Homilia do bispo de Santarém na vigília Pascal

Irmãos e irmãs

Esta é a noite da celebração da Vigília Pascal. Chama-se vigília porque é realizada à noite, num tempo em que não se dorme, porque se está de vigia, na expectativa de uma intervenção de Deus. É a Páscoa do Senhor, a sua passagem deste mundo para o Pai e a origem dos Sacramentos que asseguram a sua presença connosco.

A Luz do círio pascal, significa a Luz de Cristo Ressuscitado. É a Luz da nossa Fé na qual escutamos a Palavra, as leituras que nos atualizam as intervenções e os cuidados de Deus, desde a Criação até à Ressurreição de Cristo.

Contemplamos a bondade de Deus na criação (Livro do Génesis), a sua força libertadora em defesa dos hebreus no Egito (Livro Êxodo), a disponibilidade de Deus para proteger o seu povo (apresentada pelo Profeta Isaías), a promessa de renovação do homem com um coração novo e um espírito firme (apresentada pelo Profeta Ezequiel). Chegamos ao Novo Testamento, a Cristo Ressuscitado; é Ele que realizando as promessas de Deus, nos renova e permite uma nova vida para o mundo.

Como escutámos no Evangelho de São Marcos (Mc 16,1-7), no primeiro dia da semana, muito cedo, as mulheres foram ao sepulcro com perfumes que tinham comprado. O que encontraram? A pedra do sepulcro revolvida e o sepulcro vazio. Aquelas mulheres foram as primeiras, porque depois delas, o Santo Sepulcro onde Jesus esteve sepultado é, seguramente, o lugar mais visitado por cristãos do mundo inteiro.

Mas aquelas mulheres tiveram outra surpresa que as assustou: viram um jovem sentado do lado direito, vestido com uma túnica branca que as informou: Procurais Jesus, o Crucificado. Não está aqui: ressuscitou. (…) Vede o lugar onde o tinham depositado.

Esta informação é explosiva. Com esta página do Evangelho, São Marcos testemunha que Jesus está vivo, e teve continuadores em multidões de homens e mulheres a afirmarem que Jesus Ressuscitou, não porque visitaram o santo sepulcro, mas porque escutaram a sua Palavra, acreditaram n’Ele, gerou-se o dom da Fé e sentiram-se amados. De facto, Jesus ressuscitou para a direita de Deus Pai, mas tornou-se ainda mais acessível pela escuta da sua Palavra que, desde então ressoa na sua Comunidade e, extensivamente, pelo testemunho que os cristão podem dar em família ou por proposta a alguém que queira conhecer Jesus. Agora os verdadeiros adoradores são os que adoram em Espírito e Verdade, independentemente do lugar onde se encontrem (cf. Jo 4,19-24).

Também nós, se estamos aqui nesta Vigília, decerto, é porque fizemos a experiência da Fé, do encontro com Cristo vivo. A experiência da vida à luz da Fé em Cristo Ressuscitado, leva-nos para além da historicidade dos factos. Jesus Cristo não é apenas uma figura histórica do passado, faz parte do nosso tempo presente. A Ele confiamos os nossos segredos mais íntimos.

Porém, à luz da razão, o assunto é complexo. Os discípulos de Jesus, já antes tinham manifestado dificuldade em compreender o que seria ressuscitar dos mortos. Agora, ainda a digerir a frustração da morte na cruz, a dificuldade continua: Jesus ressuscitou? O que é ressuscitar dos mortos? Ressuscitou sozinho? Alguém interveio?

Sim. Deus estava com Jesus, o seu “Filho muito amado”, e interveio. A ressurreição de Jesus não é um voltar à vida neste mundo para mais tarde voltar a morrer. Trata-se de estar vivo para sempre, não igual ao que era antes, mas numa nova ordem, uma nova habilitação existencial, uma vida completamente nova. Da limitada vida humana, o Senhor Jesus passou à condição divina, sem deixar de acompanhar os seus discípulos.

A morte de Jesus na cruz, foi também uma ‘morte’ para os seus discípulos. ‘Morreram’ como membros de um grupo organizado que tinha Jesus por Mestre e Senhor.

Com a Ressurreição, os discípulos, de mergulhados na tristeza da morte passam a ressuscitados para uma nova vida, marcada pelo dom do Espírito. À luz da Ressurreição, vão interpretar a Sua morte de Jesus não como um fracasso, mas como um ato de amor com efeito de redenção, purificação e libertação dos que n’Ele creem.

Como é que alguém pode participar da vida nova que os apóstolos e outros discípulos passaram a viver e a testemunhar? Acreditando na Palavra de Jesus e pedindo o Batismo na sua morte e Ressurreição. E é aqui que chegamos nesta Vigília. Para que participemos mais vivamente e se atualize em nós a nova vida de Jesus, renovamos as promessas do nosso Batismo.

A alegria pascal dos discípulos pela participação na nova vida de Jesus, chegou até nós pelo Batismo e até esta noite em que o renovamos. Que esta vigília nos encha de alegria e fortaleza para testemunharmos na vida a Ressurreição do Senhor.

Que Maria, Mãe de Cristo Ressuscitado nos acompanhe na alegria e na esperança viva para a qual renascemos.

 

D. José Traquina
Bispo de Santarém

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