Um espaço único de debate

Manuel Pinto, professor do Departamento de Ciências da Comunicação do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho (UM), é responsável pelo Weblog colectivo Jornalismo e Comunicação, e foi um dos promotores do 1º Encontro Nacional sobre Weblogs Manuel Pinto, professor do Departamento de Ciências da Comunicação do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho (UM), é responsável pelo Weblog colectivo Jornalismo e Comunicação, e foi um dos promotores do 1º Encontro Nacional sobre Weblogs. À Agência ECCLESIA fala desta nova realidade, que desafia a Igreja para descobrir novas pessoas e linguagens Agência ECCLESIA – Há alguma explicação para o sucesso dos “blogs”? Manuel Pinto – Por um lado temos o aspecto da novidade e da curiosidade, que atrai muita gente, mas acima de tudo, aquilo com que nos confrontamos é com a emergência de uma ferramenta que permite – de um forma muito mais fácil – que um maior número de pessoas tome a palavra no espaço público. AE – A Internet não oferecia já instrumentos suficientes? MP – A lógica do “site” tradicional implica algum conhecimento, uma linguagem específica, enquanto que a oferta de um alojamento, gratuito, deste tipo de espaços de fácil criação e manutenção, como os Weblogs, vem abrir ao comum dos mortais uma possibilidade que era monopólio dos jornalistas: a possibilidade de escolher, editar e difundir informação. Essa democratização e o aspecto da novidade que a Internet ainda representa ajudam a compreender melhor a proliferação de blogs. AE – De quantos espaços como este estamos a falar, no nosso país? MP – Havia um jornalista que, até Julho de 2003, mantinha uma contabilidade de todos os blogs que iam aparecendo, mas a dada altura perdeu a capacidade de enumerá-los. Isso é significativo. Houve um “boom” enorme no período de Abril a Junho do ano passado, com o surgimento de pessoas mais mediáticas, o que fez com que os Media colocassem a questão. A criação foi em catadupa, não há quantificações elaboradas, mas penso que se fala em largos milhares. Internacionalmente o fenómeno envolve vários milhões, sendo que muita gente cria a o blog para sentir que entrou na onda, mas depois perde o interesse e não actualiza o seu espaço. AE – Vamos presenciar à criação de novos protagonismos? MP – Bom, há casos em que o protagonismo precede o surgimento do blog, mas há situações em que o fenómeno que o próprio blog corporiza que ganha protagonismo. Para mim, acho mais interessante, como observador deste fenómeno, o acesso ao espaço público de um número maior de pessoas e com possibilidade de aumentar – sobretudo quando se pensa em respostas específicas a necessidades que se identificam na sociedade. Além disso, é notável o escrutínio dos Media tradicionais, com uma atenção ao quotidiano, oferecendo uma interactividade que os “sites” dos Media ainda não disponibilizava e evitando que a reacção do cidadão se perca na azáfama do dia-a-dia. Esta ideia é mais do que uma moda passageira, com certeza. AE – O fenómeno religioso está a ganhar espaço na blogosfera? MP – Estão a acontecer coisas muito interessantes a esse nível, com dois fenómenos paralelos: os blogs que se definem como “confessionais”, fazendo da temática religiosa o seu tema, e os que debatem questões ligadas à religião nos espaços não-confessionais. Houve já debates muito interessantes, que não acontecem nos Media clássicos: quando há um documento da Santa Sé, ou algum acontecimento de grande impacto ligado à Igreja Católica, surge um debate muito grande, até com a facilidade de ligar-se a outros sítios da Internet. A possibilidade da réplica, em forma de comentários, e a amplificação do debate, por causa da relação entre bloggers, só acontece, desta forma, em muito poucos espaços. Parece-me que isso é muito importante, é um modo de captar gente que, aparentemente, não é muito sensível a determinadas questões. Ainda assim, há muito para andar, pois há possibilidades que se podem explorar, porque os nossos recortes, as coisas interessantes que gostamos de guardar para mais tarde utilizar podem ser armazenadas no blog. AE – Quer dizer que se consegue ver o que, normalmente, anda escondido? MP – Para mim foi uma surpresa encontrar tantos espaços ligados ao judaísmo, por exemplo. O facto de haver vários bloggers assumidamente judeus faz com que certas temáticas sejam objecto de debate e comentário, mesmo se não concordarem todos. Lembro ainda o eco que teve o debate sobre a Fé entre o Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, e o Eduardo Prado Coelho, nas páginas do DN. AE – A sociedade está mais atenta ao que se escreve nos blogs? MP – Posso dizer que no “Jornalismo e Comunicação”, que é especificamente orientado para a actualidade mediática, todos os dias há gentes dos Meios de Comunicação Social que acedem aos conteúdos, o que mostra que já entrámos na rotina da informação. Parece-me evidente que os Media comecem a ter blogs de referência nas suas áreas, porque ali se faz um duplo trabalho: referenciar o que se publica e avançar questões que passam ao lado das nossas preocupações. AE – E no caso da Igreja, tem de haver mais atenção à blogosfera? MP – As novas “ágoras” do nosso tempo passam por aqui, são novas formas de encontrar gente que não se vê em outros sítios. Por uma lado temos aqui um novo instrumento; por outro lado, é um desafio para colocar questões, de uma forma nova, interagindo com outro tipo de gente. Claro que não temos de passar todos a viver na Internet, mas trata-se de alargar horizontes e aceitar ir à liça, conversar com pessoas que não conhecemos, mas estão interessadas em questionar e em obter respostas. O modo como se está na blogosfera, como se entra no diálogo com os outros, pode ser altamente significativo e transformar-se num contributo para uma opinião pública – inclusive dentro das igrejas – esclarecida e capaz de argumentar numa sociedade plural. Aqui em Braga temos a experiência do projecto “Igreja na cidade” (denominado “Reflexões”), que, embora seja limitada a um grupo reduzido de pessoas, consegue ser referenciado em vários blogs laicos ou ligados a outras confissões. Isso foi um sinal extremamente positivo e saudado.

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