Covid-19: «Funerais são o nosso limite de fronteira mais agudo» – Padre Amaro Gonçalo (c/vídeo)

Pároco de Nossa Senhora da Hora, no Porto, destaca impacto da solidão em tempos de pandemia e aponta à Páscoa como sinal de «ressurreição» para todos

Matosinhos, 31 mar 2020 (Ecclesia) – O padre Amaro Gonçalo, pároco da igreja de Nossa Senhora da Hora, na Diocese do Porto, afirmou que os funerais “são o limite de fronteira mais agudo” para um sacerdote, a partir da sua experiência, neste tempo de Covid-19.

“Não se morre só de Covid, também se morre de solidão”, disse à Agência ECCLESIA.

Por causa do novo coronavírus, a celebração das exéquias tem novas regras e o sacerdote refere que presidiu ao funeral de um paroquiano em que mais ninguém pôde participar, pelo que pediu ao agente funerário para “parar frente à porta”, onde fez simbolicamente “a oração de encomendação”.

Neste contexto, recorda ainda que no último funeral a que presidiu estavam “apenas a esposa e uma das filhas” do falecido, com familiares impedidos de participar, “uma situação dramática” que se vai repetindo no contexto da pandemia.

O sacerdote espera que, “passada esta crise”, possa haver oportunidade de reunir a família e “fazer alguma homenagem às pessoas que partiram”, congregar os amigos, prometendo desde já estar “disponível”.

No dia 13 de março, a Igreja Católica em Portugal suspendeu a celebração comunitária das Missas, mantendo a realização de funerais, com limitação à participação dos familiares mais próximos, durante a pandemia do novo coronavírus.

A indicação de celebração com a presença do menor número de familiares possível estende-se aos batismos e matrimónios, ainda que nestes casos a principal recomendação seja o reagendamento dos mesmos.

Cada bispo é responsável pela decisão, no seu território diocesano, sendo a orientação mais comum, no caso dos funerais, de reservar um espaço para o velório, apenas no dia do sepultamento, seguindo as normas de proteção individual, sem abertura do caixão.

O rito inclui apenas a Última Encomendação e Despedida (sem Missa) conforme o Ritual das Exéquias, seguindo o féretro para o cemitério, sem o habitual cortejo fúnebre.

Emocionado com o atual momento que se vive, o padre Amaro Gonçalo afirma que não se pode “deixar as pessoas numa espécie de limbo pastoral, de limbo emocional”, onde “não se sabe muito bem em que lugar está”.

O pároco de Nossa Senhora da Hora considera que se pode viver a Páscoa de “uma forma expressiva”, mesmo com as limitações da Covid-19, e destacou diversos sinais que podem sugerir aos cristãos.

“Esta Igreja em saída é também uma Igreja que é capaz de dar a cara onde os cristãos estão nos seus bairros e não se envergonharem da sua fé”, referiu.

O sacerdote da Diocese do Porto destacou diversos sinais que podem propor aos fiéis nas suas comunidades, já neste Domingo de Ramos (5 de abril), como “uma cruz numa janela, pendurada numa porta, à entrada do prédio”, que na Sexta-feira Santa pode ter um laço vermelho e um laço branco, na noite e no Dia de Páscoa, como “símbolo de ressurreição”.

Se as dioceses tivessem sinais comuns podia ser uma forma de redescobrir o Tríduo Pascal, para muitos cristãos, mesmo os considerados mais praticantes, é um tempo vazio, é um tempo mais de férias da Páscoa”.

O padre Amaro Gonçalo adiantou que na Sexta-feira Santa, este ano no dia 10 de abril, vai convidar as pessoas “a descer a persiana, a apagar as luzes” numa hora fixa e a recolherem-se em casa, “a desligar os aparelhos eletrónicos”, para meia hora de silêncio e, a partir das 15h00, acompanharem as transmissões online.

Já no sábado, véspera da Páscoa, o convite é a colocar uma vela, que pode ser a “vela do Batismo”, na janela e acender “na hora da vigília pascal”.

“Vamos tocar o sino para isso; podemos dar subsídios, pequenas orações para que possam acompanhar esses gestos”, desenvolveu, referindo que já anda “a pensar em várias coisas” para o Domingo de Páscoa, sempre dependentes da evolução da pandemia.

“Gostava de sair e fazer a bênção das ruas, pelo menos junto dos grandes prédios, fazer oração pública com megafone, tenho uma paróquia muito grande. Não sei, vou ouvir o Conselho Pastoral para ver como vamos sinalizar independentemente de pormos uma cruz decorada, à porta, à janela, algum sinal que nos ponha em clima pascal”, acrescentou.

O estado de emergência obriga ao isolamento social, mas o pároco de Nossa Senhora da Hora afirma que a “força da ressurreição é bem visível” na sociedade, “na capacidade de doação” na sociedade civil, nas pessoas, nos voluntários, nas pessoas que “garantem a sustentação” e serviços essenciais.

Os sinais de vida e ressurreição que emergem são sinais desta Páscoa que não nos vai ser tirada por nada e já está a florescer. A Páscoa não engana, está aí, está em força e vamos vivê-la da maneira que o Senhor nos deixa viver”.

Neste contexto, o padre Amaro Gonçalo explica que se vê “uma generosidade extrema nas pessoas”, que são capazes do melhor e “isso são sinais de ressurreição, de que o mundo não está perdido”.

“Formas de colaboração, de entreajuda, de gente capaz de arriscar a própria vida que dão sinal de que a sociedade pode não nos acompanhar do ponto de vista sacramental, litúrgico, mas o fundo judeu-cristão da nossa sociedade está a vir ao de cima”, acrescentou.

Em Portugal, segundo o último balanço divulgado pela Direção-Geral da Saúde, registaram-se 140 mortes e 6408 casos de infeções confirmadas pelo novo coronavírus.

HM/CB/OC

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