Igreja/Deficiência: A cegueira impede alguém de ser padre?

Tiago Varanda prepara-se para o sacerdócio com a ajuda das novas tecnologias e da sua cadeala-guia

Braga, 16 jun 2017 (Ecclesia) – Tiago Varanda está no seminário há seis anos e já entrou na reta final da sua preparação para a ordenação sacerdotal, em Braga, sublinhando que o facto de ser cego não o impede de responder a esta vocação.

“A cegueira não é impedimento nem canónico nem pastoral para exercer o sacerdócio, mas tinha esse receio. Felizmente, dissiparam-me as dúvidas logo no início do curso do seminário, e acolheram-me muito bem, os formadores, o senhor arcebispo [D. Jorge Ortiga], que sempre me apoiou, desde o início”, relata à Agência ECCLESIA.

O trabalho pastoral vai implicar “adaptações”, que o futuro sacerdote não vê como “qualquer problema”.

Natural de Lamego, Tiago Varanda nasceu em 1984 com um glaucoma congénito; perdeu a visão progressivamente e aos 16 anos, já dependia de uma cadela-guia que o acompanhava messa altura em todos os momentos do dia.

Depois de ter sido professor de História, sentiu um chamamento que o levou ao Seminário Conciliar de Braga, onde tem agora a companhia de Ibiza, a sua guia.

A cadela tem “um cantinho no quarto”, onde dorme, e acompanha Tiago “por todo o lado”, mesmo que às vezes descanse em momentos que fazem parte da rotina da casa, tanto de oração como de refeições.

“Sempre que saio, acompanha-me sempre, ela precisa de estar sempre com o dono para perceber, para não perder a ligação e poder fazer bem o seu trabalho”, acrescenta.

A perda da visão ensinou-o a recorrer a novas formas de leitura e de relacionamento no dia a dia; frequentou o curso de História, em Viseu e começou a dar aulas em várias escolas, também na região de Braga, onde acabou por entrar no seminário.

Como todos os seus colegas, frequenta as aulas na Faculdade de Teologia, em Braga, e participa na vida comunitária do Seminário. Um quotidiano que exige, naturalmente, algumas adaptações: para a formação académica, mune-se de um computador com sistema de voz que permite acesso auditivo aos livros de Teologia, em formato digital.

“Tenho acesso à maior parte dos textos, hoje, felizmente estão todos disponíveis, o que facilita imenso o acesso à formação de que preciso”, relata.

Tiago Varanda imprimiu a Liturgia das Horas em braille, para que se possa integrar ainda mais na oração diária do grupo.

“Tenho também, a nível da oração pessoal, um software, um leitor de ecrã, que lê o telemóvel. Através desta aplicação, iBreviary, consigo ter acesso não só à Liturgia das Horas, pelo telemóvel, mas também à própria Liturgia Eucarística, à Liturgia da Palavra, às leituras diárias da Eucaristia, e inclusive até a algumas orações eucarísticas do Missal”, acrescenta.

A experiência pessoal leva-o a pensar na “edição de material litúrgico em braille”, apesar de não ser algo fácil de concretizar.

“O grande desafio está também em promover entre as pessoas cegas este tipo de oração”, conclui.

O tema da Pastoral a Pessoas com Deficiência está hoje em destaque na edição semanal da revista ECCLESIA, dia em que começa a peregrinação jubilar a Fátima dedicado a este setor da ação da Igreja Católica.

LS/OC

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