Concordata nos Institutos religiosos

1. Assinada a 18 de Maio de 2004, a nova Concordata entre a Santa Sé e o Estado Português entrou em vigor a 18 de Dezembro do mesmo ano, após a troca dos instrumentos de ratificação. Embora a Concordata não se possa reduzir apenas ao âmbito tributário, a sua aplicação tem importantes implicações fiscais na Igreja em Portugal e, nomeadamente, nos Institutos Religiosos. Qual a atitude dos responsáveis pelos Institutos Religiosos diante das mudanças em que se viram envolvidos, particularmente os novos regimes fiscais? Que influência têm estes nos vários projectos pastorais? Nestas breves linhas não pretendo entrar em reflexões sobre os grandes temas da Concordata nem em explanações técnicas sobre impostos e assuntos fiscais – tal fica ao cargo dos especialistas na matéria – mas apenas enunciar algumas atitudes que os Institutos Religiosos assumiram e continuarão a assumir face à nova realidade que repentinamente também os atingiu. 2. Compreensão e clarificação. Sendo um acordo elaborado e trabalhado em regime de confidencialidade entre as duas partes envolvidas, o texto da Concordata foi recebido pelos Institutos Religiosos como novidade absoluta. Mesmo sem intervirem nesse processo, procuraram desde logo compreender o alcance do novo texto legislativo, tentando clarificar a sua incidência nos vários âmbitos dos diferentes projectos pastorais. Socorrendo-se de técnicos espe-cializados em Direito Canónico e em Direito Fiscal, os Institutos Religiosos femininos (FNIRF) e masculinos (CNIR) decidiram-se por uma acção concertada em conjunto, sobretudo no que respeita a assuntos mais específicos das suas actividades como Institutos Religiosos em Portugal e em terras de missão “ad gentes”. 3. Adequação e cumprimento. Passou-se a uma segunda fase de adequação das suas obras e actividades, a nível singular e colectivo, à nova realidade, quanto ao cumprimento das suas obrigações fiscais na prossecução de fins não religiosos, a qual implica clareza de compromissos fiscais. Muitas questões e dúvidas continuam em estudo e são objecto de diálogo e esclarecimento junto da Administração Fiscal. Repare-se, por exemplo, que quase todas as actividades com fins não religiosos têm como principal objectivo obter meios em vista de uma maior solidariedade para com os mais socialmente desprotegidos. Regra geral, os rendimentos destas actividades servem exclusivamente para o serviço de obras sociais e missionárias, sem qualquer espera de retorno financeiro. De qualquer modo, os Institutos Religiosos, após o levantamento de todas as situações passíveis de tributação, procurarão cumprir integralmente as suas obrigações fiscais, com a intenção de melhor servir a sociedade e a Igreja. É sabido que as actividades que prosseguem fins religiosos estão isentas de quaisquer obrigações tributárias. 4. Novos projectos em perspectiva. A nova realidade fiscal poderia levar a refrear uma série de projectos pastorais em curso ou em perspectiva. É certo que o peso do fisco, sobretudo se não atender a situações específicas nalguns Institutos Religiosos como as Ordens Contempla-tivas, pode dificultar a continuidade de um mínimo de condições de existência. Pode levar igualmente a rever – e até anular – alguns projectos de carácter social. Porém, mesmo nas dificuldades, estou certo de que o cumprimento claro e justo das obrigações fiscais não impedirá a concretização dos projectos pastorais que os Institutos Religiosos têm em perspectiva, segundo o carisma próprio de cada um. Há um longo caminho a percorrer para que seja percebido todo o alcance real das implicações fiscais da nova Concordata. Como dizia o Cardeal Patriarca de Lisboa numa entrevista, “a Concordata desafia a Igreja a um serviço mais desprendido e radical”. Não será tarefa também e sobretudo para os Institutos Religiosos? 5. A CIRP (Conferência dos Institutos Religiosos de Portugal), que substitui as extintas CNIR e FNIRF, procurará continuar o importante caminho já percorrido. Segundo os seus estatutos, a CIRP, que “tem por fim realizar um trabalho de coordenação e auxílio mútuo entre os diversos Institutos”, visará “estar atenta aos desafios da actualidade que interpelam a presença dos religiosos no mundo como consagrados e responder-lhes com sentido profético”. O espírito do Evangelho e a força do Espírito serão sempre maiores do que quaisquer regulamentações tributárias. O cumprimento das obrigações fiscais nunca será impedimento, antes favorecerá o serviço desprendido e radical à Igreja e à sociedade, contribuindo para a construção do Reino de Deus, nos meios culturais e sociais em que os Institutos Religiosos estão inseridos, seja em Portugal seja em terras de missão para onde o Espírito os envia. O espírito da lei, que deve ser respeitada e cumprida, estará sempre ao serviço da Lei do Espírito, que nos compromete, envia e provoca sempre novos dinamismos pastorais e missionários. P. Manuel Joaquim Gomes Barbosa, scj Presidente da CIRP

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