Taizé: Irmão David convida a reflexão sobre «autenticidade» da Igreja para acompanhar quem a procura

Monge fala da atitude da comunidade perante casos de abuso sexual, do Sínodo e da participação da comunidade ecuménica na JMJ Lisboa 2023

Foto: Agência ECCLESIA/MC

Lisboa, 26 out 2022 (Ecclesia) – O irmão David, monge português a residir na comunidade ecuménica de Taizé, em França, afirmou que os jovens procuram a “autenticidade”, muitas vezes em locais diferentes dos tradicionais.

“Vejo muita vontade de autenticidade nos jovens. Há muitos jovens que hoje vão à Igreja e aquilo não lhes diz nada. Têm perguntas e vão procurar noutro sítio. Querem coisas que sejam autênticas para eles. Acho isso muito bonito. Pode levar a situações muito ligeiras porque as coisas não são sempre preto e branco, mas o desejo de autenticidade fá-los procurar coisas verdadeiras”, disse à Agência ECCLESIA.

O membro da comunicadade ecuménica indica que a reflexão sobre a autenticidade deve ser feita por toda a Igreja e todos os leigos.

“Todos temos essa reflexão para fazer para responder à vontade de autenticidade dos jovens. Eles gostam da oração porque a vivem, gostam de falar da Bíblia em grupos de partilha porque falam eles. (é importante) valorizar o desejo de autenticidade e não nos assustarmos com eles, eles sabem o que querem. Nunca podemos forçar a consciência de ninguém mas podemos ajudar as pessoas a ouvir a sua própria consciência”, acrescenta.

O irmão David esteve em Portugal para participar num encontro internacional de preparação da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Lisboa 2023, onde a Comunidade de Taizé vai estar presente, “numa igreja, na Baixa de Lisboa”, convidando a fazer o que, indica, a comunidade faz de melhor: “Vamos acolher quem quiser para rezarmos juntos”.

Foi em 1987 que o, agora, irmão David conheceu a espiritualidade de Taizé e uma forma de rezar surpreendente.

Aquele estilo de oração foi uma descoberta: uma oração cantada, alegre, uma oração em que respiramos; hoje diria, uma oração onde descansamos em Deus. E onde o silêncio marca. Não estamos só para dizer alguma coisa, só para ouvir uma mensagem, mas estamos para estar com, e este estar com, ultrapassa as palavras. E o silêncio é um saber estar sem olhar para o relógio, sem estar a pensar no que vamos responder a seguir, preocupados com o que estamos a fazer, mas estamos porque estamos bem”.

O irmão David recorda a sua história para entender que hoje os jovens que chegam a Taizé continuam a procurar um sentido para a sua vida e a comunidade recebe todos, desde 1940, quando o fundador, o irmão Roger, foi para a Borgonha, para ali permanecer e fundar uma comunidade onde irmãos de diferentes Igrejas cristãs, vivem juntos.

“A união que pode haver entre diferentes igrejas e a união com crentes de outras religiões são diferentes. O que vivemos e testemunhamos é que a união, comunhão existe entre cristãos de diferentes Igrejas é tão profunda que permite a uma comunidade viver como irmãos, uma vida inteira, para seguir Cristo juntos”, explica.

“Para nós é importante acolher o outro, aceitar a diferença – não só por respeito e humanismo, porque Deus nos criou diferentes temos de aprender a viver e aceitar essas diferenças – mas mais do que isso: em cada um há qualquer coisa de Deus. Fazemos sempre uma imagem muito limitada de Deus. Se eu fico limitado a essa visão a imagem é muito pequenina”, acrescenta.

Sobre os abusos sexuais na Igreja Católica, o irmão David fala na necessidade de falar com verdade, transparência e respeito pela vítima que sofre, e explica que, quando confrontada com denúncias sobre abusos cometidos em encontros por parte de outros participantes mas também sobre irmãos da comunidade, a comunidade quis assumir “com transparência e verdade”.

“Quando soubemos dos casos, não quisemos fechar os olhos. Queremos em primeiro lugar acompanhar a pessoas que sofrem e em segundo na transparência que é o reconhecimento do sofrimento das pessoas, e fazê-lo publicamente”, explica.

A comunidade constituiu uma comissão para receber denúncias e a cada pessoas que chega a Taizé recebe informação sobre como proceder para “denunciar se vir alguma coisa que coloque em causa a integridade” de uma pessoa.

O irmão David referiu-se ainda ao processo sinodal em curso na Igreja Católica, afirmando terem enviado a sua reflexão para a secretaria do Sínodo, e indica que a comunidade, dando eco de um “sonho” do irmão Alois, atual prior de Taizé, procura formas abrir o processo a “pessoas fora da Igreja Católica”, uma vez que, explica, a Igreja constrói-se com o “contributo e oração” de todos.

O irmão David afirma ainda a importância de se trabalhar por uma Igreja “que é mãe” e que por isso, deve ouvir o “contributo das mulheres”, e que deve, desde já “praticar a sinodalidade e ouvir todos”.

“A realidade LGBT é uma realidade que coloca muitas questões, mas antes de colocar as questões, será que nos preocupamos em acolher as pessoas? Em ouvir? O que têm a dizer? O que vivem? Como se sentem excluídas? Para a comunidade de Taizé esta realidade não é teórica. Chegam pessoas com grandes sofrimentos, delas e dos seus familiares, e como acolhemos e ouvimos?”, indaga.

A conversa com o irmão David pode ser acompanhada esta noite no Programa ECCLESIA, emitido pouco depois da meia-noite na Antena1 da rádio pública e, posteriormente, em formato podcast e no portal da Agência ECCLESIA.

LS

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