Vidas em espera

Refugiados procuram integração em Portugal, que se inicia com o processo de legalidade, procura de emprego, habitação, formação linguística quando necessário, educação Incontornáveis na formação das sociedades actuais, os fluxos migratórios colocam constantes desafios à pastoral da Igreja Católica. Há 94 anos que a Igreja assinala a Jornada Mundial do Migrante e Refugiado, fixada no Domingo do Baptismo do Senhor, que em 2008 se celebra a 13 de Janeiro. Em Portugal, a Agência Ecclesia, a Caritas Portuguesa e a Obra Católica Portuguesa de Migrações promovem no mês de Janeiro, desde o ano 2000, um Encontro destinado a quem trabalho prioritariamente com os migrantes. O VIII Encontro de Animadores Sócio Pastorais das Migrações é apresentado num dossier especial, onde se analisa esta problemática na sociedade portuguesa: Rui Marques procura coerências para mobilidade humana em contexto europeu; Frei Francisco Sales escreve sobre os desafios que as migrações colocam à Igreja Católica. A reportagem AE quis saber como vivem os refugiados. A maioria dos pedidos de asilo por parte de refugiados em Portugal são negados. A uma resposta célere que é dada numa primeira fase do processo do pedido de protecção – cerca de dois meses – segue-se um tempo indeterminado de espera. O Serviço Jesuíta aos Refugiados, em coordenação com o Conselho Português para o Refugiado, entra em campo na segunda fase do processo. O CPR dá “toda a resposta no pedido de asilo”, e se este é negado ou a pessoa se encontra numa situação mais frágil “nós tentamos ajudar”, aponta Rosário Farmhouse, directora do JRS-Portugal, à Agência ECCLESIA. A segunda etapa de ajuda compreende a integração em Portugal, que se inicia com o processo de legalidade, procura de emprego, habitação, formação linguística quando necessário, educação. Rosário Farmhouse, destaca que as condições portuguesas de acolhimento são “fantásticas”. Exemplo disso é o Centro de Acolhimento da Bobadela, em Loures, da responsabilidade do Conselho Português para os Refugiados e celeridade na apreciação do processo, que a Directora do JRS afirma ser um prazo “aceitável”. O problema surge com os pedidos de recurso, que estes sim, “se estendem indefinidamente”. Com esta extensão, prolonga-se a indefinição na vida das pessoas. Esta situação, célere inicialmente, justifica-se pelo pequeno número que pedidos de asilo que chegam a Portugal. “Mas também por isso, não se percebe porque se prolongam posteriormente”. À negação do pedido de asilo, e quando a pessoa não consegue protecção humanitária e “de facto teme regressar ao seu país de origem”, segue-se uma “situação irregular, sem apoio”, por vezes contando apenas com respostas das organizações católicas, mas também pontuais. “Portugal pode trabalhar mais na celeridade das respostas para evitar o hiato na vida das pessoas”. Rosário Farmhouse sugere uma protecção temporária, mas que possibilite a autonomização das pessoas “enquanto o processo é analisado com calma”. A Directora do JRS aponta a dificuldade de se apreciar um processo com este, reconhecendo ser difícil “provar uma perseguição”, quando muitas vezes faltam provas de ameaça explícita. No entanto, apela a um “humanismo por detrás da decisão”. As organizações católicas presentes nos diferentes países, podem dar uma “ajuda preciosa” na prova de situações de perseguição e na regularização dos processos. O critério de base para apreciação do pedido de asilo é a prova de perseguição, e o reconhecimento, por parte de Portugal, que no país de origem “não há democracia ou liberdade e onde as pessoas estão em risco”. A história tem de estar bem fundamentada e “a pessoa sob stress não consegue contar os detalhes todos”. Rosário Farmhouse adianta que “algumas vezes as situações que descrevem não são reais”, mas não deve ser por isso que se deve desistir, “até porque se tratam de vidas”. Apesar da clandestinidade, “as pessoas temem mesmo o retorno ao seu país de origem e acabam por preferir a ilegalidade ao retorno à insegurança”. Situação frequente também é depois da negação da primeira fase do processo, “as pessoas optam por ir para outro país da Europa, encontrar amigos ou comunidades”. Dificuldade na autonomização O prolongamento da estadia nos centros, apesar de em condições muito diferentes dos campos de refugiados, é uma preocupação do JRS, que disponibiliza o Centro Pedro Arrupe, para o acolhimento de quem se encontra em situações de emergência. Mas as situações de emergência prolongam-se no tempo. Rosário Farmhouse aponta que o Centro acolhe pessoas em duas situações. Muitas chegam a Portugal pedindo asilo e após a resposta negativa, aguardam o resultado do recurso. Outros exemplos há de pessoas que ao abrigo dos acordos de saúde com a Guiné Bissau e São Tomé e Príncipe vieram para Portugal, mas os países de origem, responsáveis pela parte social deste acordo “não têm capacidade de resposta”. As pessoas têm de aguardar, não podendo regressar ao seu país de origem nem podendo trabalhar em Portugal. Para um Centro de acolhimento temporário que previa uma estadia de quatro meses, “chegam a permanecer mais de um ano, porque não temos como autonomizá-las”, refere a Directora. “Há uma necessidade de encontrar respostas adequadas”. Uma situação que não se restringe ao quadro nacional, mas é de âmbito internacional, “para que todas as pessoas tenham direito a viver a sua vida com dignidade”. Os refugiados e requerentes de asilo sentem “um hiato nas suas vidas”, um espaço em que a sua vida, “aliado a sofrimento e dificuldade na retoma”. O JRS manifesta uma grande preocupação pela educação das crianças, porque “manter as crianças a estudar, é um motivo de esperança para as famílias”, explica. Nem sempre é fácil e quando a situação é nova, “em que não se sabe bem em que ano é que a criança estuda e há a barreira da língua do país de acolhimento”, regista-se um período de impasse e de sofrimento. Rosário Farmhouse aponta, no entanto, que em Portugal há abertura das escolas no acolhimento a crianças estrangeiras. Promover a interculturalidade No ano consagrado ao Diálogo Intercultural, o JRS quer desenvolver mais incisivamente esta temática, dando a conhecer as comunidades que já se encontram em Portugal e promovendo a sua integração e inter-relação. Este é um ano para também consolidar projectos internos com a equipa e com as novas instalações que disponibilizam. O JRS prevê um novo programa de médicos com vista ao reconhecimento de competências. Em parceria com o Ministério da Saúde e com a Fundação Calouste Gulbenkian, este é um passo “importante para a integração e para uma ajuda mútua”. Foto: CPR Dossier AE • Migrações

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