Covid-19: «Se não cuidarmos uns dos outros o mundo vai cair-nos em cima» – Bispo de Setúbal

D.José Ornelas afirma que a caridade é o que distingue o cristianismo, apela à necessidade de «repensar a humanidade» e pede apoio do Estado para o setor social

Foto Lusa, ação social da Santa Casa da Misericordia de Castro Daire

Setúbal, 20 mar 2020 (Ecclesia) – O bispo de Setúbal disse hoje em declarações à Agência ECCLESIA que a pandemia em curso recentra o papel da Igreja no cuidado do outro, fragiliza os símbolos do populismo e apela à necessidade de repensar a humanidade.

“É verdade que é preciso criar barreiras de retenção do vírus. Mas o vírus está-se ‘borrifando’ para as nossas barreiras. Se não unirmos esforços, a humanidade não tem futuro! E este é só um aviso”, alertou D. José Ornelas.

Para o bispo de Setúbal, este “é o momento de repensar a humanidade”, nomeadamente o papel da ONU e da União Europeia, que, “paradoxalmente acontece num tempo em que cada um pensa que pode resolver por si só, nacionalisticamente ou à luz dos seus interesses pessoais”.

D. José Ornelas disse que a situação provocada pelo covid-19 levou a um fim “trágico” e “ridículo” de quem pensava que a pandemia “era fácil”, que era um “vírus chinês”.

“Pode daqui nascer uma consciência nova da humanidade que sabe que, para o bem e para o mal, estamos juntos, que este planeta é a nossa casa comum, que evite que o desperdício de uns seja causa e miséria dos outros”, afirmou.

“Os muros que se procuraram erguer para nos defendermos não servem e não são solução para nada! A solução está em cuidarmos uns dos outros”, sustentou.

Para o bispo de Setúbal as pessoas que mais vão sofrer com a pandemia são as mais carenciadas, alertou para o “grito destruidor daqueles que sofrem” e reclamou “uma palavra governamental” para o setor social.

“Se é verdade que o Estado – e muito bem – está a pôr ao serviço do emprego e das Pequenas e Médias Empresas verbas significativas que são de todos nós, da sociedade, e estão a ser postas ao serviço dessas instituições para que não entrem em falência, ainda não ouvi uma palavra sobre as IPSS, que se ocupam de gente com deficiências, dos mais pobres, que fornecem refeições ou alimentos”, alertou.

Para D. José Ornelas a situação das Instituições Particulares de Solidariedade Social, das Misericórdias, dos Centros Sociais Paroquiais “é grave” e “pode colapsar”, lembrando que essas organizações sociais “fazem a diferença para milhares de pessoas neste país” e precisam de apoio na atual situação.

“A economia social está esquecida. E é grave, porque estamos a falar das pessoas mais carenciadas e vão ficar longe do sistema que se está a criar”, advertiu.

Para o bispo de Setúbal, “é crucial não deixar ninguém à beira da estrada” e “é fundamental cuidar de todos”.

“Esta crise vem mostrar que se não cuidarmos uns dos outros, damos cabo de nós, o mundo vai cair-nos em cima”, afirmou.

D. José Ornelas referiu-se também à missão da Igreja Católica no contexto da pandemia em curso em todo o mundo e afirmou que é necessário reinventar a marca da proximidade de todas as pessoas, que distingue o cristianismo, com “novas modalidades”.

O bispo de Setúbal afirmou que “o que carateriza os cristãos, desde o início, não são os momentos celebrativos, mas a caridade” e lembrou que Jesus apenas celebrou uma ‘Missa’, no fim da Sua vida terrena.

“A missa verdadeira é o cuidarmos uns dos outros. Jesus vem cuidar de nós, partir-nos o pão para que nós o repartamos pelos outros. Isto é a essência da vida cristã que agora se torna mais necessária do que nunca”, afirmou.

D. José Ornelas sublinhou que o “aspeto sacramental da comunidade reunida não está minimamente em causa”, referindo que há situações em que não é possível, como em contextos missionários ou de clandestinidade.

Exprimir a missão da Igreja Católica no mundo de “outro modo” é o desafio e o bispo de Setúbal indica que o caminho é o apontado pelo Evangelho: “a pessoa humana, aquele que está mais abandonado”.

“Se o vírus atinge a todos, ainda mais o Amor de Deus”, independentemente “da fronteira, da raça ou da condição económica”, apontou D. José Ornelas.

PR

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