Peregrinação de Junho

Homilia de D. António Couto na missa do dia 13 de Junho 13 de Junho: Homilia de D. António Couto, bispo de Braga e Presidente da Peregrinação Aniversária de Junho «Viver na verdade» (8.º mandamento) «Quem habitará, Senhor, no vosso santuário? O que não usa a língua para levantar calúnias» (Sl 15(14),3). Virgem Maria Mãe da santa esperança (Altar do Recinto, 13 de Junho, 10h00) Sir 24,14-16.24-31 = «Em mim está toda a graça do caminho e da verdade» Cl 3,9-10 = «Não mintais uns aos outros» Mt 5,20-22a.27-28.34a.37 = «A vossa linguagem deve ser: “sim, sim; não, não”» 1. Aproximou-se um homem habituado ao uso inveterado da verdade, o seu olhar varrendo toda a fraude das palavras. Aproximou-se firme e impoluto. Esquadrinhou as faces oxidadas da mentira. Olhou depois o chão como quem abre um sepulcro, e lentamente desenhou o puro rosto da verdade sobre a areia. 2. Subiu depois à montanha. Como Moisés. Mais do que Moisés. E proclamou Felizes, isto é, pioneiros de um mundo novo, abridores de inéditos caminhos, os pobres. Quem diria! E disse-o a nós, que vamos apostando tudo no ouro, na prata, no lucro, no poder, nas nossas leis que defendem os nossos interesses, fazendo da nossa força a norma da justiça (Sb 2,11). S. Francisco de Assis ouviu este discurso, e mudou tudo. Era rico. Fez-se pobre, e apostou tudo no amor. Santo António de Lisboa ouviu este discurso, e mudou tudo. Era rico. Fez-se pobre. Encontrou o amor. Os pastorinhos da Cova da Iria ouviram este discurso, e, na sua pobreza, leveza e simplicidade, subverteram a riqueza e o poder e a barra podre do tribunal. Madre Teresa de Calcutá ouviu este discurso, e fez-se pobre por amor no meio dos pobres e dos ricos sem amor. 3. É nestas figuras mansas que a sabedoria da graça frágil atravessa o nosso mundo pesado e metalizado. O ritmo harmonioso e grácil da dança há-de sempre vencer e subverter o ritmo da marcha militar. A melodia da embalação, da aleitação, da lalação que estabelece entre a mãe e o bebé o chão mais seguro e sem fraude que se possa pensar há-de sempre vencer o grito de guerra e o ritmo da marcha militar. Diz a Sabedoria personificada, como se fosse Maria ou S. Francisco ou Santo António ou os Pastorinhos de Fátima: «8,30Eu estava perto dele, como uma criança (’amôn),/ eu era o seu encanto dia após dia,/ brincando diante dele o tempo todo;/ 31brincando na superfície da terra,/ as minhas delícias com os filhos do homem» (Pr 8,30-31). E diz outra vez Jesus, agora na planície, nas nossas praças ou no meio desta esplanada, olhando-nos olhos nos olhos: «10,14(…) Deixai as crianças pequenas (paidía) vir ter comigo (érchesthai prós me); não as impeçais, pois dos que são como elas é o Reino de Deus. 15Em verdade vos digo (amên lego hymîn): “Quem não receber (déchomai) o Reino de Deus como uma criança pequena (paidíon), não entrará (eisérchomai) nele» (Mc 10,14-15). E S. Paulo diz esta beleza aos cristãos de Corinto: «7,29Isto vos digo, irmãos: o tempo já está a recolher as velas (systéllô). Quanto ao resto, que aqueles que têm mulher, sejam como se não a tivessem; 30aqueles que choram, como se não chorassem, e os que se alegram, como se não se alegrassem, e os que compram, como se não possuíssem, 31e os que usam este mundo, como se não usassem. Passa, na verdade, a figura (tò schêma) deste mundo» (1 Cor 7,29-31). 4. Mas, voltando à montanha, e fixando-nos nos olhos ou no coração, Jesus ensina que, quando matamos um irmão, já antes disso morreu em nós o amor; quando cometemos adultério, já antes disso morreu em nós o amor; quando mentimos e juramos falso, já antes disso morreu em nós o amor. 5. Quando morre em nós o amor, que é a verdadeira verdade (’emet), isto é, segurança maternal, confiança e confidência, já não nos olhamos como irmãos, mas como coisas a possuir ou a deitar fora, meios a utilizar para atingirmos os nossos fins ou rivais a eliminar. Quando morre em nós o amor, somos falsos e vivemos na duplicidade, como diz a Escritura: «Com um coração e um coração» (Sl 12,3; Sir 1,28), «com uma língua e uma língua» (Sir 5,9; 6,1). E com o coração inquinado, a língua pode ser uma arma perigosa. Diz outra vez a Escritura: «Um golpe de açoite deixa marcas,/ mas um golpe de língua quebra os ossos./ Muitos caíram à boca da espada,/ mas muitos mais por causa da língua» (Sir 28,17-18). 6. Oiçamos outra vez a voz do Mestre: «O reino de Deus não está aqui ou ali», disse. Disse. «Os mais belos lugares do mundo: onde estão os mais belos lugares do mundo? Onde mora a esperança? Que língua fala a paz? Que avião tomar para a justiça? Que moeda vigora no amor? Onde estão as fronteiras da alegria? Que cores tem a bandeira da verdade?» 7. Pegou depois numa criança, num pedaço de pão e numa taça. Levantou os olhos e as mãos onde nitidamente pulsava um coração. E ergueu um brinde ao céu. Baixou depois os olhos e as mãos, ungidos já para a dádiva suprema. E ardentemente desejou o vinho novo do reino a chegar. Requisitou, por isso, para isso, o coração, as mãos, a boca, de quantos o estavam a escutar. E antes de partir e de ficar, definitivamente Deus Connosco, abriu ainda à multidão novos caminhos, diurnos, matutinos: «Já sei que não sabeis pedir o pão; tereis de aprender com os meninos». 8. Nossa Senhora da Esperança, que a tua mão não largue nunca a nossa mão. Ámen.

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