Cardeal D. Manuel Clemente publica carta aberta para explicar procedimento relativo a caso denunciado em 1999
Lisboa, 29 jul 2022 (Ecclesia) – O cardeal-patriarca de Lisboa publicou hoje uma carta aberta para explicar procedimento relativo a um caso de abusos sexuais, denunciado em 1999, reforçando o compromisso de “tolerância zero” para estas situações.
“Que ninguém tenha medo de denunciar. Nas Comissões Diocesanas, na Comissão Independentemente, na PGR, na PJ, aos media, onde e junto de quem se sentirem mais seguros”, apela D. Manuel Clemente, num texto divulgado online e enviado aos jornalistas.
A carta surge em resposta ao que o responsável católico chama de “equívocos e perplexidades” em torno dos “relatos sobre o doloroso caso denunciado em 1999”.
“O meu antecessor [D. José Policarpo] acolheu e tratou o caso em questão tendo em conta as recomendações canónicas e civis da época e o diálogo com a família da vítima. O sacerdote foi afastado da paróquia onde estava e nomeado para servir numa capelania hospitalar”, precisa o atual patriarca.
O cardeal português relata que marcou um encontro com a vítima, que viria a ser adiado.
Após o encontro sobre a proteção dos menores na Igreja, promovido pelo Papa, em Roma, em fevereiro de 2019, D. Manuel Clemente pediu novo encontro, tendo decorrido uma conversa com a pessoa em causa.
“A sua preocupação era a não haver uma repetição do caso, sem desejar de forma expressa, a sua divulgação”, indica.
Numa resposta às acusações de ter ocultado o caso, D. Manuel Clemente apresenta a sua interpretação do encontro.
“Não entendi, como não entendo hoje, ter estado perante uma renovada denúncia da feita em 1999. Se assim tivesse sido, a mesma teria sido remetida à Comissão Diocesana, criada por essa altura, e teriam sido cumpridos todos os procedimentos recomendados à data. Recordo que as regras e recomendações de 16 de julho de 2020 são posteriores”, aponta.
O patriarca de Lisboa explica que o sacerdote em causa “foi acompanhado e até à atualidade nunca houve qualquer denúncia ou reparo sobre o seu comportamento moral”.
“Nunca ninguém comunicou, nem sob anonimato, qualquer acusação”, acrescenta, precisando que as medidas cautelares previstas para estes casos “visam, sobretudo, a proteção de possíveis futuras vítimas, o que pode estar acautelado, em especial quando, passados anos, nunca mais houve denúncias nem indícios”.
O cuidado e a preocupação pelas vítimas é o que nos deve mover principalmente neste assunto e levar-nos ao seu encontro. Lamento todo o sofrimento que esta situação possa provocar a esta vítima em especial e a todas as outras que conhecemos ou não”.
D. Manuel Clemente admite que é possível “fazer sempre melhor”, destacando que “este caso e outros do conhecimento público, e que foram tratados no passado, não correspondem aos padrões e recomendações” que devem ser implementados na atualidade.
“Desde a primeira hora que no Patriarcado de Lisboa dei instruções para que a Tolerância Zero e a Transparência Total sejam regra conhecida de todos”, acrescenta.
O patriarca lembra que a Comissão Diocesana de Proteção de Menores, criada em abril de 2019, foi a primeira no país, “tentado cumprir e fazer cumprir todas recomendações civis e canónicas”.
A carta informa que, até ao momento, foram encaminhadas a esta comissão, pelo patriarca ou diretamente pelas vítimas, três denúncias.
“A primeira foi acompanhada pela Diocese de Vila Real. A segunda está, neste momento, a corresponder ao que o Dicastério para a Doutrina da Fé decidiu, após as recomendações que a nossa Comissão me deu. Mal tenhamos o desfecho sobre a mesma, será divulgado. A terceira e mais recente que envolve mensagens inapropriadas e enviadas por WhatsApp está também em apreciação pela Comissão, que já me fez recomendações a que dei imediato seguimento”, refere.
D. Manuel Clemente indica que o Patriarcado de Lisboa desconhece outras denúncias, “mesmo aquelas a que a Comissão Independente se refere”.
“Peço a Deus que encoraje, fortaleça e proteja os que nas suas vidas tenham sofrido estes crimes. Desejo ter ajudado cada leitor desta carta a aproximar-se da verdade que todos desejamos. Verdade que as vítimas nos exigem e merecem”, conclui.
A Igreja Católica passou a ter novas normas para estes casos, após uma cimeira mundial dedicada ao tema da proteção de menores, que o Papa promoveu de 21 a 24 de fevereiro de 2019, no Vaticano.
No último dia 27 de junho, o Vaticano disponibilizou, online, uma versão atualizada do “vade-mécum” lançado em 2020, para ajudar os bispos e responsáveis de institutos religiosos no tratamento de denúncias de abusos sexuais de menores.
O documento preparado pelo Dicastério para a Doutrina da Fé (DDF) explica os procedimentos a seguir, desde a denúncia à conclusão da causa.
O primeiro passo recomendado é uma investigação prévia, para determinar se a denúncia é verossímil, sublinhando que, mesmo onde a legislação não o torne obrigatório, a autoridade eclesiástica deve dar a conhecer o caso às autoridades civis competentes, “sempre que o considere indispensável para tutelar a pessoa ofendida ou outros menores do perigo de novos atos delituosos”.
As diretrizes da Conferência Episcopal Portuguesa para estes casos foram publicadas a 1 de janeiro de 2021 e sublinham que o bispo responsável deve dar seguimento a denúncias e à possível investigação prévia.
OC
Lisboa: Patriarcado de Lisboa confirma denúncia de abusos contra sacerdote nos anos 90