Mensagem de D. Manuel Clemente sobre Nova Evangelização

Caríssimos Diocesanos            

1.De partida para o Sínodo dos Bispos, que decorre este mês em Roma, deixo-vos uma breve partilha de algo que levo no pensamento e no coração, a propósito do tema que nele será versado: “A nova evangelização para a transmissão da fé cristã”.

Comemoram-se os cinquenta anos do início do Concílio Vaticano II e abre-se o Ano da Fé. Eu e os irmãos Bispos que comigo exercem o ministério na Diocese do Porto, dirigimos-vos em junho passado uma Carta a este propósito, tentando resumir a mensagem central do Concílio e do Catecismo da Igreja Católica, radicando em Cristo o que podemos saber e devemos testemunhar sobre Deus e a vida a partir de Deus.

Reconhecendo a real dificuldade em assimilar toda a reflexão eclesial e as propostas do magistério ao longo de meio século, oferecemos-vos um breve roteiro, ou ponto de partida, para a mais fácil compreensão do todo. Estou certo de que o aproveitareis ao longo do Ano da Fé e das Jornadas Vicariais que o pontearão na Diocese, bem como na reflexão pessoal e comunitária.

Na verdade, a nossa sociedade requer a presença consciente e ativa dos cristãos, só possível com a consciência mais certa e a consequência mais justa da fé que professamos: Devemo-nos isto, a nós e para os outros.

No Sínodo terei ocasião de participar na grande partilha que faremos sobre o tema da “Nova Evangelização”, que o Papa João Paulo II em boa hora trouxe à reflexão e à vida da Igreja. De todo o mundo virão contribuições, alimentadas pela vida das Igrejas particulares nas diversas sociedades e culturas.

Terei também ocasião de partilhar a experiência portuense e portuguesa, especialmente motivada pelo que tem sido feito desde a visita ad limina de 2007, procurando “repensar juntos a pastoral da Igreja em Portugal”.

Desde esse ano também – o meu primeiro como Bispo do Porto – tenho-vos posto a par do que se vai fazendo e refletindo a propósito, em contacto com o dia a dia da Diocese. Basicamente, comunico-vos o que consigo assimilar do pensamento e da ação de muitos outros – sacerdotes, diáconos, consagrados, leigos – que procuram levar o Evangelho de Cristo aos diversos setores da nossa vida coletiva, das famílias às escolas, das empresas às instituições, dos hospitais às prisões, da sociedade à cultura…

E são realmente muitos, com grande generosidade e persistência, quer na vida interna da Igreja quer na sua projeção social e caritativa.

2. Mas todos nos interrogamos sobre o modo mais correto de transmitirmos a fé que nos move, no presente contexto sociocultural, tão profundamente alterado em relação ao que prevalecia décadas atrás.

Na verdade, a uma vida mais concentrada territorial e mentalmente, sucedeu a atual dispersão dos percursos profissionais e pessoais; à integração comunitária de tradições familiares e religiosas, sobrepôs-se uma possibilidade real ou virtual de fazer cada um o seu caminho por necessidade ou gosto, ou a gosto induzido pelo marketing alheio…

Entre muitos outros, estes dois fatores levantam uma questão maior ao anúncio evangélico: – Sendo a descoberta do Ressuscitado essencialmente comunitária ou comunitariamente garantida (cf Jo 20, 26), nas famílias, paróquias e demais agregações cristãs, como havemos de a proporcionar no atual contexto, tão disperso?

Parece-me ser este o ponto mais complexo da nossa atualidade pastoral, pois mesmo a necessária reapresentação cultural de Cristo e do Evangelho supõe uma real experiência comunitária que a fecunde e garanta – sendo aliás esta a inultrapassável diferença entre a evangelização e qualquer gnosticismo antigo ou moderno.

Tenho-o aprofundado constantemente no dia a dia da Diocese e além dela. Tenho verificado o que se vai conseguindo no quadro paroquial e eclesial, com tanta generosidade do nosso clero e dos seus colaboradores.

Levo para o Sínodo essa experiência nossa e também a vontade de aprender com a experiência alheia, como de tudo vos darei conta depois, sobretudo nas Jornadas Vicariais da Fé.

3. Este tópico era também central na reflexão de João Paulo II, como o continua a ser na proposta sinodal. Ressoam as palavras do Papa Wojtyla: “É urgente, sem dúvida, refazer em toda a parte o tecido cristão da sociedade humana.

Mas a condição é a de refazer o tecido cristão das próprias comunidades eclesiais” (Exortação apostólica pós-sinodal Christifideles Laici, nº 34; citado pelo Instrumentum laboris do presente Sínodo dos Bispos, nº 83).

Comunidades que hoje terão de ser inter-comunitárias, não só pela grande escassez de sacerdotes, de que a nossa Diocese particularmente sofre, como também pela aludida deslocalização física e mental a que acima aludi.

É ainda João Paulo II quem o indica, sugerindo mesmo: “a) a adaptação das estruturas paroquiais à ampla flexibilidade concedida pelo Direito Canónico, sobretudo ao promover a participação dos leigos nas responsabilidades pastorais; b) as pequenas comunidades eclesiais de base, também chamadas comunidades vivas, onde os fiéis possam comunicar entre si a Palavra de Deus e exprimir-se no serviço e no amor […].

Para a renovação das paróquias e para melhor assegurar a sua eficácia operativa devem favorecer-se também formas institucionais de cooperação entre as diversas paróquias de um mesmo território” (Christifidelis Laici, nº 26).

Este último ponto será certamente concretizado entre nós, no incremento de “unidades pastorais” que já se esboçam. Com estes sentimentos e reflexões, parto e continuo convosco. Conto sobretudo com a vossa oração pelo êxito pastoral do Sínodo dos Bispos e do Ano da Fé.

Cordialmente,

+ Manuel Clemente, Bispo do Porto

4 de Outubro de 2012, memória de S. Francisco de Assis – que redescobrindo Cristo reevangelizou a Europa do seu tempo

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