LUSOFONIAS – As ‘Orações‘ de Sophia

Tony Neves

Nasceu há cem anos e é um dos nomes lusófonos mais conhecidos da literatura e da poesia. Católica assumida, deu voz aos compromissos contra a guerra colonial e todas as formas de pactuar com a injustiça e a violação dos direitos humanos. Não encontro melhor homenagem que a de recitar três dos seus poemas mais emblemáticos para mim.

 

Começo por ‘A Paz sem vencedor e sem vencidos’.

Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Que o tempo que nos deste seja um novo
Recomeço de esperança e de justiça.
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos

A paz sem vencedor e sem vencidos

Erguei o nosso ser à transparência
Para podermos ler melhor a vida
Para entendermos vosso mandamento
Para que venha a nós o vosso reino
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos

A paz sem vencedor e sem vencidos

Fazei Senhor que a paz seja de todos
Dai-nos a paz que nasce da verdade
Dai-nos a paz que nasce da justiça
Dai-nos a paz chamada liberdade
Dai-nos Senhor paz que vos pedimos

A paz sem vencedor e sem vencidos

 

Outro poema de grande força de intervenção foi o ‘Porque…’:

Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão
Porque os outros têm medo mas tu não

Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.

 

E nada melhor que ir até à Capela do Rato- Lisboa, naquela vigília para o Dia Mundial da Paz de 1973… e rezar (ou cantar com o Francisco Fanhais) a ‘Cantata da Paz’:

Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar
Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar

Vemos, ouvimos e lemos
Relatórios da fome
O caminho da injustiça
A linguagem do terror

A bomba de Hiroshima
Vergonha de nós todos
Reduziu a cinzas
A carne das crianças

D’ África e Vietname
Sobe a lamentação
Dos povos destruídos
Dos povos destroçados

Nada pode apagar
O concerto dos gritos
O nosso tempo é
Pecado organizado.

 

Obrigado, Sophia, pela inspiração e pelo compromisso.

 

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