Ucrânia: «Em situações de conflito, a prevalência de doença mental duplica», alerta psiquiatra português

Miguel Palma coordena de atividades de saúde mental dos Médicos Sem Fronteiras, em território ucraniano

Foto: Lusa/EPA

Lisboa, 12 jun 2022 (Ecclesia) – O psiquiatra Miguel Palma, coordenador de atividades de saúde mental dos Médicos Sem Fronteiras (MSF), em território ucraniano, alertou para o aumento dos problemas nesta área, em cenários de guerra.

“Em situações de conflito, a prevalência de doença mental duplica. Se a doença mental grave, em situações normais, existe em 2% da população, passa a 5%, em situações de conflito; nas doenças mentais moderadas a leves, passa dos 10% para os 20%. Sem falar no sofrimento generalizado”, assinalou o especialista, em entrevista à Agência ECCLESIA e Rádio Renascença.

O membro dos MSF destaca a necessidade de acompanhamento psicossocial das vítimas do conflito.

“É importante que a pessoa compreenda que tomou determinadas ações numa lógica que é excecional, tentar apaziguar um pouco alguns sentimentos de culpa, de raiva, que que possam decorrer desta situação”, precisa.

O médico português viajou até à Ucrânia, em março, para uma avaliação inicial, e regressou a 25 de maio, com o objetivo de ficar três meses e apoiar as atividades dos Médicos Sem Fronteiras.

As prioridades, explica, passam pela “evacuação de populações vulneráveis que possam estar na linha da frente” e o apoio psicológico a populações vulneráveis, “nomeadamente as que estão deslocadas, neste momento”.

Para o psiquiatra, a intervenção precoce é “crucial”.

“Quanto mais cedo se fizer uma intervenção terapêutica, maior o potencial de proteção e de prevenção do desenvolvimento de patologias mais graves”, explica.

O convidado da entrevista semanal Renascença/Ecclesia, emitida e publicada a cada domingo, diz que no terreno se encontram “histórias impressionantes, devido ao drama humano que representam, mas também pela impressionante resiliência do povo ucraniano”.

Miguel Palma realça a importância da intervenção junto das crianças, pelo seu “potencial reabilitativo”, visando “minimizar o impacto da guerra, o impacto da pandemia, do deslocamento” no desenvolvimento dos menores.

O médico fala num “sentimento de esperança” entre os ucranianos, que considera “muito importante para fazer com que as pessoas prossigam a sua vida, o mais normal possível”.

Quanto à presença no terreno, o entrevistado aponta que estar “onde mais ninguém está” pode “fazer a diferença na vida de uma pessoa”.

Questionado sobre os efeitos negativos da “difusão permanente de imagens da guerra”, o especialista admite que esta possa ter “efeitos perniciosos”, recomendando que as pessoas se afastem das redes sociais e procurem “informações corretas”.

“Há o risco de um esgotamento emocional por via desta exposição excessiva a imagens terríveis de guerra e a informação que gera ansiedade”, adverte.

Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)

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