas a saber ler o que lhes é apresentado. Em seu entender, acabará por haver uma distinção entre o jornalismo de massas, sobretudo de televisão, e um «núcleo quase de resistência» que necessita de um jornalismo de cariz mais explicativo. «Nesse caminho de longo prazo», haverá um grupo que sentirá que «aprofundar a informação pode ser importante para a sua vida», na medida em que lhe dá «uma capacidade acrescida de ler o mundo». O jornalista sublinhou «o próprio modelo de negócio está muito afectado», indo de encontro ao que foi afirmado por outros profissionais no painel “O jornalismo é manipulação?”.

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