Especial: Papa aprova nova Constituição para a Cúria Romana, mais virada para fora e menos centrada na gestão interna

Nova estrutura valoriza setor da evangelização e da caridade, procurando limitar «carreirismo» nos serviços centrais de governo da Igreja Católica

Foto Lusa, Encontro do Papa Francisco com a Cúria Romana

Cidade do Vatcano, 19 mar 2022 (Ecclesia) – O Papa promulgou hoje a nova constituição para a Cúria Romana, os serviços centrais de governo da Igreja Católica, assinalando os nove anos de início solene do seu pontificado.

O texto dá corpo a um projeto central de Francisco, que promoveu uma reforma interna com a ajuda de um inédito conselho consultivo de cardeais, representando os cinco continentes.

A nova constituição apostólica ‘Praedicate evangelium’ (Pregai o Evangelho) propõe uma Cúria mais atenta à vida da Igreja Católica no mundo e à sociedade, rejeitando uma atenção exclusiva à gestão interna dos assuntos do Vaticano.

Uma das novidades é o fim da distinção entre Congregações e Conselhos Pontifícios, passando os vários “ministérios” da Santa Sé a assumir a denominação de Dicastérios.

“A Cúria Romana é composta pela Secretaria de Estado, pelos Dicastérios e pelos Organismos, todos juridicamente iguais entre si”, precisa o Papa.

O novo documento condensa várias das alterações implementadas nos últimos anos, ao nível da estrutura da Cúria Romana, e entra em vigor no dia 5 de junho, solenidade litúrgica de Pentecostes.

Francisco, defensor de uma “Igreja em saída”, propõe ao longo dos 250 artigos desta constituição uma estrutura mais missionária para  Cúria Romana, ao serviço das dioceses de todo o mundo.

“A Cúria Romana não se coloca entre o Papa e os bispos, mas coloca-se ao serviço de ambos, segundo as modalidades que são próprias da natureza de cada um”, pode ler-se.

Simbolicamente, o primeiro Dicastério na nova ordem da Cúria é o da Evangelização – que unifica a antiga Congregação para a Evangelização dos Povos e o Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização -, presidido pelo próprio Papa, com dois pró-prefeitos para cada uma das secções deste organismo.

A nova Constituição, que substitui a “Pastor Bonus” de João Paulo II – promulgada a 28 de junho de 1988 – é apresentada pelo Vaticano como “resultado de um longo trabalho colegial”, que se inspirou nas reuniões pré-conclave de 2013, envolvendo o Conselho de Cardeais, com reuniões de outubro de 2013 a fevereiro de 2022, e contributos de todo o mundo.

Francisco cria um novo Dicastério para o Serviço da Caridade – terceiro na ordem -, representado pela Esmolaria Apostólica, que vê o seu papel reforçado dentro da Cúria Romana como “uma expressão especial da misericórdia”.

“Partindo da opção pelos pobres, os vulneráveis e os excluídos, exerce em qualquer parte do mundo a obra de assistência e ajuda-os em nome do Romano Pontífice, o qual, nos casos de particular indigência ou de outra necessidade, disponibiliza pessoalmente as ajudas a serem destinadas”, indica o artigo 79.

O Dicastério para a Doutrina da Fé, segundo a ser elencado, engloba a partir de agora a Comissão para a Proteção de Menores, criada em 2013, que continua a funcionar com suas próprias regras e os seus próprios presidente e secretário, nomeados pelo Papa.

Francisco sublinha que os leigos podem assumir funções de governo da Cúria Romana, por decisão pontificia.

“Todos os cristãos, em virtude do Batismo, são discípulos-missionários, na medida em que encontraram o amor de Deus em Cristo Jesus. Não se pode ignorar isso na atualização da Cúria, cuja reforma, portanto, deve incluir o envolvimento de leigas e leigos, também em papéis de governo e responsabilidade”, destaca o preâmbulo do texto.

Foto: Vatican Media

O Papa propõe a sinodalidade como modalidade de trabalho habitual para a Cúria Romana, propondo uma “sã descentralização” que ofereça novas competências aos bispos diocesanos e conferências episcopais.

A Santa Sé sublinha, entre outras novidades, a definição da Secretaria de Estado como “Secretaria Papal” e a transferência do Escritório do Pessoal da Cúria para a Secretaria para a Economia, com a indicação de que a Administração do Patrimônio da Sé Apostólica (APSA) deve atuar por “meio da atividade instrumental do Instituto para as Obras de Religião”, popularmente conhecido como ‘Banco do Vaticano’.

O Papa consagra, por outro lado, o princípio de que clérigos e religiosos em serviço na Cúria Romana devem ter um mandato é de cinco anos, que pode ser renovado por mais cinco anos, devendo depois regressar às dioceses e comunidades de referência.

Francisco, que iniciou solenemente o seu pontificado a 19 de março de 2013, tem sido particularmente crítico do “carreirismo” na Igreja Católica – uma das doenças identificadas no seu discurso à Cúria Romana, em 2014

Início solene do pontificado, 19.03.2013
Foto: Vatican Media

A nova Constituição procede a uma redução de Dicastérios, “combinando aqueles cuja finalidade era muito semelhante ou complementar”, a fim de “racionalizar as suas funções” e “evitar sobreposições de competências”, para tornar o trabalho mais eficaz.

Exemplo dessa fusão é o novo Dicastério para a Cultura e a Educação, que visa promover os valores da “antropologia cristã”.

O já anteriormente criado Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano integral, por sua vez, assume a missão de promover e defender “modelos equitativos de economia e estilos de vida sóbrios, sobretudo promovendo iniciativas contra a exploração económica e social dos países pobres, relações comerciais assimétricas, especulação financeira e modelos de desenvolvimento que criam exclusões”.

A Cúria Romana passa a ser constituída pela Secretaria de Estado, 16 dicastério, três tribunais, os organismos económicos, três departamentos e outras instituições ligadas à Santa Sé.

Francisco apresenta como critérios para desempenhar cargos de responsabilidades nos organismos centrais de governo da Igreja Católica a “vida espiritual, boa experiência pastoral, sobriedade de vida e amor aos pobres, espírito de comunhão e de serviço, competência nos assuntos que são confiados, capacidade de discernir os sinais dos tempos”.

OC

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Agência ECCLESIA

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