Viseu: Homilia da Ceia do Senhor de D. Ilídio Leandro

Esta celebração revela-nos o fundamental da Páscoa, a síntese e os objectivos da presença de Jesus entre nós. A Páscoa é tão importante e decisiva, como Festa de libertação e realização do Plano de Deus, que precisa de ser celebrada ao longo dos tempos, assumindo sempre a forma ritual, num memorial que a realiza e que congrega os fiéis, discípulos e seguidores de Jesus Cristo. É celebração indispensável ao sentido comum de um povo livre, ao ponto de se celebrar como memorial e concretização sacramental de algo que se perpetua no tempo e no espaço – sempre como libertação a acontecer.

Olhando as leituras de hoje, lemos, nas 2 primeiras, as 2 Páscoas – a do Antigo e a do Novo Testamento. No Evangelho, é narrado um facto que, sem o enquadramento de João e sem um entendimento na relação com a Eucaristia e com a comunhão, ficaria sem relevância. Jesus quis tornar o lava-pés dos Seus discípulos, enquanto gesto e símbolo, momento e gesto essenciais para o entendimento da Eucaristia e do Sacerdócio. Com o lava-pés, 2 ensinamentos profundos brotam da atitude de Jesus: a Eucaristia é força e sinal de comunhão e deve expressar a relação fraternal que temos uns com os outros. Por outro lado, não há maior nem menor no Reino de Deus. A autoridade concretiza-se no serviço aos mais pequenos e aos mais necessitados; vive-se e exerce-se no amor. Nós, sacerdotes, somos chamados a fazê-lo. Jesus é Mestre. O Papa ajuda-nos e dá o exemplo.

Na Páscoa deste ano, Jesus continua a perguntar-nos, como naquele dia perguntou aos discípulos: “compreendeis o que vos fiz”? Não sei se compreendemos, como, naquela hora, os discípulos não compreenderam… Ele continua a lavar-nos os pés, quando nos dá o perdão, quando nos dá a Eucaristia, quando nos anuncia a Palavra… Ele é Mestre, Senhor e Deus e lava-nos os pés, estando connosco e ao nosso serviço. E pede-nos: “dei-vos o exemplo, para que, assim como Eu fiz, vós façais também”. Está aqui o perfeito modelo, a ética e a referência máxima para o comportamento cristão… Fazer como Jesus, na identidade cristã, na vocação sacerdotal, na missão de anúncio do Reino de Deus, é lavar os pés uns aos outros, em atitudes de amor, de verdade, de misericórdia, de justiça, de perdão, de bondade… Também de correcção fraterna.

A Eucaristia é a lição para aprendermos o exemplo e comportamento de Jesus. João, em vez de nos descrever a instituição da Eucaristia, como fazem os outros evangelistas, descreve-nos o gesto do lava-pés. Marcou-o tanto que, para João, não há Eucaristia sem lava-pés; não há encontro com Jesus sem encontro com os irmãos; não há comunhão nem união com Jesus sem comungarmos os irmãos e vivermos a união com os outros… João deixou esta catequese bem clara no Evangelho que nos escreveu…

Por isso, em S. João, não estranhamos por aparecer em tão estreita unidade a Eucaristia e o lava-pés, ainda que leve Pedro a reagir. São 2 gestos que transmitem humildade, amor e serviço… Humildade, amor, serviço – as atitudes que mais falta fazem e, sem elas, não se pode anunciar o Reino de Deus.

Humildade, amor, serviço – atitudes essenciais para podermos ter, neste dia, a instituição da Eucaristia, do Sacerdócio e a proclamação solene do Mandamento Novo. Eucaristia: centro e fonte de vida cristã (o máximo de humildade, no amor e no serviço da parte de Jesus); Sacerdócio: o padre, seguidor e em união com o Sumo e eterno Sacerdote, é chamado a viver a vocação e a missão na humildade, no amor e no serviço, perpetuando a presença de Cristo no memorial; Mandamento Novo: sem amor, nem a Eucaristia se deve celebrar e o Sacerdócio perderia o sentido.

O Sacerdote faz actual e torna presente a Eucaristia, feita sacramento de Cristo e oferta perene e eterna para salvação de todos. Sempre que se celebra, não se faz um novo sacrifício de Cristo, bem como, quando as intenções dos fiéis são múltiplas, o sacerdote não multiplica o sacrifício de Cristo. Este é um e único, celebrado e tornado presente pelo Papa, pelo Bispo, por cada Sacerdote. Sempre em favor dos homens e da implementação do Reino de Deus no Mundo.

5ª- Santa: Abertura e leitura do Testamento de Cristo. Dá-nos estas 3 prendas – heranças de valor infinito: Eucaristia, Sacerdócio, Mandamento do Amor. As 3 fazem e identificam a Igreja, juntamente com a Sua Palavra que explica e realiza as 3. As 3 tornam-se presentes na continuidade da adoração e na oração que somos convidados a fazer, sempre que visitamos o sacrário… O maior serviço do padre é ser celebrante dos sacramentos que tornam Jesus presente na vida das pessoas e para a vida do mundo.

A nós, sacerdotes, religiosos e leigos coloca-se um desafio: fazer o que Paulo diz na 2ª leitura – transmitir fielmente o que recebemos. Está nisto a fidelidade à Boa Nova e aos seus valores. Está nisto a fidelidade às sãs tradições e à transmissão fiel e viva a todos os nossos irmãos que, em Assembleia eclesial, as celebram, as vivem e as testemunham.

Maria, Senhora do Altar-Mor, Senhora da Palavra e Mãe de Jesus Eucaristia! Agradece, connosco e por nós, a grandeza do amor de Jesus Cristo, nosso Divino Salvador. Jesus, dá-nos um coração que escute, veja e ame, para que, escutando a Palavra e celebrando a Eucaristia, nós amemos e ponhamos em prática o Teu Mandamento – o Mandamento do amor. Aprendendo contigo e seguindo-te, como o nosso Mestre e Senhor, nos tornaremos Teus discípulos/missionários no anúncio do Reino. Reino que És Tu, com o Pai, na unidade do Espírito Santo. AMEN.

D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseu

Sé, 17 abril de 2014

 

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