O optimismo cristão

Francisco Sarsfield Cabral, jornalista

“Cada ano novo traz consigo a expectativa de um mundo melhor”. Com esta frase começa a mensagem de Bento XVI para o Dia Mundial da Paz, 1 de Janeiro. Mas a expectativa de um mundo melhor é algo que parece desvanecer-se em várias partes do globo. Sobretudo a Ocidente, vivemos um tempo de pessimismo.

 

A descrença num mundo melhor tem a ver com vários factores. A crise financeira global, iniciada em 2007 nos Estados Unidos, e a crise da zona euro contribuem para o pessimismo. Por outro lado, muitos ocidentais vêem com tristeza transferir-se para a Ásia o centro dinâmico da economia mundial.

 

Mais importante, o colapso do comunismo legou uma herança de cinismo quanto à ideia de mudar o mundo. Pois se um projecto de acabar com a exploração dos pobres se revelou tão negativo, não será preferível deixarmo-nos de fantasias adolescentes e cada um ir tratar da sua vida, sem se preocupar com os males da sociedade nem com o sofrimento dos outros?

 

A esta atitude contrapõe-se frontalmente o optimismo cristão. Na sua Mensagem, o Papa apela a “uma evolução espiritual, uma educação para os valores mais altos, uma visão nova da história humana”. E denuncia “os ídolos deste mundo”, que conduzem a “consciências cada vez mais insensíveis, (…) a fechar-se em si mesmo, a uma existência atrofiada vivida na indiferença. Ao contrário, a pedagogia da paz implica serviço, compaixão, solidariedade, coragem e perseverança.”

 

Ora isto é o oposto de uma fuga ao mundo. “Cada homem é criado à imagem de Deus e chamado a crescer contribuindo para a edificação de um mundo novo”. Num artigo assinado por Bento XVI e publicado dias antes do Natal no jornal britânico de negócios Financial Times (facto inédito!), o Papa diz que “nos Evangelhos os cristãos encontram inspiração para as suas vidas diárias e para o seu envolvimento nos assuntos do mundo. Seja no Parlamento ou na Bolsa, os cristãos não devem fugir do mundo”.

 

O que implica tentar modificar muita coisa. Por exemplo, “o desmantelamento da ditadura do relativismo”, que leva a uma concepção débil da pessoa, incapaz de fundamentar direitos humanos. Ou procurar “um novo modelo de desenvolvimento e também uma nova visão da economia” – apelo que já se encontrava na encíclica Caritas in Veritate e que, na minha opinião, ainda não encontrou resposta adequada por parte dos intelectuais católicos.

 

É que, sublinha Bento XVI, “o modelo que prevaleceu nas últimas décadas apostava na busca da maximização do lucro e do consumo, numa óptica individualista e egoísta que pretendia avaliar as pessoas apenas pela sua capacidade de dar resposta às exigências da competitividade”.

 

O que chamo “optimismo cristão” não é, pois, um sentimento desligado da realidade e muito menos uma atitude passiva. “Bem-aventurados os obreiros da paz”, é o título da Mensagem do Papa. Os cristãos devem “meter a mão na massa”, juntamente com todos os homens de boa vontade.

 

Francisco Sarsfield Cabral, jornalista

(O autor escreve segundo o antigo Acordo Ortográfico)

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