Revista «Communio» desafiada a criar pontes entre a fé e as culturas

A edição portuguesa da Revista Internacional Católica «Communio» assinala em 2008 os seus 25 anos de existência, altura em que lhe são lançados desafios na relação entre fé e culturas, na sociedade actual. A efémeride foi comemorada esta semana, na Universidade Católica Portuguesa, com uma Colóquio presidido pelo Cardeal-Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, e subordinado ao tema “A Fé ao desafio das culturas”. Partindo das obras dos três mais importantes fundadores internacionais da revista – Henri de Lubac, Hans Urs von Balthasar e Joseph Ratzinger, hoje Bento XVI –, a identidade e a missão da «Communio» foram passadas em revista, em particular no seu papel de ponte entre o mundo da teologia e as diversas culturas, como destacou o actual director da publicação, Henrique Noronha de Galvão. Jean-Robert Armogathe, professor na École Superieure des Hautes Études (Sorbonne), de Paris, apresentou a figura de Henri de Lubac, um “investigador da verdade” que soube integrar no discurso teológico várias referências culturais, algo que ainda hoje permanece como um desafio permanente. Já Elio Guerriero, responsável editorial das Edições San Paolo de Milão, apresentou Hans Urs von Balthasar, cuja grande batalha foi, segundo o especialista, “levar a cultura a dizer o facto cristão”. Jan-Heiner Tück, professor de Teologia na Universidade de Freiburg, abordou o pensamento do actual Papa, Joseph Ratzinger, centrando-se na sua luta contra a descrença, o cepticismo e a “ditadura do relativismo”. Os baptizados, lembrou, “não acreditam em nada porque acreditam em tudo”, mas a Igreja não está disponível “para se relativizar a si mesma”. Este especialista lembrou que para Bento XVI a cultura deve englobar convicções fundamentais da comunidade e as questões do homem sobre si mesmo, funcionando assim como “uma porta aberta ao divino”. A “crise” das culturas pode ler-se, desta forma, na ausência de elementos normativos. Destas exposições partiram desafios para o futuro da publicação, na relação com as correntes de pesquisa contemporâneas, apresentando um programa teológico a vários níveis. O Pe. Peter Stilwell, director da Faculdade de Teologia, questionou os conferencistas sobre uma eventual ausência de vozes como aquelas que tinham acabado de ser apresentadas, na Igreja de hoje. Este responsável perguntou mesmo “até que ponto a Igreja tem medo da pluralidade de vozes” no nosso mundo. Elio Guerriero destacou que pessoas como Henri de Lubac ou Hans Urs von Balthasar “continuam entre nós” mesmo depois da sua morte e que o desafio da «Communio» é “levar por diante o seu método”. O italiano lamentou que a actual cultura teológica seja marcada, em vários casos, por “escolhas perigosas” que não assumem a plenitude da fé católica. José Tolentino Mendonça, director do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, lembrou a “coragem” que cada um dos três teólogos apresentados colocou “no começar de novo a descoberta do cristianismo”. Em relação ao tema do colóquio, o padre e poeta sublinhou que, ao falar de culturas, a «Communio» mostra-se atenta “à atmosfera que já não é homogénea”, mas feita de “complexidades”, numa realidade que, de tão plural, chega mesmo “ao paradoxo”. Nota histórica A ideia de fundar uma revista nasceu de Hans Urs von Balthasar, que pretendia criar um órgão de diálogo entre a fé cristã e as questões actuais levantadas pelas culturas. Um primeiro projecto de elaborar um livro com esta finalidade fora abandonado, pois as culturas evoluem, presentemente, a ritmo tão vertiginoso que tornaria rapidamente obsoleta uma tal obra. Era, antes, necessário criar um órgão de diálogo permanente, que não apenas acompanhasse o evoluir constante dos problemas, mas tivesse também em conta as diferenças entre as diversas culturas, na Europa e nos outros continentes. De referir ainda a influência e colaboração do então teólogo alemão Joseph Ratzinger e actual Papa Bento XVI, e do francês Henri de Lubac, quando, no decorrer da primeira sessão da Comissão Teológica Internacional, em 1969, o projecto começou a tomar forma. Em 1972 surgiam as edições alemã – com o concurso de Albert Görres, Hans Meier e Karl Lehmann –, e a italiana dirigida por Giuseppe Ruggieri. Num tempo em que a importância da eclesiologia de Comunhão nos documentos do concílio Vaticano II, mal tinha sido descoberta pelos teólogos, a palavra communio surgiu, já então, como a mais adequada para designar o projecto que a nova revista queria servir. O conceito teológico de «Communio» é, em primeiro lugar, expressão do próprio Deus, revelado por Jesus Cristo como Mistério de diálogo trinitário que se torna Dom de Comunhão para os homens no Espírito Santo (cf. 2Co 13,13). Como Dom de Deus se realiza, pois, a comunhão entre os homens. Nesta perspectiva se deve entender a catolicidade da Igreja, na qual todos os carismas são chamados a servir o único Jesus Cristo (cf. 2Co 10,5). N’Ele, tudo o que é humano diz respeito à fé cristã. No seu sentido forte e originário, a catolicidade tornará possível aos cristãos ultrapassar as barreiras das diversas confissões, e a todos os homens reencontrarem-se numa verdadeira comunhão. Para isso torna-se hoje cada vez mais importante o diálogo inter-religioso. A edição portuguesa iniciou-se em 1984, fazendo parte da primeira Direcção, Manuel Isidro Alves, Henrique de Noronha Galvão e José Eduardo Borges de Pinho. Desde então é editada pela Associação de Teologia e Cultura Cristã, entre cujos sócios fundadores se encontram o Cardeal Patriarca D. António Ribeiro, o Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, Carlos Baptista da Silva, Fernando Dias Agudo, Luís de Oliveira Ramos e Maria de Lurdes Belchior. Contou com o apoio particular do Bispo de Coimbra, D. João Alves, e o aconselhamento jurídico do Prof. Doutor Germano Marques da Silva. «Communio» é uma revista de carácter internacional, actualmente editada em 14 línguas e mais de 16 países: Alemanha, América do Norte, Argentina, Brasil, República Checa, Croácia, Eslovénia, Espanha, França, Holanda/Flandres, Hungria, Itália, Líbano (em língua árabe, actualmente suspensa), Polónia, Portugal e Ucrânia. O estatuto da revista garante autonomia e liberdade de iniciativa a cada edição, com o intuito de respeitar a fisionomia cultural e nacional de cada povo e apontar soluções aos problemas específicos de cada região e cultura. A «Communio» é anualmente programada pelas redacções dos diversos países, que em seguida permutam entre si, com total liberdade de escolha e utilização, o material proposto. Cada número trata de um tema central, a que se podem juntar artigos de especial interesse para a época litúrgica, para a realidade portuguesa ou de premente actualidade. A sua Redacção é constituída por padres, religiosos e leigos, homens e mulheres, que pensam ser urgente estimular o diálogo entre a fé e a cultura. Tem a sua sede em Lisboa, mas procura, nomeadamente através do seu Conselho de Redacção, que as diversas zonas do país estejam nela representadas. www.communio.com

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top