Homilia do cardeal-patriarca na missa de Quarta-Feira de Cinzas

Homilia do cardeal-patriarca na missa de Quarta-Feira de Cinzas

 

“Uma Quaresma vivida ao ritmo da Igreja”

 

1. O recente anúncio, feito pelo Papa Bento XVI, de renúncia ao seu Ministério de Bispo de Roma e Sucessor do Apóstolo São pedro, no início da Quaresma, convida-nos a viver este tempo de preparação para a Páscoa, em Igreja, o Povo do Senhor. Durante esta Quaresma será eleito o novo Papa, o que exige da Igreja que viva a Quaresma como tempo de oração, de escuta da Palavra que Deus dirige hoje ao seu Povo, a procurar no silêncio da fé a verdade da salvação.

 

Uma Igreja em oração merecerá melhor a assistência do Espírito Santo nesta escolha tão decisiva para a vida da Igreja e para a sua missão na complexidade do mundo contemporâneo. Continua a ser verdade a afirmação de São Paulo aos Coríntios: “Este é o tempo favorável, este é o dia da salvação” (2Cor. 6,2).

 

2. Pela primeira vez desde há muitos séculos, o Papa renunciou, mas não morreu. Bento XVI continua entre nós, dedicado à oração pela Igreja e pelo mundo. A união com ele é uma interpelação forte para a oração da Igreja nesta Quaresma, agradecendo a Deus o dom do seu ministério, mas, sobretudo, unindo-nos à sua oração, rezando pelo que ele reza, pedindo a Deus que nos ensine a rezar como ele reza.

 

Procuremos viver esta Quaresma guiados pelo seu Magistério: aprofundando a nossa peregrinação da fé, desenvolvendo no concreto da nossa vida a união entre a fé e a caridade. Se a nossa fé não for um ato de amor, expressão da caridade, é vulnerável às fragilidades das nossas escolhas humanas.

 

A fé é, na sua verdade profunda, um ato de amor. Escutar a Palavra de Deus é acolhê-la como manifestação do amor de Deus por nós e ao sentirmo-nos amados, amamos ou então não acreditamos. Uma nova verdade na escuta da Palavra é o grande desafio para esta Quaresma.

 

Convido-vos a escutar as palavras do Magistério de Bento XVI, todo ele repassado da experiência do amor, como uma palavra a escutar, porque é a Palavra que Deus dirige à sua Igreja. Meditemos a sua Mensagem para esta Quaresma.

 

3. O Magistério de Bento XVI e o modo orante como vai viver esta Quaresma, enquanto a Igreja escolhe o seu Sucessor, convida-nos a dar centralidade à oração. Esta é sempre a melhor maneira de escutar a Palavra e deixar-se conduzir por ela para a adoração de Deus e para o amor dos irmãos.

 

A verdade da oração não se mede pela sua visibilidade aos olhos dos homens, mas pelo silêncio do coração que se entrega ao Senhor. A verdade da oração só Deus a conhece; é por isso que a oração é sempre lugar de revelação. A verdade da oração é uma força silenciosa que abraça a humanidade e a faz beneficiar da redenção.

 

4. As grandes festas cristãs são sempre precedidas de um tempo preparatório, para que as possamos celebrar na verdade da nossa fé. Esses tempos de preparação são normalmente vigílias, no Natal quatro semanas, o Advento, na Páscoa, seis semanas.

 

É o tempo preparatório mais longo, o que sublinha a centralidade decisiva da Páscoa. Havemos de gastar toda a nossa vida neste mundo a mergulhar neste mistério da morte e ressurreição de Cristo, desejando a Páscoa definitiva na Casa do Pai. Acolher o amor insondável de Jesus Cristo por nós, fazer do amor interpessoal a nossa maneira normal de nos relacionarmos com Jesus, e desejar muito o encontro definitivo.

 

Longo caminho, uma peregrinação da fé, atraídos pelo Santuário onde Ele reina como Senhor. Em cada momento dessa caminhada sentimos a urgência da nossa conversão. Sem ela paramos na nossa caminhada. Bento XVI ensinou-nos que a fé é uma porta que se abre para essa longa peregrinação.

 

Sempre assim foi. Ouvimos Paulo aos Coríntios: “Nós vos pedimos em nome de Cristo: reconciliai-vos com Deus” (2Cor. 5,20). E no Antigo Testamento, o Profeta Joel: “Convertei-vos a Mim de todo o coração” (Jl. 2,12).

 

5. Nesta Quaresma esta peregrinação tem de ser feita em Igreja. Temos no meio de nós o grande orante, o Papa Bento XVI; temos a Igreja toda mobilizada pela escolha do novo Papa; somos um Povo que o Senhor ama, que não abandona, que atrai para a verdade definitiva. Façamos da oração a experiência forte desta Quaresma, pois só ela nos motivará para a necessidade da conversão, para o louvor de Deus e para o amor dos irmãos.

D. José Policarpo, cardeal-patriarca de Lisboa

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