Papa pode ajudar na paz social em Angola

Entrevista a D. Joaquim Ferreira Lopes, Bispo português que lidera a Diocese angolana de Viana À espera do Papa, a Ecclesia foi ao encontro de D. Joaquim Ferreira Lopes, Bispo português que lidera a Diocese de Viana, constituída em 2007 a partir de nove paróquias que faziam parte da Arquidiocese de Luanda. Este responsável conhece bem a realidade do país: já passou pela capital angolana, onde foi vigário-geral, pela direcção nacional das Obras Missionárias Pontifícias angolanas e, a 9 de Novembro de 2001, foi nomeado Bispo da Diocese do Dundo, por João Paulo II, tendo recebido a sagração episcopal a 3 de Fevereiro de 2002, das mãos de D. Francisco de Mata Mourisca. Em Julho de 2007, tomou possa da Diocese de Viana. Ecclesia(E) – De que forma se está Angola a preparar para receber Bento XVI? D. Joaquim Lopes(JL) – Desde que foi anunciada a visita papal, no passado mês de Outubro, todo o país se começou a mexer para receber o Papa. Creio que o anúncio e a concretização da mesma não foram mediados por um espaço suficientemente longo. Pelo tipo de visita que é, vê-se que há um grande peso organizativo e temos reconhecido que o tempo é pouco. E – Foi uma surpresa receber o anúncio do Papa? JL – O episcopado já estava à espera de uma resposta positiva. Eu, por acaso, em encontro privado com o Papa dei-me conta de que, de facto, a resposta à proposta feita no final de uma reunião dos Bispos de Angola já estava concretizada, como se verificou dias depois. Para o povo, em geral, a surpresa foi grande, bem como o resto do mundo. E – Para quê ir a Angola? JL – Na realidade, a grande celebração dos cinco séculos de evangelização foi feita em 1992, na presença de João Paulo II. O actual Papa vai aos Camarões entregar o instrumento de trabalho para o próximo Sínodo de Outubro e era natural que outra nação pudesse ser visitada. A nossa Nunciatura em Angola aproveitou, certamente, esta deslocação do Santo Padre e, atempadamente, terá feito o pedido. Na África austral, Angola ocupa um lugar histórico privilegiado, já que a Igreja começou aí nos finais do século XV, e toda a epopeia da Igreja a Sul do Equador passa por lá, como um sinal que nenhuma outra nação tem, ninguém pode tirar a Angola essa primazia. E – Há leituras políticas nesta viagem? JL – É natural que haja essas leituras e que os políticos procurem tirar dividendos dessa visita, sobretudo em ano de eleições presidenciais, mas temos insistido na necessidade de informar bem que esta visita papal é feita essencialmente numa dimensão essencialmente eclesial. Claro que o Papa é Chefe de Estado, do Vaticano, mas nós temos privilegiado a dimensão pastoral, ele vem para visitar o Povo de Deus, como um pastor que visita o seu rebanho, há apenas sete anos num clima de paz total, para dar um pouco mais de elan para que as comunidades cristãs adquiram força e coragem, para que Angola não só mantenha e incremente o clima de paz, mas também que o desenvolvimento e progresso se desenvolvam nesta linha, sabendo que a Igreja tem um papel preponderante neste país. E – Qual é a participação do Estado na recepção ao Papa? JL – O governo angolano está a colaborar de uma forma superlativa e tem posto à disposição da Igreja – como fez antes com João Paulo II – todos os meios para que a visita se salde por um sucesso total. A maioria dos governantes angolanos são católicos e não têm recusado nenhuma colaboração, pelo contrário. É natural que nestes acontecimentos surja uma pitada de interesses, de que não estamos isentos, mas não é isso que está a ser posto em grande destaque. E – Há segurança em Angola para receber o Papa? JL – Esse é um problema sério, porque estas visitas são realizadas e preparadas ao milímetro, num trabalho conjunto entre o país que recebe o Papa e o Vaticano. Se é sério em qualquer parte do mundo, mais será no chamado Terceiro Mundo, sobretudo numa capital como Luanda, com cerca de cinco milhões de habitantes, uma cidade antiga. Já houve mudanças no programa do Santo Padre, exactamente porque alguns locais não inspiravam total segurança e eu estou convencido de que tudo vai correr bem, porque a capacidade dos angolanos, neste âmbito, é muito grande. E – Que esforços se estão a fazer para custear esta visita? JL – Uma visita papal implica gastos fora do comum, creio que haverá apoio da parte governamental e todos os cristãos estão empenhados em contribuir, à sua maneira, sob este ponto de vista económico. E – Mas é um investimento com saldo positivo? JL – O saldo de uma visita papal, a nível dos cristãos e da população em geral, do ambiente sociopolítico, é de tal ordem grande que justifica estes gastos, desde que não sejam feitos de forma exagerada num país que, apesar de potencialmente rico, é carente em vários aspectos. Acho que vale a pena gastar este dinheiro, nunca o lamentaremos, porque bem que vai sair desta visita papal é extraordinário e terá efeitos nesta pacificação dos espíritos, que o que mais desejamos em Angola depois da assinatura da paz. Paz política é uma coisa, agora a social, pessoal, dos corações é necessários fortalecê-la. E – Depois da paz, como vivem as populações? JL – Nos sete anos que passei no Dundo, na Angola profunda, a 1700 quilómetros de Luanda, sai de carro várias vezes para regiões a muitos quilómetros de distância e nunca vi uma arma no caminho, em paz absoluta. A paz é real, efectiva. A destruição das estruturas do interior, contudo, obrigou as novas gerações a procurar um furo para a sua vida e há um êxodo para as grandes cidades, como Luanda e Viana. O isolamento do interior leva a que as pessoas olhem, à primeira vista, como uma salvação o ir para a cidade. Isto leva a um crescimento anárquico das cidades, Viana, por exemplo, rebenta pelas costuras, com quase dois milhões de pessoas. Compete agora ao governo melhorar as ligações, por estradas, para que se possa circular, escoar a produção agrícola, porque isto está a condicionar o regresso das pessoas para as suas aldeias de origem.

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