Esfinge de cera

A Congregação para o Culto Divino acaba de publicar uma “Instrução” intitulada “Redemptionis Sacramen-tum”. À pressa, ou nervosamente, alguns traduzirão como a “redenção do sacramento” na sequência das virtuais trinta e sete proibições que, não há muito, serviram para notícias especulativas que se revelaram balão de ensaio duvidoso. O presente documento chama-se, em português, o “Sacramento da Redenção” e refere-se à Eucaristia e à necessidade de observância de elementos essenciais, e de recusa de algumas atitudes abusivas na celebração do Mistério da Fé. O texto, dividido em oito capítulos, está disponível, na íntegra, no site da Agência ECCLE-SIA e merece ser lido e meditado no tocante a eventuais desvirtuamentos na celebração Eucarística que, em boa verdade, não aparecem frequentes entre nós. Mas algumas ressonâncias surgidas na sequência desta “Instrução” apresentam-se como um hino triunfal ao ritualismo, à letra pura e dura dos gestos, das palavras, das sequências, como se a celebração da Missa não passasse de um acto gélido, onde o liturgo proclama e cumpre, perfeito na letra, mecânico na rubrica, executante ao milímetro de passos predefinidos. Como uma esfinge de cera. Importa não esquecer a reforma litúrgica do Concílio Vaticano II e todo o seu esforço de reavivar o sentido festivo, comunitário e participativo da Eucaristia que faz a Igreja, como a Igreja faz a Eucaristia. Mistério e memória, “memória do coração, aquela que só o amor pode imprimir e gravar”como disse o Patriarca de Lisboa na última Quinta Feira Santa, a Missa possui uma densidade assumida pelo Presidente e pela Assembleia, que vai muito para além do cumprimento dos cânones. Importa que a repetição mecanizada, ainda que tecnicamente perfeita, não renegue a alma da Eucaristia nem lance para plano secundário a sua essência – o mandato de Jesus – ”Fazei Isto em Memória de Mim”. António Rego

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