Homilia da Missa Vespertina da Ceia de D. José Traquina, bispo de Santarém

D. José Traquina, Foto Agência Ecclesia

Irmãos

Com esta Missa vespertina da Ceia do Senhor, damos início à celebração do Tríduo Pascal, o ponto alto de todo o ano litúrgico, no qual estão contidos o Mistério Pascal de Cristo e o Nascimento da Igreja.

Nascemos na Páscoa e voltamos a comemorar a Páscoa para atualização da graça abundante da vida de Deus em nossas vidas. É a solenidade das solenidades da Igreja, mas este ano a solenidade é sóbria e restrita, por prudência e defesa da saúde dos fiéis. Este jejum sacramental obrigatório a que estão sujeitos os cristãos, é do conhecimento de Deus. Pedimos-lhe que conceda a todos a graça da participação, em comunhão espiritual.

Nesta celebração, a Igreja celebra a instituição da Eucaristia e do ministério sacerdotal de Cristo e o mandamento do amor fraterno. Em que circunstância é que Jesus dá início a estes sacramentos da sua presença? É o início do Evangelho proclamado que o revela: “Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a sua hora de passar deste mundo para o Pai, Ele, que amara os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim” (Jo 13,1).

A Eucaristia é o memorial da morte e ressurreição de Cristo. Ao celebrarmos este memorial, atualiza-se a graça salvífica da entrega do Senhor pela sua Igreja e por toda a humanidade. É a grande herança que o Senhor Jesus nos deixou antes de morrer. A entrega que faz de si mesmo na cruz é antecipada na celebração da Ceia: “Isto é o meu corpo entregue por vós”. Esta foi a última e a única Ceia, já que todas as celebrações da Eucaristia são atualizações da mesma entrega e é o mesmo Senhor que, em nós, repete as mesmas palavras.

Ao confiar aos Apóstolos a missão “Fazei isto em memória de mim”, Jesus estava a confirmá-los na identificação sacerdotal da entrega. O ministério sacerdotal é um dom que requer comunhão profunda com aquele que representamos, numa entrega total pela causa do seu Reino e pela beleza e riqueza espiritual da Igreja, o seu povo, também ele sacerdotal.

A Eucaristia e o ministério sacerdotal são na Igreja e através da Igreja sinais do Amor de Deus para todos os que acolhem a sua Palavra. Mas os sacramentos da Fé devem traduzir-se na vida. A verdade do Amor revelado na celebração da Eucaristia deve traduzir-se em serviço aos irmãos. Surge, assim, o Lava pés. O gesto de Jesus a lavar os pés aos discípulos não serve apenas para lembrar o ministério dos Diáconos, serve para traduzir o espírito que deve animar a vida de todos os cristãos: amar e servir. Este ano, por razões extraordinárias, não se faz o rito do Lava pés nesta Missa. O que é importante é guardar a palavra de Jesus: “Dei-vos o exemplo, para que, assim como Eu fiz, vós façais também” (Jo 13,15).

O apóstolo Pedro não queria aceitar a iniciativa de Jesus, porque só um escravo lava os pés ao seu Senhor e isso não condizia com a sua leitura acerca da majestade de Cristo como Messias. Foi necessário mais alguns dias para o Apóstolo Pedro entender e assumir este gesto de Jesus.

Lavar os pés à humanidade traduz o mistério pascal. Uma entrega por amor para purificar e libertar. Pensamos no que está a acontecer com muitas pessoas a trabalhar nos cuidados de saúde, entregues à causa de salvar pessoas doentes e fragilizadas com a pandemia que se instalou em todo o mundo. A celebração da Páscoa ajuda a dar especial significado aos redobrados cuidados, assegurados por tantos profissionais de saúde. Se nesse serviço acontece dedicação e amor ao próximo, então, também aí, Cristo se identifica com o doente e com aquele que dele cuida.

Preocupados uns pelos outros e pelo mundo, como acontece especialmente nesta altura, a celebração da Páscoa mobiliza-nos a sermos um dom para os outros, procurando estar do lado das soluções, agindo com generosidade e confiança.

Celebrada nestas circunstâncias, a Páscoa ainda reforça mais o modo como a vida dos cristãos deve ser traduzida em amor e serviço. No ambiente de uma família ou comunidade cristã, não interessa a importância social de cada um dos membros. Interessa, sim, que reine a verdade e o amor e haja solidariedade. Jesus deu-nos o exemplo e convidou-nos a segui-lo.

+ José Traquina

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