Homilia de D. José Traquina na Missa Crismal 2021

Quinta Feira Santa – Missa Crismal

Santarém, 01 de abril de 2021

Senhor Bispo D. Manuel Pelino, Caros Presbíteros, Diáconos, Aspirantes ao Diaconado Permanente, Irmãs de vida consagrada, seminaristas, acólitos, irmãos e imãs em Cristo.

A missa crismal, que no ano passado não pudemos celebrar na quinta-feira santa, é marcada pela participação dos presbíteros, com renovação das suas promessas da Ordenação sacerdotal e pela Bênção e Consagração dos santos óleos a usar nos sacramentos do Batismo, Crisma, Santa Unção e Ordem, e ainda na Dedicação das Igrejas e dos altares. Por tudo isto, esta celebração é um momento alto pela renovação da comunhão espiritual e eclesial dos presbíteros com o seu bispo, comunhão que reflete a presença de Cristo, cabeça da Igreja. Acontecendo neste dia, esta celebração ajuda a entender a origem pascal dos sacramentos, e evidencia a beleza da Igreja que deles nasce e se alimenta.

A Bênção do Óleo dos Enfermos leva-nos à consideração de todos os âmbitos da pastoral social, onde se inclui a pastoral da saúde e o cuidado pelos doentes. Radica na parábola do Bom Samaritano (Lc 10) que cuida do homem assaltado e caído na estrada da vida. Enfim, leva-nos à dimensão social do testemunho da comunidade cristã, no cuidado pelos mais fragilizados e doentes.

Se alguma coisa podemos aprender com esta crise da pandemia, é a certeza de que a sociedade, para ser verdadeiramente humana e organizada,  precisa que assumamos a vocação de vivermos uns com os outros e uns para os outros. Todo o empenho demonstrado nos últimos meses em salvar e cuidar pessoas idosas e doentes, revelou o que é implícito: não faz sentido falar de uma sociedade desenvolvida, se as pessoas não forem valorizadas e defendidas, seja qual for a sua idade.

Em sentido contrário, temos os sinais negativos, transmitidos em notícias, de maus tratos, violência e mortes em contexto de vida em comum, entre pessoas cujo relacionamento, em vez de humanizante e fraterno, é de poder e domínio do outro.

É necessário refletir sobre a sociedade que somos e que queremos ser e não remeter essa responsabilidade apenas para os que exercem cargos políticos. Temos na Doutrina Social da Igreja, os princípios desenvolvidos a partir do Evangelho para um pensamento cristão acerca do que é a pessoa humana e a edificação da sociedade. É a missão que a nova Comissão Diocesana Justiça e Paz está a iniciar.

Na Pastoral Social, inclui-se a ação da Pastoral da saúde, a partir das capelanias hospitalares e das pessoas que nas paróquias acompanham e visitam os doentes. A ação social desenvolvida pela Cáritas Diocesana e grupos paroquiais sócio caritativos, no apoio e acompanhamento aos migrantes estrangeiros, aos reclusos, à pastoral dos ciganos que necessita de ser organizada na nossa Diocese. E também as respostas nas situações de emergência.

Como escreveu o Papa Bento XVI: “O programa do cristão – o programa do bom Samaritano, o programa de Jesus – é um coração que vê. Este coração vê onde há necessidade de amor, e age de acordo com isso” (DCE 31)

O Óleo dos Catecúmenos, usado para tornar presente a purificação e o vigor espiritual de Cristo naqueles que se preparam para o Batismo, lembra-nos o desafio que temos da missão evangelizadora. Em tempos difíceis de pandemia, tem havido um esforço por manter a animação da Fé, pelas diversas formas de comunicação e pelo esforço de muitas famílias. Mas houve quebra de ritmo de evangelização, por impossibilidade de reuniões presenciais.

Os pastores são essenciais na animação da fé das comunidades, mas a catequese e a evangelização não avançarão, com êxito, se os cristãos leigos não estiverem animados na proposta da vida cristã. Para isso, é necessário o ardor e motivação como efeito da presença do Espírito Santo. Como escreveu o Papa Francisco, “evangelizadores com espírito quer dizer evangelizadores que se abrem sem medo à ação do Espírito Santo” (EG 259).

Assim, na medida em que as condições o permitirem, e contando com a generosidade dos cristãos leigos, preparemo-nos para promover a Catequese e as formas mais adaptáveis de primeiro anúncio para jovens e adultos. Propor o encontro com Cristo é uma proposta de qualidade, muito saudável, uma luz que enche de alegria o coração e a vida.

Em tempo de crise, a animação da pastoral familiar ressurgiu reforçada na nossa Diocese. A disponibilidade manifestada por vários casais para assumir responsabilidades na pastoral familiar, uma equipa no Departamento nacional e outra no Secretariado Diocesano, é um sinal promissor do lugar dos leigos na missão da Igreja. Ainda mais, porque a Pastoral Familiar é abrangente à Pastoral da preparação de Batismos, Preparação dos noivos para o Matrimónio, Pastoral das pessoas idosas, Pastoral das pessoas com deficiência, e extensiva às várias dimensões da Pastoral Social, Pastoral Juvenil, Catequese e Vocações.

No Ano da «Família Amoris Laetitia», como pastores, compete-nos acolher e acompanhar estes sinais com alegria e esperança.

Como escutámos no Evangelho, na Sinagoga de Nazaré, Jesus revela a sua motivação e define o seu programa com a leitura do Profeta Isaías. “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me ungiu para anunciar a boa nova aos pobres…”. A consagração do Óleo do Santo Crisma acontece pela evocação do mesmo Espírito Santo. Assim, somos neste tempo a continuação da Igreja do Pentecostes, Igreja em que o Espírito Santo é o principal protagonista. Foi neste Espírito que, ao longo dos tempos, se empreenderam iniciativas de evangelização que chegaram até nós.

Foi com a mesma Unção do Espírito que o Senhor nos consagrou como filhos de Deus, no Batismo, nos fortaleceu com a sua plenitude, no Crisma, e nos Ordenou para assumirmos o Seu ministério e a Sua missão. Trazemos um tesouro em vasos de barro. Mesmo assim, não menosprezemos a Unção da nossa Ordenação que permanece e nos habilita para a missão.

Ungir uma pessoa com o sagrado óleo do Crisma é uma ação que acontece no contexto de uma Liturgia, e envolve-nos porque estamos a dar o que também nós recebemos. Citando o Cardeal Bergoglio, depois Papa Francisco: “Ungir é um gesto que se faz com todo o ser, com as mãos, com o coração, com a palavra. É um gesto de doação total, um gesto que quer ser fecundo e vital. Um gesto de Pai”. A unção tem a ver com uma oração apostólica que tem o selo do júbilo de Jesus (…). Tem a ver com a proximidade (…). Tem a ver com o bom humor que dá o tom ao trabalho quotidiano (…). A unção tem a ver com a misericórdia (…) e também com a pregação. (Buenos Aires, 2011).

Na sinagoga de Nazaré, em contexto de assembleia de crentes, Jesus foi um bom leitor e bom comentador. Sabia o que estava a fazer e qual o significado daquele momento e daquela palavra.

A Liturgia da Igreja supõe a continuada formação espiritual e pastoral das pessoas intervenientes. Num tempo em que se vislumbra a instituição de Leitores e Acólitos, entre os leigos nas Paróquias, é nossa responsabilidade de pastores cuidar de o promover, com benefício para a qualidade das nossas celebrações litúrgicas.

Caros padres, este dia de Quinta-feira Santa, com a acentuada dimensão de fraternidade dos discípulos de Cristo, é um apelo à nossa consideração e estima de uns pelos outros, no reconhecimento de que estamos todos vinculados pelo mesmo sacramento da Ordem, pela mesma Eucaristia que celebramos com o povo de Deus, pela mesma graça espiritual que tem em Cristo Pascal a sua origem.

Sintamo-nos gratos, porque nenhum de nós foi chamado por mérito. Foi e é por bondade e compaixão pelo seu povo que o Senhor Jesus nos chamou e continua a chamar novos candidatos para o exercício do seu ministério.

Renovai os vossos compromissos, tendo presente a palavra de São Paulo a Timóteo (2Tim 1,6) «Recomendo-te que reanimes o dom de Deus que se encontra em ti, pela imposição das minhas mãos”. Irmãos sacerdotes, que a vossa resposta «Sim, quero», seja uma afirmação de fé e confiança em Cristo, «Aquele que nos ama e pelo seu sangue nos libertou do pecado e fez de nós um reino de sacerdotes para Deus, seu Pai» (Ap 1,5-6), como ouvimos do Livro do Apocalipse.

A Virgem Maria, Mãe dos discípulos, e São José, Patrono universal da Igreja, nos acompanham.

+ José Traquina

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