E depois da visita Ad Limina?

Cada bispo é princípio da unidade e da abertura da Igreja local à comunhão com as outras Igrejas A Igreja é a matriz da fé, em que se nasce para habitar o mundo pela linguagem da comunhão. E, numa bela expressão dos primórdios, compete à Igreja de Roma “presidir à universal comunhão da caridade” na cultura de cada Igreja particular. “A cultura da caridade tem um único código: o amor dos irmãos”. E, “o que faz com que um grupo de homens e mulheres sejam a Igreja num determinado lugar é exactamente o que faz com que outro grupo o seja num lugar distinto: uma mesma comunhão de vida, que permite a um católico descobrir ‘uma fraternidade de resposta comum’ por cima de todas as culturas”. Por seu lado, a comunhão, como cultura, acontece “numa frater-nidade assim de confissões e confidências … (e) só depois de bem avaliar as suas características particulares e de as caldear a seguir no grande lume universal, pode um qualquer ser ao mesmo tempo um cidadão de (um lugar) e cidadão do mundo”, em que “o universal é o local sem paredes”. Uma fraternidade de resposta comum, num mundo pleno de desafios e, também, de possibilidades, é o que Karl Rahner e Miguel Torga prometem na afirmação do local e universal que uma visita ad limina pode evocar. A Igreja, que “preside à caridade” evoca um mundo transparente que deve manter-se a caminho, em atitude de êxodo; procurando parceiros de alianças para uma ‘fraternidade de resposta comum’, torna-se o mundo, como mundo de capital social e cidadania, habitável. A caminho do Reino, “onde Deus será tudo em todos”, a Igreja local ‘ensaia’ como em laboratório respostas aos grandes problemas que nos ameaçam: a pobreza das pessoas, a pobreza das ideias e a pobreza do planeta. Uma racionalidade culta, plural, na era da complexidade, faz-nos descobrir cidadãos a caminho, inter-agindo, à procura de respostas. A Igreja local, que “se define pela sua relação com o mundo”, é a manifestação activa dos cristãos que se unem “com estima e caridade” aos homens da sua região, participantes da “vida cultural e social”(AG, 11, 15). A convergência de revolução copernicana na concepção da Igreja, como Igreja local, e da pessoa, relação com os outros, urge o recurso ao argumento dos meios e métodos das ciências; este permite como plausível “pensar em termos de livre comunhão e desinteressada fraternidade o mundo redondo” como sentido. E a identidade eclesial, na cultura, é condição disposi-tiva, pois “não pode ser salvo senão aquilo que é assumido”. O modelo é o Reino, para vir, e tem em conta que a comunhão para o Reino é o caminho para o mesmo. Deste, a liderança profética da Igreja leva a ‘ensaiar’, agora, um mundo com os outros em perspectiva abrangente, que é o amor. A co-responsabilidade, que afecta toda comunidade, é o ‘ensaio’ da comunhão, em que “todos somos Igreja”. Como “o conhecimento do conhecimento obriga” e a Igreja é semper reformanda, ‘ensaio’ para tornar-se o que é, a comunhão deve ser pensada como compromisso por uma adequada pedagogia de participação. E, num jogo de relações Igrejas particulares – Igreja universal, a comunhão é tarefa e dom, espaço da aprendizagem como caminho e meta. O Bispo leva a voz da sua diocese ao Papa, em intercâmbio que enriquece o desenvolvimento tanto da realidade como da doutrina sobre a Igreja; este intercâmbio é um dar e receber mútuos, em resposta urgente aos problemas, e urgente, porque nunca como hoje houve tantas possibilidades de solução pacífica. De facto, “… nunca foi tão aberta possibilidade de compreender as múltiplas dimensões da vida… (e) apesar da ‘nova ordem política do mundo’ ter mais caos do que ordem, a possibilidade de os seres humanos construírem o seu destino e serem verdadeiramente livres nunca foi tão grande… (por) uma nova ciência integrada, que reunirá a biologia geral, a neurociência, e os produtos mais avançados da cultura humanística”. Por outro lado, a relação de “mútua interioridade” da Igreja particular com a Igreja universal situa-se num tempo de “coexistência entre culturas extraordinariamente evoluídas” e de desenvolvimento científico. Face aos grandes desafios da convivência de culturas, o conceito de comunhão como “saúde” de culturas diferentes deve expressar-se particularmente naquela que se apresenta como sacramento de salvação para o mundo; e as grandes questões teológicas não podem alhear-se das grandes questões dos homens, da cultura, pela qual o homem habita o mundo. Cada bispo é princípio da unidade e da abertura da Igreja local à comunhão com as outras Igrejas, e o Papa é, também, cabeça de uma Igreja local, a Igreja-Mãe de Roma, fundamento e princípio da unidade da Igreja universal (LG, 23). A Igreja, em condição permanente de êxodo, em busca da forma definitiva, nunca encontrada no deserto do mundo, pelas culturas, onde nunca deixamos de estar, acolhe um convite para o êxodo de si mesma para ir ao encontro dos homens, na fidelidade ao Espírito; esta viagem, de si para si, é a conversão. Como referia João Paulo II, “sem esta caminhada espiritual, de pouco servirão os instrumentos exteriores da comunhão (que) revelar-se-iam mais como estruturas sem alma, máscaras de comunhão, do que como vias para a sua expressão e crescimento”. Por isso, “as nossas comunidades eclesiais são chamadas a ser verdadeiras escolas de comunhão” no mundo para descobrir ‘uma fraternidade de resposta comum’ “numa fraternidade de confissões e confidências (onde) pode um qualquer ser ao mesmo tempo um cidadão de (um lugar) e cidadão do mundo universal (que) é o local sem paredes”. A visita Ad Sacra Limina processa, num duplo movimento, a partilha da autoridade e da responsabilidade apostólicas; esta surge como “uma voz clara no meio do ruído confuso das diferentes ideologias”, presente no sensus fidei e consensus fidelium, traduzidos na co-responsabilidade, como a ar que se respira, e reforçada na era da complexidade, em que o todo está na parte, que está no todo. O Papa exerce o ministério de “fazer circular a caridade”(Paulo VI) entre as Igrejas ao serviço da esperança da humanidade num futuro digno. M. M. Costa Santos(UCP-Braga)

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