«Quando o novo arcebispo chegar, que veja uma Igreja unida, em comunhão, empenhada» – D. Jorge Ortiga

Arcebispo de Braga assinalou 22 anos de tomada de posse, com olhar posto no futuro, sublinhando processo de «renovação inadiável» que pode beneficiar com dinamismo do seu sucessor

Entrevista conduzida por Paulo Rocha

Foto Agência ECCLESIA/PR00

Completou este domingo 22 anos como arcebispo de Braga, num dia de ordenações sacerdotais. Como classificaria o período que vive, este tempo que é também histórico para a Arquidiocese?

E um dia (18 de julho) em que celebramos a festa litúrgica de São Bartolomeu dos Mártires. Olhando para a realidade da Arquidiocese de Braga, neste momento, é como em qualquer outra diocese, marcada pelos problemas e dificuldades, os desafios que a pandemia veio trazer. Há alguns desafios que, costumo dizer, vieram confirmar um pouco a nossa caminhada eclesial, porque há dois anos tínhamos optado por um programa que incidia na sinodalidade. Ou seja, nesta ideia de caminharmos juntos. Temos vindo a insistir nesta ideia. Por isso mesmo, direi que a pandemia veio reforçar a necessidade de insistir nisto. As nossas comunidades, particularmente as comunidades paroquiais, são ainda demasiado formalistas: as pessoas conhecem-se, sobretudo nas aldeias, mas têm um certo receio de criar proximidade, de mostrar amizade e uma amizade concreta, no dia a dia. Temos sublinhado esta ideia da sinodalidade, no sentido em que as pessoas se têm de aproximar e não devem ter medo de se quererem bem, ajudar-se, reconhecendo-se interdependes. É com os outros que a vida se vai tecendo, dentro e fora da comunidade.

 

Pessoalmente, sente que este é um momento de transição?

Sem dúvida, é um momento de transição e de mudança. Uma das frases que tenho usado com muita frequência é “fidelidade criativa”. A Arquidiocese de Braga tem uma história longa, lodo desde os primórdios do Cristianismo, e precisamos de ter consciência da nossa história, de fazer memória dos nossos antepassados; orgulhamo-nos de ter a nossa Sé, muitas vezes se diz da Catedral que algo é “tão velho como a Sé de Braga”. O nosso Cristianismo tem raízes muito profundas, mas corremos o risco de ter uma Igreja tradicionalista. Eu alerto para a diferença entre Tradição e tradicionalismo. Há uma fidelidade ao passado, às nossas origens, mas por outro lado há necessidade de uma grande criatividade, de nos adaptarmos às exigências e interpelações, naquilo que – e já é lugar-comum dizê-lo -, não é uma mudança de era, mas uma era nova, totalmente diferente. Os tempos são outros, a sociedade é outra, consequentemente, a Igreja também tem de ser outra.

A Arquidiocese de Braga, fiel ao seu passado, não tem de ter receio nem medo de se adaptar, começando a percorrer caminhos novos na evangelização e na vida concreta das comunidades.

 

Até que ponto a mudança de arcebispo, um tema que está sobre a mesa, é parte dessa transformação?

Eu creio que poderá ajudar. São 22 anos, é bastante tempo, eu nasci nesta diocese, identifico-me com esta mentalidade minhota. Talvez a vinda de alguém fora de Braga possa trazer um outro ritmo diferente, outra maneira de conceber a Igreja. Acredito, seriamente, que poderá também ajudar neste processo de renovação inadiável, de que temos vindo a falar com alguma insistência nos últimos anos. É uma expressão do Papa Francisco e nós assumimo-la, reconhecendo que é preciso renovar, não o podemos adiar, as circunstâncias assim o exigem.

A renovação não é um apêndice, um pequeno pormenor, mas tem de ser algo estrutural. O novo arcebispo que vier nada fará sem os sacerdotes, sem os leigos, mas poderá trazer outro dinamismo a esta velha diocese, que quer ser nova nos tempos que correm.

 

De que forma é que viveu este tempo de espera? Acha que este processo tardou?

Acho que sim e devo dizê-lo com toda a sinceridade: dois anos e meio parecem-me muito tempo. É muito tempo para a diocese, em si, porque gera uma certa incerteza, queiramos ou não, uma certa apreensão, expectativa. Mas também para mim, porque às vezes me coloca numa atitude de nem sempre saber o que é melhor, o que é oportuno fazer, nesta quase que ambiguidade: é oportuno tecer algumas considerações e dar algumas orientações pastorais ou não o fazer?

 

Em todo o caso, nunca foi parando…

Isso é outro aspeto. Dou graças a Deus e, ainda neste momento, peço a graça de ser fiel até ao outro momento, de descansar no dia em que entregar o báculo a quem vier a seguir. Até esse momento, com coragem, com necessidade de ultrapassar alguns problemas e alguns contratempos – um pouco neste ambiente de expectativa que às vezes parece criar uma atitude de resignação, de deixar correr, de esperar – não dá para cruzar os braços. Pelo contrário.

 

Foto: Arquidiocese de Braga

Sente que a diocese parou?

Penso que não. Falo só de uma sensação, porque queremos muitíssimo mais, sabendo que a pandemia também veio dificultar. Hoje, o fundamental é que nos deixemos interpelar – penso muitas vezes nisso -, não precisamos de saber quem é que vem, quem é que será o bispo, não devíamos estar preocupados com isso. Sabendo que virá, efetivamente, aquele que a Igreja considera mais oportuno e mais adequado para este momento. Acreditamos que a Igreja não é uma realidade humana, não é uma escolha fruto disto ou daquilo: é o Papa, fruto da plenitude do Espírito Santo, que oferece à Arquidiocese de Braga o bispo mais conveniente. Esperamos muito, mas não vale a pena estarmos preocupados com quem virá ou com quem não virá.

O que importa é pensar no que lhe vamos oferecer, quando aqui chegar: vamos oferecer uma Igreja com dinamismo, já em movimento, empenha nesta ideia da renovação? Ou, pelo contrário, estamos desmotivados, fruto da pandemia – que talvez seja a razão que usamos com mais frequências? O que é que oferecemos ao bispo que vai chegar? Esta é a minha preocupação e é este o alerta que vou lançando aos sacerdotes, às pessoas mais empenhadas na própria Igreja: a preocupação por trabalharmos para que, quando o novo arcebispo chegar, veja uma Igreja unida, em comunhão, empenhada na dinâmica interna das comunidades e nesta vocação do exterior.

Temos falado muito, este ano, numa Igreja samaritana. Na parábola do Bom Samaritano, a Igreja é uma espécie de estalagem, para acolher os mais pobres, os marginais, os sozinhos, os últimos. Frei Bartolomeu dos Mártires usava uma expressão de que eu gosto muito: a paróquia é uma espécie de “hospital de Deus”. Portanto, esta Igreja que nós queremos ser hoje é uma Igreja dinâmica interiormente e uma Igreja para fora. Empenhada num compromisso social, numa amizade social, que quer efetivamente transformar as estruturas existentes, de tal forma que as pessoas sintam a sua plena realização. Esta é a minha preocupação neste momento, é isso que tenho dito permanentemente também aos sacerdotes e aos leigos: em vez de nos preocuparmos muito com quem virá, quando virá, que estejamos sempre alerta, sempre empenhados, sempre comprometidos, trabalhando. Neste desejo que quando chegar alguém que é enviado por Deus e não escolhido por técnicas ou cumplicidades, será o arcebispo para o momento presente. Então, preocupamo-nos sobretudo com a Igreja que vamos oferecer. Esta é uma hora com muitos desafios, muitos problemas, mas também com muitas oportunidades.

 

Nas nomeações que tornou públicas, diz que de forma “consciente e responsável”, teriam de ser poucas. Isso quer dizer que é já trabalho que fica para o seu sucessor?

Não diria isso. Neste último ano, tenho tido a preocupação de não fazer grandes mudanças. As nomeações são um pormenor. Por norma, sei que são num número significativo, porque temos 551 paróquias, é preciso não o esquecer. Para além das paróquias, há movimentos, secretariados, departamentos… A vida muda e aparecem novas interpelações, novos desafios.

Este ano, conscientemente – não no sentido de empurrar a responsabilidade -, fiz o que estou convencido que era necessário, suficiente, para esta altura. Não quero estar a fazer tudo e assim, quem vier, pode repensar. Não sei se irá usar o mesmo método, de fazer as nomeações nesta altura, poderá fazer noutras ocasiões, e mesmo para os cargos de maior responsabilidade na diocese é provável que se queira mudar e é bom que isso aconteça.

 

Quem chegar à diocese, o que vai encontrar? Falou já numa dinâmica sinodal e samaritana, duas palavras que marcam os propósitos pastorais que tem por diante, mas que diocese vai encontrar também ao nível da sua inserção na sociedade, dos serviços que propõe?

De facto, é uma diocese que tem muitas estruturas e que alguns até poderão pensar que é uma Igreja pesada, mas não sei até que ponto será necessário também repensar isso, quem vier assumirá essa responsabilidade…

 

A sua preocupação foi ir dando vida àquilo que existia?

E não só, como disse atrás, numa fidelidade criativa. Quem me conhece sabe que sou um eterno insatisfeito, estou sempre à procura de mais e melhor. Costumo dizer que aquilo que hoje é uma meta, amanhã é apenas uma etapa, temos de seguir em frente e descobrir caminhos novos. Fomos discernindo que o programa pastoral para a diocese, nesta altura, era trabalharmos para uma Igreja sinodal e samaritana, naquilo que as duas palavras significam. Fiquei muito contente quando o Papa decretou que o próximo ano pastoral, a partir de setembro, era um tempo em que convidava a própria Igreja a refletir, colocando-se em questão, sobre a sinodalidade. Pensando na sinodalidade como comunhão, participação e missão.

Posso dizer que nessa perspetiva, daquilo que o Papa nos aponta para este próximo ano, nós já estamos a caminho. Já percorremos um caminho, talvez não tanto quanto nós gostaríamos, porque a pandemia condicionou muito as coisas, mas ele existe. A diocese não vai começar agora a pensar na sinodalidade, o que isso implica, o contributo que podemos dar à Igreja universal, estamos a caminho. Estamos nesse processo, numa sinodalidade afetiva – em termos de aproximar as pessoas, nesta consciência de que somos um só corpo – e efetiva, de envolver as pessoas, dentro da própria comunidade e também fora. Eu não me canso de dizer que a Igreja, hoje, não pode fechar-se nas sacristias nem nos santuários. E Braga muito menos. Estamos aqui no Sameiro, temos muitos santuários e os nossos cristãos giram muito à volta deles, mas nós não podemos ficar aqui. Temos de vir aqui respirar para depois ir, entrar nas estruturas da realidade humana.

Graças a Deus, temos uma realidade do turismo, com empenho forte e consistente no turismo religioso. É sempre difícil analisar, mas creio que já tem uma dinâmica muito própria. Temos a Pastoral da Cultura que está presente, através de muitas e variadas iniciativas, fazemos a experiência da “Nova Ágora”, como este espaço aberto que a Igreja de Braga quer ser, encontrando-se com mentalidades totalmente diferentes; a nossa Pastoral da Cultura está permanentemente em diálogo com aquilo que se pensa, aquilo que se diz. Temos uma Pastoral Universitária também com alguma incidência, mais com os jovens, mas também com os professores.

Teria um gosto particular de que houvesse um compromisso maior com o mundo do trabalho. Talvez não seja aquilo que deveria ser, mas a semente está lançada: esta Igreja que não se fecha, em saída, em compromisso com tudo aquilo que são realidades humanas. É um caminho, agora, que é difícil, sabemos que as pessoas têm uma dificuldade muito grande em comprometer-se. A Igreja de Braga tem sido este alerta para muitas realidades, muitas situações. Não sabemos os resultados, mas esperamos que alguma coisa vá ficando.

 

Apontou o mundo do trabalho como algo onde gostaria de ver maior empenho. Numa avaliação destes 22 anos, coloca esse setor entre aqueles que gostaria de ter sido diferente?

Direi que o mundo do trabalho tem sido, efetivamente, uma preocupação. Não esqueçamos que a diocese tem a parte marítima, hoje com pouco expressão; tem a parte central, que é o mundo dos operários, do trabalho em fábricas; e depois a parte do interior, mais ligada à agricultura. Sabemos que o mundo do interior está a ficar desertificado e isso é um grande desafio também para nós, a desertificação. Pessoas quase sozinhas, em situações algo precárias.

Depois há o mundo do trabalho, das fábricas. Nós já tivemos aqui uma Ação Católica mais interventiva. Não esqueçamos que foi de Braga que se levantou a questão da luta contra o trabalho infantil, da Ação Católica. Hoje talvez tenhamos necessidade disto, de uma ação mais interventiva, mas é difícil. Temos também um grupo, com alguma dimensão, da ACEGE, nesta preocupação com os empresários, para que vejam o seu trabalho como missão, colocando Cristo nas empresas. Gostaria de uma presença muito mais consistente.

Outro mundo que é um desafio para nós, neste tempo que estamos a viver, é a questão da juventude. Dizia-se no passado que o distrito de Braga era o mais jovem do país, hoje creio que não o é… Temos muitos movimentos, grupos nas paróquias, mas ainda faz falta – e a Jornada Mundial da Juventude é mais um motivo – que nos possamos empenhar e comprometer com a juventude. É urgente trabalharmos esta área.

 

O que é que gostaria de ter feito e acha que ficou por fazer?

Insisto sempre naquilo que eu gostava de fazer mais: eu vejo a Igreja como comunidade. Temos de ser verdadeiramente uma coisa só, entre nós, que é o lema que escolhi para o meu episcopado – a unidade, que supõe a diversidade… Aqui, penso que caminhamos muito, mas podemos caminhar muito mais. Se pudesse deixar ficar uma espécie de testamento, iria buscar a romã, às minhas armas de fé. Eu escolhi a romã, precisamente, para simbolizar a preocupação pela unidade. Há anos ofereci aos padres uma pequena peça, em cerâmica, com uma romã, significando que é bom que trabalhemos por ser uma coisa só. Dizem que a romã tem 633 grãos, tantos quantos os preceitos da lei judaica. Se olharmos bem, ela tem uma espécie de membrana, com pequenos grupos dentro. Há os grãos e há ali pequenos grupos, ali associados. Gostava de ver uma Igreja com estes grãos todos, que simbolizam os cristãos espalhados por todos os cantos, nas mais variadas situações; uma parte que é constituída pelos sacerdotes, pelos religiosos, pelos movimentos, pelas associações, mas todos numa preocupação por se amarem e se quererem bem, fazendo a experiência do Ressuscitado entre eles, partindo com Ele. Ir ao encontro das diversas realidades humanas, para as cristianizar, para as cristificar, a partir de dentro. Esta é uma preocupação muito grande e se pudesse deixar um testamento era este: uma romã, como simbologia, como interpelação, como compromisso, como realidade que é possível fazer. Temos de trabalhar muito mais para que isso aconteça.

Se as nossas comunidades paroquiais estivessem verdadeiramente simbolizadas numa romã, todas unidas em Cristo, com Cristo presente no meio, Cristo ressuscitado, certamente a Igreja estaria a cumprir a sua missão.

 

Mais do que obra por fazer, é uma atitude na Igreja que está incompleta?

Creio que sim. Não estou numa atitude de fazer balanços, mas creio que fui procurando fazer aquilo que de fui capaz, acreditando que tudo isto tem um sujeito que deve ser plural. Não sinto que fiz alguma coisa, tudo o que foi feito aconteceu sempre – pelo menos na preocupação – por um sujeito coletivo, comunitário. Com os padres, com os movimentos, com os grupos, sempre a trabalhar no plural, porque a Igreja é isto mesmo. Sem um trabalho coletivo, colegial, não vamos a parte nenhuma.

 

Foi esse trabalho conjunto que fez com que a diocese se fosse envolvendo cada vez mais nas diversas frentes de presença na sociedade, até com iniciativas empresariais? Deixa uma diocese comprometido nesse sentido? Envolvida na construção da sociedade?

Pelo menos como semente. Há momentos dizia que sou insatisfeito, não poderia dizer que a diocese é aquilo que eu gostaria que fosse, também neste âmbito. Há um caminho que está a ser percorrido e vai continuar a sê-lo.

 

Não teve medo de investir?

Não, em termos de estruturas até dizem que talvez tenha sido demais. Mas foram aquelas que me parece serem necessárias. Para mim é muito importante o nosso centro cultural e pastoral, com auditório, salas, espaço, com uma cooperativa para poder servir refeições a um preço acessível. Temos agora um projeto de construir uma livraria nova, edificar um arquivo central, digamos. Tudo isto não avança porque não quero que avance, mas mesmo em termos financeiros, já há dinheiro para o realizar. É absolutamente necessário: quando falo no arquivo, por exemplo, é um sonho para mim, porque temos necessidade, não temos espaço para colocar os nossos documentos. Mas preocupam-me, sobretudo, e é um grande desafio, os documentos que temos espalhados pela diocese. As paróquias têm as suas residências e ali tinham os seus arquivos. Acontece que, outrora, cada paróquia tinha o seu pároco, e a residência paroquial era habitada, mas agora a maior parte delas já não está. Os documentos que temos espalhados por essas residências correm o risco de se perder ou danificar. Há um projeto feito, temos o dinheiro para o fazer, está tudo delineado e estruturado, é um aspeto que eu considero muito importante.

Também houve a aposta no património, com um investimento muito grande.

 

Sentiu o retorno, já?

Sim, sim. Percorremos a cidade de Braga, que quer ser capital da cultura, do turismo, por aí fora, mas o turismo em Braga tem de ser um turismo religioso. As pessoas vêm a Braga por aquilo que envolve a cidade, mas se lhe retirarmos as igrejas, o turismo quase que deixa de existir. E, efetivamente, as igrejas estão bem conservadas, foi um investimento muitíssimo grande, mas dá gosto ver o que as nossas comunidades foram fazendo, para se poder dotar de um património que é útil para nós, para as celebrações, mas é também útil para mostrar a nossa cultura e a nossa alma do passado. Mas não vale a pena estar a fazer balanços, as contas estão feitas do outro lado…

 

Sente-se que está cheio de energia para continuar enquanto for necessário…

Eu espero que Deus me conceda alguns anos para continuar. Não tenho projeto, minimamente, e não estou preocupado com isso. Quero, pura e simplesmente, trabalhar, gastando todas as minhas energias, até ao dia em que entregar o báculo ao arcebispo que vier. Depois irei ver com ele…

 

O que irá fazer?

Não tenho projetos. Não tenho planos, quero pensar com ele. A certeza é que não me vou intrometer. Há muitos padres que têm receio, pelo meu espírito, mas não vou. Irei fazer o necessário, ajudar no que for preciso, mas também se fizer falta estar em casa, saberei ser contemplativo.

 

Falando sobre a realidade em Braga, o que espera das próximas eleições autárquicas?

Só espero que aqueles que se propõem e vão ser eleitos estejam motivados por um sentido do bem comum. Por vezes, dá-me a impressão de que não há este interesse pelo bem comum. Digo que há mais o partido do que esta ideia. Importaria que o bem comum fosse preocupação de todos os que se candidatam, seja de que partido for, e que os nossos católicos sentissem também o dever, a obrigação de exercer o seu direito de cidadania. Há muito medo, também. Lamentamo-nos dos políticos, do que são e fazem contra a Igreja ou sem a Igreja, mas não estamos lá. Se os cristãos estivessem na política, a política poderia ter uma alma. Sabemos como é que a União Europeia nasceu, o Papa Francisco declarou venerável Robert Schuman, e nós precisamos de católicos na política, fazem-nos falta. Isto poderá ser um desafio, uma oportunidade, porque a política é a nível nacional, a nível mundial, mas é também a nível local. É a partir das nossas freguesias, onde vive o nosso povo… Há pouco falava da desertificação do nosso interior, com pessoas idosas, onde a presença da Igreja é quase a única de proximidade, porque são os padres, as comunidades, que olham por aquelas pessoas idosas, que estão sozinhas, dia e noite, lá na sua casa.

Outro aspeto muito curioso na diocese é a existência dos Centros Sociais Paroquiais – é um problema que exige muita reflexão. Braga tem mais de 200 centros, particularmente, nessas zonas do interior. São centros pequenos, com muitas dificuldades, muitos problemas, com exigências permanentes da Segurança Social, algumas que não compreendo. São uma presença efetiva, nestes lugares, levando o que é necessário para que as pessoas tenham dignidade de vida.

 

Espera que Braga seja Capital Europeia da Cultura em 2027?

Eu creio que merece, é uma cidade que tem algum dinamismo. No que nos diz respeito a nós, Arquidiocese, a Igreja está empenhada e comprometida nisso mesmo, por aquilo que vamos fazendo todos os dias.

Já referi a questão do património, que é um sinal do nosso interesse. Há também a questão do turismo e tantas outras realidades de património imaterial, como a nossa Semana Santa, as nossas festas, que são sinais de uma cultura latente no nosso quotidiano.

Desejo que o seja, não por aquilo que a cidade de Braga é, mas por aquilo que poderá ser. Parece-me que é necessário apostar muito mais na cultura. Esta preocupação por ver a alma de um povo e desenvolvê-la. É um desafio num maior empenho, nesta dimensão cultural.

 

Que mensagem deixaria ao seu sucessor?

Que não tenha medo. Não vem sozinho, tem aqui gente muito boa. Tenha a certeza de que há sempre alguém que vai com ele. A gente do Minho é uma gente muito boa: podemos estar a assistir a uma diminuição, em termos de prática religiosa, mas esta gente é essencialmente religiosa. Verificamos isso: as nossas festas são festas religiosas, ateus, agnósticos, não sei se haverá assim muitos. Há aqui gente que quer, que precisa de um outro dinamismo, de uma outra vivacidade.

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Agência ECCLESIA

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