Igreja Católica satisfeita com esforço de regulamentação da Concordata

Hospitais, prisões, Forças Armadas e de Segurança são exemplo positivo, mas ainda há questões a resolver A Igreja Católica em Portugal mostra-se satisfeita com o esforço do Governo em regulamentar a Concordata de 2004 no que diz respeito à assistência religiosa nos hospitais, prisões, Forças Armadas e de Segurança, num acordo que também abrange as restantes confissões religiosas.

Em declarações à Agência ECCLESIA, o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), D. Jorge Ortiga, explica que "durante muito tempo as coisas estiveram paradas", admitindo que houve alguma "pressão" nas últimas semanas para se chegar a um acordo antes do fim desta legislatura.

Os novos projectos legislativos deverão ser apresentados no final do próximo Conselho de Ministros, esta Quinta-feira. O presidente da CEP lembra que ainda é necessária a "concordância da Santa Sé".

"Apesar de o trabalho ter sido feito a correr, com alguma pressa, até, trabalhámos conscienciosamente e parece-nos que as coisas estão num sentido adequado e justo", assinala o Arcebispo de Braga.

D. Jorge Ortiga lembra que houve momentos de "apreensão" com a demora na regulamentação destas matérias, dado que a Concordata já foi assinada há mais de cinco anos, a 18 de Maio de 2004 (ver texto completo).

O secretário da CEP, Pe. Manuel Morujão, admite a necessidade de concluir nesta legislatura os processos em andamento, "já que foi com estas pessoas que se foram tratando os assuntos", destacando o "acordo" entre todas as partes.

Segundo este responsável, para além da questão das capelanias hospitalares, onde o consenso já existia há mais tempo, no passado dia 21 houve um encontro com o Ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira, e três Secretários de Estado, que permitiram fechar os outros dois dossiers.

Novos regimes

As novidades no campo das Forças Armadas e de Segurança (Marinha, Exército, Força Aérea, GNR e PSP) relacionam-se com o facto de, pela primeira vez, "do ponto de vista estatutário", se incluir na assistência religiosa as Polícias, sem que isso queira dizer que, até hoje, essa prática não existisse, como sublinha D. Januário Torgal Ferreira.

O Bispo responsável por este sector refere à Agência ECCLESIA que a Polícia não estava "fora do nosso serviço", havendo agora "um estatuto perfeitamente próprio para todas as Forças".

O processo de regulamentação gerou, para D. Januário Torgal Ferreira, um "consenso muito grande de inquietação" dentro da Igreja Católica que espera, neste momento, ver traduzido numa aposta séria nas várias capelanias, com padres "com competência, no número permitido pelos estatutos".

"Isto é uma responsabilidade: já que se chegou à regulamentação, com certeza que a Igreja em Portugal, de uma forma consequente e lógica, tem de se bater por estes três sectores de pastoral", indica.

Por isso, refere o Bispo das Forças Armadas e de Segurança, "temos de ser responsáveis, ainda mais exigentes do que fomos durante a regulamentação".

[[a,d,319,Coordenador Nacional da Pastoral Penitenciária]]Já o Pe. João Gonçalves, Coordenador Nacional da Pastoral Penitenciária, defende que não estamos propriamente perante uma regulamentação da Concordata, que implicaria "um projecto de presença da Igreja Católica, especificamente, nos estabelecimentos prisionais".

"O projecto que está aí é muito interessante, deixa muitas possibilidades de trabalho", diz à Agência ECCLESIA, falando em melhorias para o trabalho de capelães e seus auxiliares.

Em relação a horários, acessos, dado ser uma "regulamentação para todas as religiões", a situação mantém-se, de forma geral, embora com "algumas cautelas". Nada que limite a "eficiência" da actuação dos capelães na sua relação com os reclusos, nas dimensões "religiosa, celebrativa e formativa".

Diálogo interconfessional

D. Januário Torgal Ferreira classifica como uma "vitória" o facto de o acordo nas capelanias ter mostrado uma capacidade de diálogo "ecuménico e inter-religioso", lembrando que a Igreja Católica defende desde 1991 a abertura da assistência espiritual a fiéis de outras confissões.

O novo Estatuto remete para uma estrutura global, que se reúne duas vezes por ano, de carácter consultivo. Ali têm assento representantes de todos os militares, das direcções de pessoal do Ministério da Defesa e do MAI, com representantes das Confissões religiosas. "Nunca tivemos trabalhos desta ordem, isto é original, inovador", admite o Bispo das Forças Armadas e de Segurança.

[[a,d,320,Coordenador Nacional das Capelanias Hospitalares]]A importância da dimensão interconfessional dos acordos é sublinhada também pelo Pe. José Nuno Silva, Coordenador Nacional das Capelanias Hospitalares. "Tanto quanto sei, apraz-me registar que este diploma é o resultado de um conjunto de convergências, difíceis de obter, mas que acabaram por funcionar", afirma à Agência ECCLESIA.

O novo diploma permite a assistência religiosa nos hospitais a qualquer doente, independentemente do credo ou opção espiritual, o que para o responsável por este sector "é uma dado muito positivo".

"Seria um pouco esquizofrénico, para o Serviço Nacional de Saúde, ter uma regulamentação para a Concordata e outra para a Lei da Liberdade Religiosa (que não se aplica à Igreja Católica, ndr)", sublinha.

Este processo mostrou a capacidade de "chegar a formulações conjuntas", que podem facilitar um trabalho que, no terreno, é também conjunto.

Estatuto do capelão

[[a,d,318,D. Januário Torgal Ferreira: novo regime dos capelães]]O Bispo das Forças Armadas indica que os actuais capelães continuarão a gozar do mesmo estatuto. Para o futuro, os novos capelães "serão contratados" e alguns terão um "vínculo mais sólido relativamente à instituição militar.

"Isso não impede de forma alguma o serviço pastoral da Igreja", diz D. Januário Torgal Ferreira, pronto para a mudança. Em vez de 36 anos de serviço, será possível ter capelães durante "12 anos, por exemplo", um prazo que o Bispo considera adequado.

Na área da saúde, por outro lado, os capelães continuarão a ser "contratados e vinculados às instituições que servem"; a par de outros que podem ter situações mais precárias, caso a caso, adianta o Pe. José Nuno.

"Isto significa que a dimensão espiritual e religiosa do doente é considerada, no próprio conceito de saúde, por um lado, e, por outro, significa que os capelães são membros de pleno direito das instituições, fazendo parte de equipas multidisciplinares que, cada vez mais, valorizam esta dimensão", conclui.

Regulamentação por concluir

Apesar do acordo nas matérias acima referidas, ficam por regulamentar várias áreas da Concordata, como a questão do Património da Igreja, a fiscalidade e o Ensino da Moral e Religião Católica.

D. Jorge Ortiga sublinha que "ainda faltam outros aspectos, nomeadamente a assistência social do clero" e a questão dos "fins religiosos" referidos no artigo 26 da Concordata, que permitem isenções fiscais (IRS, IRC, IMT e IMI).

Na Concordata ficou consagrado que as pessoas jurídicas canónicas, quando desenvolvam actividades com fins diversos dos religiosos – de solidariedade social, de educação e cultura, além dos comerciais e lucrativos –  ficam sujeitas ao regime fiscal aplicável à respectiva actividade.

O presidente da CEP lamenta, por outro lado, que ainda exista uma grande indefinição no que diz respeito ao Património, sublinhando que a Comissão bilateral para o desenvolvimento da cooperação quanto a bens da Igreja que integrem o património cultural português (artigo 23 da Concordata) apenas se reuniu "uma vez".

"Temos alertado para isto imensíssimas vezes e podem surgir problemas", alerta o Arcebispo de Braga, frisando que "falta muito nesta área".

Outro assunto que tinha merecido algum debate, a regulamentação do artigo 16º da Concordata, que trata da "nulidade e dispensa pontifícia do casamento" e o seu reconhecimento segundo a Lei Portuguesa, foi resolvido através do Decreto-Lei n.º 100/2009, de 11 de Maio.

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