Igreja/Tecnologia: Conselheiro do Papa para a Inteligência Artificial defende «barreiras de proteção» éticas

Padre Paolo Benanti, que integra órgão consultivo da ONU, sublinha que valores morais devem acompanhar «valores numéricos sobre os quais a máquina escolhe»

Foto: Agência ECCLESIA/OC

Lisboa, 19 jun 2024 (Ecclesia) – O padre Paolo Benanti, conselheiro do Papa para as questões da Inteligência Artificial (IA), disse hoje à Agência ECCLESIA que é preciso desenvolver “barreiras de proteção” éticas, pelo ser humano, para evitar que “a máquina se desvie”.

“O tempo que dedicamos a desenvolver este pensamento é um tempo que garante solidez a estas barreiras de proteção. Ou seja, não se trata de tempo perdido, não se trata de atraso, trata-se simplesmente de tentar compreender o sentido humano, o sentido ético e quais são os valores morais em jogo que devem acompanhar esses valores numéricos sobre os quais a máquina escolhe”, referiu o franciscano, que integra o Órgão Consultivo das Nações Unidas sobre Inteligência Artificial (IA) e uma comissão do Governo italiano para o combate ao jornalismo de notícias falsas e desinformação.

O docente na Universidade Pontifícia Gregoriana, de Roma, recordou o discurso do Papa durante a Cimeira do G7, na última sexta-feira, observando que a IA “pode, até certo ponto, separar-se do humano e passar a decidir e a escolher por si mesma”.

Paolo Benanti destaca que a intervenção de Francisco “define a condição humana como uma condição tecno-humana”, de uma forma positiva, indicando que “o homem tem a imagem e a semelhança de Deus na ação tecnológica e carrega dentro de si essa semelhança”.

“Ao mesmo tempo, é um olhar muito realista, nada ingénuo, porque na história o homem também é marcado pelo pecado, ou seja, por um uso errado dos dons que Deus lhe dá”, acrescenta o religioso.

Perante os responsáveis do G7, Francisco alertou para o uso autónomo da IA em cenários de guerra e destacou que a humanidade deve evitar a dependência das “escolhas” feitas por máquinas.

Para o padre Benanti, é preciso colocar a teologia e a filosofia em diálogo com um domínio “tecnologicamente novo”, como a IA, sublinhando que critérios como a defesa da dignidade humana mantém a sua atualidade e precisam de ser atualizados, neste campo.

A ética, acrescenta, assume o desafio de “ser capaz de dar a palavras que hoje adquirem um novo significado, também, o eco desse significado antigo e profundo para o ser humano”.

É um problema de diálogo entre uma fronteira tecnológica que utiliza muitos nomes antigos, dando-lhes novos significados, e uma disciplina que é a guardiã de elementos preciosos, como os da dignidade humana”.

 

Questionado sobre os desafios que a IA levanta aos media, o entrevistado sustenta que o jornalismo tem “uma missão que é uma missão cívica, ao serviço da verdade”.

“A ausência de mediação humana diz-nos que, se alguém quiser inclinar as notícias para um lado ou para o outro, as famosas ‘fake news’ ou a utilização interesseira dos meios de comunicação social, pode fazê-lo muito facilmente”, adverte.

Para o padre Paolo Benanti, a inteligência artificial é usada corretamente quando serve para “melhorar as capacidades do jornalista”.

“A inteligência artificial é uma ferramenta para permitir que os jornalistas e os meios de comunicação social façam melhor as suas reportagens ou para matar jornalistas e jornais? A forma como respondermos a esta pergunta determinará a qualidade da sociedade que teremos amanhã”, prossegue.

O frade franciscano, com um curso de engenharia mecânica, diz que o seu interesse pelo campo da IA vem na sequência do que já foi feito com a ‘Ars Magna’ de Ramon Lull, nos séculos XIII-XIV, e a filosofia de Leibniz, nos séculos XVII-XVIII.

“Tentamos fazer o que podemos nesta época, numa tradição que nos precede e que continuará depois de nós”, afirma.

O padre Paolo Benanti sublinha que, como pede o Papa Francisco, é preciso ter em mente um “horizonte último”, necessário para dar sentido às coisas.

O sacerdote italiano esteve em Portugal a convite da Universidade Católica, tendo proferido em Lisboa a conferência ‘Artificial Intelligence and Ethics’ (Inteligência Artificial e Ética).

OC

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