Igreja: uma casa longe de casa?

Perto de 50 comunidades cristãs de migrantes, desde a filipina à indiana, da chinesa à romena, passando pela cabo-verdiana até aos cristãos oriundos de Peru e Equador, animaram ontem (20.05.2007) “a uma só voz” a Praça e Basílica de São João em Latrão: a Sé da diocese de Roma. A festa da Ascensão do Senhor, principal festa desta Basílica romana, outrora com o orago de Santíssimo Salvador, foi desta vez solenizada pelos imigrantes e suas famílias a viver e a trabalhar nesta metrópole cosmopolita com cerca de 3 milhões de habitantes. Segundo o III Relatório das Migrações da Caritas de Roma relativo a 2007, os imigrantes na cidade rondam as 235.000 presenças, sob um total nacional na ordem dos 3 milhões de imigrantes presentes em território italiano. Roma surge depois de Milão, como a segunda maior cidade onde se concentram os imigrantes. Os grandes protagonistas da “XVI Festa dos Povos: Uma casa longe de casa” foram os próprios imigrantes e seus descendentes, acompanhados pelos capelães – muitos deles sacerdotes e religiosas de língua materna – na sua maioria “estudantes” nas Universidades Pontíficias de Roma para aperfeiçoamento da formação teológica e pastoral. Estas comunidades cristãs de vários ritos e línguas possuem uma sua organização pastoral, lugares de culto próprios e agentes pastorais devidamente reconhecidos e capacitados pela diocese. As capelanias linguísticas são autênticos espaços de identidade, culto e formação onde os imigrantes longe de casa “se sentem em casa” na comunidade cristã! Esta Festa, organizada pelos Missionários Scalabrinianos, com o apoio da Caritas, Secretariado da Pastoral de Migrações e Município, e colaboração da “rede pastoral” das Capelanias de imigrantes e suas Associações, realiza-se na Basílica de S. João em Latrão, desde 2005 – ano do centenário do beato Scalabrini – tendo iniciado, em 1992, numa paróquia da periferia operária de Roma. De ano para ano, tem vindo a aumentar a participação de grupos de imigrantes, paróquias e movimentos eclesiais envolvidos na pastoral da mobilidade humana. Um evento que “germinado” na periferia e actualmente celebrado em pleno centro da cidade, se tornou no “Grande Encontro” da Igreja que peregrina também no seio das comunidades e famílias imigrantes de Roma. Com efeito, na hodierna Europa laica e secularizada os imigrantes são hoje sinal e memória da dimensão religiosa do homem e instrumentos da beleza e revitalização da missão da Igreja. A abertura aos imigrantes é garantia de futuro para a presença libertadora da Igreja no continente europeu! Na Eucaristia, celebrada por Monsenhor Mauro Parmeggiani, secretário geral da Diocese de Roma, concelebrada por perto de uma centena de sacerdotes e participada por cerca de dois milhares de fiéis, foi lançado o veemente apelo para que a Igreja se torne sempre mais “casa de hospitalidade” para todos os baptizados em Cristo nas suas peregrinações e êxodos rumo à Jerusalém celeste através dos vários países onde os dispersa o direito à mobilidade laboral e familiar. Auspiciou-se que nas comunidades cristãs os imigrantes encontrem uma “casa aberta” que ajude a vencer a distância e reconheça a cidadania da fé, não obstante a diferente origem, língua, rito ou itinerário espiritual por mais atribulado e estrangeiro possa parecer! Outro apelo, desta vez, lançado pelo provincial dos Scalabrinianos, Pe. Gabriel Parolin, foi o da aposta urgente na dimensão de “pertença” à cidade e à Igreja, pois muitas das comunidades superadas as fases do acolhimento e integração, são agora desafiadas para uma participação mais responsável – com direitos e deveres iguais – na cidadania plena e no “sentir-se parte viva” do caminho do país e da Igreja. Neste desafio da “pertença participativa” à Cidade e à Igreja locais, as capelanias cumprem uma tarefa pastoral insubstituível de mediação religiosa e pedagogia intercultural. Também em Portugal, numas dioceses mais do noutras, se tem vindo a criar capelanias diocesanas e nacionais para um melhor acompanhamento, estruturação e evangelização deste sector da pastoral missionária da Igreja. Entre os stands culturais e gastronómicos, e os grupos musicais que actuaram no palco da Festa, repleta de Diversidade, Alegria e Encontro, contavam-se também duas comunidades lusófonas: a comunidade cabo-verdiana, maioritariamente feminina e uma das mais antigas de Roma, e a brasileira que integra a vaga mais recente chegada à península itálica no último decénio. Seguindo as orientações da Igreja para a Mobilidade humana, em Portugal, sob o impulso da OCPM, desde há quase uma década se vem propondo às dioceses que celebrem a diversidade cultural e favoreçam o encontro, dentro da comunidade cristã, entre as várias comunidades imigrantes e todos os comprometidos no seu acolhimento e participação. De facto, são já 10 as dioceses que introduziram a Festa dos Povos, no seu Plano Pastoral anual, como evento de grande alcançe missionário e intercultural, coordenado pelo secretariado da pastoral da mobilidade humana. Nas próximas semanas, serão as dioceses de Évora, Braga, Angra do Heroísmo e Porto a celebrar a sua universalidade na fé e diversidade cultural e ritual, sob o formato da Festa dos Povos, com a colaboração do testemunho das comunidades imigrantes. Tem sido também através desta Festa dos Povos que os imigrantes e suas comunidades têm agradecido todos os gestos, palavras, acções de apoio emanados das comunidades cristãs e outras estruturas da Igreja, se as quais a sua integração teria sido muito mais difícil e marginal.

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