A manhã do domingo de Páscoa faz brilhar para nós a luz de Cristo Ressuscitado, que irrompe com a aurora do primeiro dia da semana para iluminar todas as noites escuras da nossa vida e da vida do mundo.
Estamos de novo a celebrar a Páscoa do Senhor, na esperança de que preencha todas as trevas das nossas vidas e pedindo ao senhor que se faça presente em todas as pessoas e situações que, no mundo, precisam da luz da sua esperança.
A narração do Evangelho apresentava-nos os acontecimentos vividos pelas mulheres e pelos discípulos que, de manhãzinha, vão ao sepulcro de Jesus, tendo-o encontrado vazio. Juntamente com as aparições de Jesus, que se lhe seguem, este é um dos sinais que apontam para a fé na ressurreição, proclamada pelos crentes desde o primeiro momento, tal como o evangelista diz ao concluir a narração, com uma referência ao outro discípulo: “viu e acreditou”.
Diante do cenário inesperado, Maria Madalena corre para ir ter com Simão Pedro, a testemunha privilegiada daqueles acontecimentos, e diz-lhe: “Levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde o puseram”.
Estas palavras atestam que Jesus não está ali, como confirma Pedro e a outra testemunha, o outro discípulo que ali acorre com ele. Deparam-se com as ligaduras no chão e o sudário enrolado à parte. O Evangelista pretende, assim, assegurar a veracidade dos factos por meio da descrição dos pormenores e do testemunho de três pessoas, Maria Madalena, Pedro e o outro discípulo.
Ao afirmar que o outro discípulo, tendo entrado no sepulcro, viu e acreditou, o evangelista faz-se eco da Epístola aos Romanos, que escutámos na vigília pascal em contexto batismal e que dizia: “Fomos sepultados com Ele pelo batismo na sua morte, para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, também vivamos uma vida nova”. O evangelista declara por meio desta ação que a porta da fé é o sepulcro aberto de Jesus, onde é preciso entrar pelo batismo, para fazer caminho na vida nova. Morte e ressurreição de Jesus Cristo constituem o mistério pascal, o mistério da nossa fé.
A outra expressão que tomamos, hoje para a nossa meditação e a que podemos dar um sentido espiritual, sai também dos lábios de Maria Madalena, ansiosa por encontrar Jesus, que lhe tinha revelado a misericórdia e o perdão de Deus: “não sabemos onde o puseram”.
Diante da certeza de que Jesus não está ali, pensa naturalmente, que alguém o terá levado. Falta saber para onde. As aparições do Ressuscitado farão luz sobre esta interrogação e farão acreditar que foi para o Pai de onde viera, mas permanece em nós e no meio de nós.
Desde essa altura, a grande questão de crentes e não crentes, inquietos e necessitados de explicar a fé, mas de explicar também os acontecimentos bons e maus da vida, continua a ser a mesma: onde está Jesus? Não raro, diante dos grandes dramas da humanidade, diante do sofrimento dos inocentes, das injustiças flagrantes ou mesmo diante da morte, ouve-se em tom de provocação: “afinal onde estava Deus?” Mas, a mesma pergunta pode ouvir-se também dos lábios crentes que, dessa forma, manifestam a grande dificuldade de penetrar no mistério de Deus, da fé e das realidades humanas.
A Páscoa de Jesus é a única realidade que nos ajuda a entrar nesse mistério e a iluminar todas as perguntas que nos surgem, porque é portadora da luz d’Aquele que passa pela morte e chega à glória da ressurreição. Diz-nos que Jesus não está morto no sepulcro e leva-nos a contemplá-lo presente em todas as situações humanas. Às vezes surge a tentação de O pôr do lado errado, de O contemplar na glória sem cruz ou na cruz sem ressurreição.
Onde está Jesus? Está com toda a certeza do lado da humanidade por quem ofereceu a sua vida e que não pode salvar-se a si mesma. Jesus está sempre ao lado do bem de cada pessoa e de todas as pessoas com o desejo divino de nos ajudar na estrada da felicidade.
Jesus está sempre do lado da vida, que quer ver respeitada, promovida e dignificada. Nunca está do lado da morte e chama continuamente à conversão todos os que põem em causa por palavras, por obras ou por omissões a própria vida ou a dos outros, particularmente dos pobres, dos inocentes e dos indefesos.
Jesus está sempre do lado da paz e acompanha com a sua graça os construtores da paz, mesmo que, por vezes, as fações O queiram pôr do lado da violência e da guerra para justificar as suas más ações. Deus não entra nas nossas guerras e sofre sempre na pessoa das suas vítimas, associando-as à sua paixão. Não cessa de pedir a mudança de vida aos que as fazem e de os convidar a um coração fraterno, que partilha, que respeita e que reconhece os direitos das outras pessoas e povos.
Jesus está no sofrimento de cada pessoa como consolação e esperança de salvação. Não ofereceu a sua vida ao Pai senão para abrir horizontes de vida a cada um de nós que encontra inevitavelmente dores e penas no seu caminho.
Mas Jesus está também no coração feliz de todas as pessoas que se alegram com o bem dos outros, que usam a caridade fraterna como o maior e mais belo recurso do coração. Jesus está na Igreja e na humanidade que dá testemunho d’Ele com coragem e fortaleza. Está na humanidade que é capaz de servir o próximo com amor.
Irmãos e irmãs!
Neste dia celebramos a Páscoa de Cristo, entramos no sepulcro vazio e professamos a nossa fé na sua ressurreição. Daqui levamos o sério desafio de anunciar à humanidade onde está Jesus Cristo, o Ressuscitado. Daqui levamos o desafio de ajudar os irmãos a fazer caminho para O encontrar no meio das situações felizes ou duras da vida.
O testemunho de uma fé feliz constitui o método e a linguagem adequados para realizarmos esta missão que nos foi dada ao entrarmos com Cristo no sepulcro para com Ele ressurgirmos para a vida.
Coimbra, 17 de abril de 2022
D. Virgílio do Nascimento Antunes, Bispo de Coimbra