A Cruz escondida

Histórias de esperança no bairro de lata de Dagoretti, no Quénia

Renascer em Nairobi

Numa pequena casa no meio de um gigantesco bairro de lata na capital do Quénia acontecem milagres quase todos os dias. Crianças órfãs, pessoas desesperadas, mães que não conseguem sequer alimentar os seus filhos, encontram abrigo nessa casa e descobrem motivo de esperança para as suas vidas. Ali, todos reaprendem a sorrir.

O bairro de Dagoretti em Nairobi, a capital do Quénia, é um mundo à parte. Visto do ar, parece uma cidade antiga com ruas estreitas, tortuosas. Na verdade, é apenas um indigno bairro de lata que parece não ter fim. Visto de perto, não tem qualquer ‘glamour’. É feio, retorcido, com vielas enlameadas, esgotos a céu aberto, barracas de barro e folhas de zinco. Podia ser um retrato do inferno. No bairro de Dagoretti, as irmãs salesianas procuram todos os dias devolver esperança aos que vivem ali, mesmo junto da capital, mas a quem falta quase tudo. Às vezes, até, da comida no dia-a-dia. A Irmã Purity Ndiwiga é bem conhecida no bairro. Ela e a Irmã Lucy Wegoki não têm mãos a medir. Todos os dias alguém lhes pede ajuda. E, elas procuram dar respostas a vidas em desesperança. Quem chega traz no rosto o seu bilhete de identidade, as suas dores, as dificuldades, o sofrimento. “Vêm de muitos lugares onde há conflitos, onde há guerra”, explica a Irmã Purity. São pessoas perdidas nas encruzilhadas da vida. “Não têm casa, não têm terra, não têm nada.” E ficam também sem esperança. Normalmente, quem chega a Dagoretti depressa descobre que apesar do gigantismo do lugar, não há trabalho, não é fácil arranjar um espaço a que se possa chamar casa, não há, sequer, tantas vezes, um pedaço de pão para comer.

 

Dar algum futuro

A Irmã Purity conhece bem as histórias de quem chegou ao fim da rua com a sensação de ter chegado ao fim da vida. Batem à porta da casa das irmãs com histórias dramáticas. A pobreza obriga as pessoas a escolhas impossíveis. Mesmo os que conseguem trabalho, muitas vezes não conseguem sobreviver. Diz a irmã: “É uma vida difícil. Se ganharem 200 [xelins quenianos, cerca de 1,73 euros], interrogam-se: ‘Compro comida para os meus filhos ou pago a renda da casa?’ Então, escolhem…”. E muitas vezes, escolhem pagar a renda. É que o bairro não é um lugar fácil e ninguém está verdadeiramente seguro nas ruas. Muito menos as crianças. Talvez por isso, a casa das irmãs salesianas de Dagoretti tem tantos meninos e meninas que ali procuram fintar um destino cheio de incertezas. Joseph Mbugua já foi criança. Hoje é um jovem adulto. Já entrou na universidade. A diferença entre ter sido um provável sem-abrigo ou sonhar agora em ser cientista está na ternura das irmãs de Dagoretti. Elas deram-lhe o que a família não conseguiu. “Não sei o que seria a minha vida sem as irmãs”, diz Joseph. Talvez já tivesse morrido…” Ali, na casa das irmãs salesianas, há milagres que acontecem quase todos os dias. Há pessoas que descobrem motivos de esperança para as suas vidas. Mesmo que não fizessem mais nada, ali, no meio do bairro de lata, as irmãs ajudam todos a reaprender a sorrir.

Paulo Aido | www.fundacao-ais-pt

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