LUSOFONIAS – Abrir mundos ao mundo

Tony Neves, em Roma

O Papa Francisco, na ‘Fratelli Tutti’, defende que não é possível ‘experimentar o valor de viver sem rostos concretos a quem amar’ (FT 87).  O mundo tem de se abrir mais, melhorando os índices de hospitalidade. Diz ainda que ‘ a estatura duma vida humana é medida pelo amor, que constitui o critério para a decisão definitiva sobre o valor ou a inutilidade duma vida humana’ (FT 92).

É urgente partir em direcção às periferias, algumas delas bem próximas de nós, mesmo nas nossas famílias de sangue. Há que dar atenção a sinais preocupantes de racismo, ‘um vírus que muda facilmente e, em vez de desaparecer, dissimula-se, mas está sempre á espreita’ (FT 97). Também merecem redobrada atenção os ‘exilados ocultos’, como é o caso de pessoas portadoras de alguma deficiência e certas pessoas idosas que não contam para sociedades assentes na competitividade, no sucesso e no lucro.

A globalização não pode formatar todas as pessoas por igual, pois tal destrói a riqueza e a singularidade de cada pessoa e de cada povo’ (FT 100). O futuro da humanidade tem muitas cores, capitalizando a riqueza da diversidade. Há que superar um mundo de sócios para se construir um mundo de irmãos próximos, olhando para a parábola do bom samaritano: ‘livre de todas as etiquetas e estruturas, foi capaz de interromper a sua viagem, mudar os seus programas, estar disponível para se abrir à surpresa do homem ferido que precisava dele’ (FT 101).

‘igualdade e liberdade’ são valores importantes, mas sem a ‘fraternidade’ pouco ou nada de interessante acrescentam à humanidade: ‘para se caminhar rumo à amizade social e à fraternidade universal, há que fazer um reconhecimento basilar e essencial: dar-se conta de quanto vale um ser humano, de quanto vale uma pessoa, sempre e em qualquer circunstância’ (FT 106).

Um crescimento genuíno e integral é condição exigida para se promover o bem moral. A solidariedade começa nas famílias que ‘constituem o primeiro lugar onde se vivem e transmitem os valores do amor e da fraternidade, da convivência e da partilha, da atenção e do cuidado pelo outro. São também o espaço privilegiado para a transmissão da Fé’ (FT 114). A arte do cuidar tem de estar sempre presente, como expressão máxima da solidariedade: ‘o serviço é, em grande parte, cuidar da fragilidade’ (FT 115).

Há que lutar contra ‘todas as causas estruturais da pobreza, a desigualdade, a falta de trabalho, a terra e a casa, a negação dos direitos sociais e laborais’ (FT 116). E, claro, há que apostar numa ecologia integral que obriga a ‘cuidar da casa comum’ (FT 117).

A questão da propriedade também é aprofundada. Diz a Doutrina Social da Igreja que a propriedade privada está sempre submetida à destinação universal dos bens (cf. FT 123) e as sociedades devem ‘garantir que cada pessoa viva com dignidade e disponha de adequadas oportunidades para o seu desenvolvimento integral’ (FT 118).

O desenvolvimento deve ser sustentável e sustentado. Tem de ‘assegurar os direitos humanos pessoais e sociais, económicos e políticos, incluindo os direitos das nações e dos povos’ (FT 122).

As Relações Internacionais têm de mudar a sua forma de compreender o intercâmbio entre países: ‘se toda a pessoa possui uma dignidade inalienável, se todo o ser humano é meu irmão ou minha irmã e se, na realidade, o mundo pertence a todos, não importa se alguém nasceu aqui ou vive fora dos confins do seu próprio país’ (FT 125). Pede-se aos países mais ricos e desenvolvidos que não esmaguem os mais pobres, mas os ajudem a viver com padrões de dignidade, assegurando ‘o direito fundamental dos povos à subsistência e crescimento’ (FT 126).

O Papa Francisco conclui este capítulo terceiro com esperança num futuro melhor: ‘é possível desejar um planeta que garanta terra, tecto e trabalho para todos. Este é o verdadeiro caminho da paz, e não a estratégia insensata e míope de semear medo e desconfiança perante ameaças externas. Com efeito, a paz real e duradoura é possível só a partir de uma ética global de solidariedade e cooperação ao serviço de um futuro modelado pela interdependência e a corresponsabilidade na família humana inteira’ (TF 127).

E muito mais diz este último documento do Papa Francisco. De ‘um coração aberto ao mundo inteiro’ chegaremos à reflexão sobre ‘a melhor política’.  Há que ultrapassar falsas convicções que nos apresentam o migrante como um usurpador que nada oferece, os pobres como perigosos ou inúteis e os poderosos como generosos e benfeitores (cf. FT 141). Lá iremos…

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