Conversas na Ecclesia: Igreja «deveria criar centro de cultura» e fazer «renascer carisma de promotor cultural»

O poder do teatro e da representação em tempos de pandemia do Covid-19 e na retoma social analisadas por Matilde Trocado e Júlio Martin

Lisboa, 08 mai 2020 (Ecclesia) – O ator e encenador Júlio Martin disse hoje que a Igreja poderia dar à sociedade um sinal “muito importante” ao criar um centro cultural, em Lisboa, como forma de “abertura e diálogo”.

“Há condições e espaços onde isso acontecer, nomeadamente, na igreja do Sagrado Coração de Jesus, em Lisboa, onde um auditório está subaproveitado e que tem condições que seriam excelentes para a criação desse centro cultural”, indica o professor de teatro e diretor do Teatro Académico da Universidade de Lisboa.

Júlio Martin afirma que não apenas a Igreja precisa deste espaço, mas também a sociedade.

“Uma das dificuldades das companhias é ter locais de ensaio, não há… E a dificuldade de locais de apresentação dos espectáculos. Os teatros municipais têm a sua programação e é muito difícil entrar. Era importante e seria um sinal muito importante a dar à própria sociedade e no diálogo da Igreja com a sociedade, através do teatro, da dança, da música”, avança.

O poder do teatro e o valor da representação no tempo de pandemia do Covid-19 e no retomar da vida social esteve no centro da «Conversa na Ecclesia», desta sexta-feira que juntou ainda a encenadora e professora Matilde Trocado.

Segundo a encenadora trata-se de “fazer renascer o carisma da Igreja” ao colocá-la como promotora de cultura.

“A Igreja vai ter um papel fundamental na retoma de toda a sociedade. Seria um falhanço da Igreja se não estivéssemos implicados e falo por mim, também individualmente, temos de ter um papel importante na retoma de tudo, no reerguer a sociedade e o reinventar. Espero que a Igreja esteja mesmo implicada nisso. E espero que a cultura faça parte dessa aposta”, sublinhou.

A arte teatral foi valorizada por ambos como um caminho de verdade, local onde se tiram as máscaras, apesar de proposta uma “viagem imaginária”.

“O teatro que eu gosto é o da palavra, do diálogo e é um teatro que não é realmente um meio de evasão como outros tipos de espetáculo, de entretenimento, mas um teatro que nos faz estar mais próximo da natureza humana, mais próximos do mistério que cada um de nós é; é uma viagem interior e os espetadores nunca têm um papel passivo. O fascinante no teatro é proporcionar esta experiência e ao vivo e em direto. Com esse sentir e respirar o mesmo ar e estar no mesmo espaço e tempo no mesmo local e perceber que o que está diante de si tem essa fragilidade da própria vida. Que é irrepetível”, traduz Júlio Martin.

Para Matilde Trocado, que sente saudades da sala de ensaio, “laboratório de descoberta”, “ o teatro é o lugar da verdade”.

“Vamos ao teatro encontrar verdade sobre o ser humano, mais do que noutras expressões, e é curioso porque o que encontramos é um imaginário, mas que proporciona um encontro com a verdade. E é do que mais me fascina no teatro”, valoriza.

Com uma estreia marcada para abril, Matilde Trocado explica que não imagina ainda como vai ser o regresso: “pensámos adiar, era um texto original, mas agora acho que ele terá de ser reescrito, não pode ficar igual depois disto…”.

Com uma companhia recentemente criada, «Ínsua», que indica uma pequena ilha que fica entre o rio e o mar, a encenadora reconhece que o mundo vive hoje, cada pessoa, na sua ínsua.

“É um desafio muito grande o que estamos a viver, há muitas perguntas e estar na pergunta não é mau, porque a pergunta tem muita informação, mas não sabemos, da mesma maneira que desconhecemos o impacto que isto terá, que impacto terá na forma como contamos as histórias, na forma como as ouvimos… estão muitos pontos de interrogação, é um desafio grande e é algo que puxa por nós”, reconhece.

Júlio Martin afirma que quando a arte e o teatro voltarem ao palco vão estar mais próximos do que é “essencial e urgente para a humanidade”.

“O teatro é um laboratório da complexidade do mundo. O teatro redime as realidades, as pessoas e não julga, observa simplesmente, e experimenta cada vida, que difere de outra, com tudo o que acontece de bom e menos bom. Neste tempo parece a nossa alma está fora de nós e o teatro possibilidade olhar para nós, habitar e construir o nosso universo interior”, indica.

De segunda a sexta-feira, depois das 17h00, a Agência ECCLESIA divulga “Conversas na Ecclesia” sobre temas juvenis, sociais, novas tecnologias, o Papa Francisco e a cultura.

LS

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