Mudar o rumo da história

Ana Patrícia Fonseca, FEC

O Ano Europeu do Voluntariado, que se celebra em 2011, surge como uma oportunidade para reflectirmos sobre o modelo social em que vivemos nas sociedades ocidentais. Mais do que um ano para promover eventos e multiplicar actividades, o Ano Europeu do Voluntariado deve ser o pretexto para mudar comportamentos e inverter a marcha da história.

A Revolução Industrial foi um marco profundo na sociedade europeia, transformando a relação do homem com a terra, com o trabalho, com o capital, com os meios de produção e com as inovações tecnológicas. Mas, sobretudo, a Revolução Industrial alterou, até hoje sem retrocesso, a relação do homem com os outros homens. A partir do século XVIII, a relação comunitária vivida nas aldeias foi engavetada nos pequenos apartamentos das grandes cidades, remetendo cada indivíduo para si próprio.

Precisamos, hoje também, de uma nova revolução, que abra o nosso olhar ego centrado para as potencialidades da vida em relação, da vida em comunhão. E é precisamente aqui que o voluntariado pode ser o motor da edificação de um novo paradigma social.

A prática activa e continuada de acções de voluntariado exige um olhar para além de nós e obriga a perceber, nas diferenças de cada um, caminhos de encontro e aproximação. O voluntariado, enquanto opção de vida permanente e comprometida com determinada realidade, faz-nos regressar ao tempo da vizinhança solidária e implica-nos, necessariamente, na reconstrução da matriz da organização social.

Hoje, cada indivíduo privilegia, antes de mais, a sua condição, que está fortemente relacionada com a sua posição económica no quadro social. Através da acção voluntária, solidária e gratuita, o capital social sobrepõe-se ao capital económico. Aqui, entendemos capital social tal como Lyda Judson Hanifan o formulou, primeiramente, em 1916: “elementos intangíveis que são importantes para o quotidiano das pessoas, como a boa vontade, a solidariedade, a compreensão e a interacção social entre indivíduos e famílias, que são características constitutivas da unidade social. Abandonado a si mesmo, o indivíduo é socialmente um ser indefeso. Mas, ao entrar em contacto com os seus vizinhos, e estes com novos vizinhos, haverá uma acumulação de capital social, que poderá satisfazer de imediato as suas necessidades sociais e produzir potencialidades sociais suficientes para melhorar de forma substancial as condições de vida de toda a comunidade.” Com a acção do voluntariado, a vida em sociedade deixa de ser individual e passa a estar aberta ao grupo, às suas dificuldades e sucessos. O bem de cada um passa a ser o bem de todos, como é proposto nos Actos dos Apóstolos (Act. 2, 42-47), numa completa inversão da lógica actual. O voluntariado constitui, por isso, um poderoso instrumento de mudança social.

No entanto, é fundamental distinguir voluntariado de circunstância de voluntariado comprometido. E este é mais um dos grandes desafios do Ano Europeu de Voluntariado. Em 2011, mais do que aumentar de forma substancial o número de voluntários, temos que ser capazes de comprometer cada cidadão num modo de vida radicalmente novo. O mundo ocidental não tem necessidade de voluntários esporádicos, cujas acções não têm consequências. Há, sim, uma grande urgência de mudanças profundas, nos modos de vida e nas prioridades dos europeus, que sejam capazes de criar uma nova revolução. Em 2011 interessa, pois, promover o voluntariado enquanto raiz de mudança social, que tenha repercussões históricas.

A Rede de Voluntariado Missionário, gerida pela FEC está a realizar, no âmbito do Ano Europeu do Voluntariado, uma investigação académica, em parceria com o CIPAF, Centro de Investigação da Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti, que pretende estudar o impacto do voluntariado missionário nas comunidades de missão, nas comunidades de origem dos voluntários e nos próprios voluntários. O objectivo é recolher dados que permitam uma reflexão aprofundada sobre as potencialidades e os desafios deste tipo de voluntariado. Pretende-se também que, partindo das conclusões do estudo, se possa melhorar o trabalho realizado, de forma que este promova eficazmente o desenvolvimento humano integral, através da cooperação e solidariedade entre pessoas, comunidades e Igrejas.

Ana Patrícia Fonseca, Fundação Evangelização e Culturas

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