Guiné-Bissau: situação calma

Mortes de Nino Vieira e do Chefe de Estado-Maior do país «esvaziaram» as ruas, numa expectativa crescente em relação ao futuro próximo Uma situação calma é o que se vive em Bissau, capital da Guiné-Bissau. Esta madrugada, o Presidente da Guiné-Bissau, Nino Vieira (na foto), morreu na sequência de um ataque contra a sua residência, por militares das Forças Armadas, poucas horas após o Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, general Tagmé Na Waié, ter morrido num atentado à bomba. Apesar da incerteza, Bissau está calma. O relato chega de Simão Leitão, gestor do projecto «+ Escola» na Guiné-Bissau, da Fundação Evangelização e Culturas, que, esta manhã saiu de casa, já depois do assassinato de Nino Vieira e dá conta à Agência ECCLESIA da circulação nas ruas de Bissau. “Com algumas limitações, é possível circular”. Uma situação normal “sempre que alguém importante está na rua, não é preciso haver instabilidade”. Há poucas pessoas na rua. Circulam três ou quatro carros, embora não haja impedimento, as pessoas estão em casa recolhidas. “Haverá algum receio, não é só uma expectativa passiva, porque a memória de 1998 está ainda muito presente”. As lojas estão fechadas, com excepção do pequeno comércio dos senegaleses e libaneses. Farmácias, supermercados, lojas e bombas de gasolina estão encerradas. “Havia grupos de militares em algumas zonas (grupos de dois ou três militares), mas não em operações stop”. O gestor do projecto da FEC encontra-se a dois quilómetros da residência de Nino Vieira, local onde o Presidente foi morto. Pelas quatro da manhã, puderam ouvir-se disparos de metralhadora e rockets. Três horas depois, circulava na rua a possibilidade de Nino Vieira ter sido morto. “Fui à estrada principal pelas 7 horas da manhã e vi militares a circular, imagino que estivessem a recolher, no sentido contrário à da residência de Nino Vieira”. “Na rua diz-se que o exército ou uma facção do exército não controlada, não se sabe, pegou em armas e fez o ajuste de contas pela morte de Tagmé Na adianta ter sido um grupo de cidadãos que tomou esta iniciativa e não tendo sido possível controlá-los. Um sacerdote missionário no terreno, perto do local do atentado presidencial, acredita que “teremos 2 ou 3 dias de tensão política, mas penso que não sucederá nada às populações”. Lembrando que este já não era o primeiro ataque contra Nino Vieira ou Tagmé Na Waié, nos últimos tempos, o missionário afirma acreditar que “as duas mortes estão unidas”. Estabilidade instável O conflito entre o Presidente Nino Vieira e o Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas, o General Tagmé Na Waié, vinha desde 1998. “A tentativa recente de assassinato, assim designada pela população, do CEMFA, era sinal da inimizade política e pessoal que mantinham e alimentavam há algum tempo”, recorda Simão Leitão. Mas desde a tomada de posse do governo da Guiné-Bissau, presidido por Carlos Gomes Júnior, em Janeiro, “a situação era estável”. Tagmé Na Waié acusara em Janeiro os homens de Nino Vieira de o terem tentado assassinar, mas nessa altura fora dito que apenas se verificara o disparo acidental da arma de um segurança da Presidência da República à passagem do general. A segurança de Nino era até então constituída por uma milícia conhecida como “aguenta” e que foi depois disso formalmente desmantelada. Actualmente a segurança do Presidente era assegurada pelo exército. Simão Leitão assume não saber avaliar até que ponto haverá um abalo da estabilidade social, “mas as pessoas tinham confiança que o governo do Carlos Gomes Júnior pudesse decorrer com calma e levar o país para a frente. Numa perspectiva de curto prazo, isto não era expectável”, explica. A Guiné tem um regime presidencialista e, com o grande poder que o Presidente assume, “neste momento há um vazio, pois falta uma chefia politicamente reconhecida”. Os militares assumiram respeito pelo resultado das últimas eleições e afirmaram ter o exército controlado. “Mas entramos num período desconhecido. Sem Presidente e sem CEMFA, tudo pode acontecer”. Legalmente o Presidente da Assembleia Popular toma o lugar de Presidente, durante o período de transição. Sob um cenário de eleições presidenciais, Simão Leitão afirma que Henrique Rosa é um “ex-presidente querido entre a população. Mas há também Kumba Ialá, que disputou as últimas eleições e é também uma pessoa muito popular”. O sacerdote missionário aponta que “a nossa esperança é que agora escolham um novo presidente, da mesma linha do Primeiro-Ministro e do seu governo”, avançando o nome do ex-presidente Henrique Rosa. Simão Leitão recorda que “o grau de imprevisibilidade da Guiné Bissau é grande e por isso há que aguardar”. Do contacto que mantém com a população, o gestor do projecto da FEC assume que as pessoas “estão cansadas da guerra. A guerra em 1998 foi muito dolorosa e sangrenta e as pessoas estão cansadas”. Entre a juventude “há uma grande vontade que o país dê um passo em frente”, mas recorda também a forte presença do narcotráfico. Simão Leitão assinala “a força do país e a vontade de lutar pelo desenvolvimento. Esta é uma força motriz que aliada à comunidade internacional que pressiona a estabilidade, pode ajudar o país a desenvolver-se”. A Fundação Evangelização e Culturas assume-se como a plataforma da Igreja Portuguesa para o relacionamento com as Igrejas Lusófonas e pretende desempenhar um papel importante na dinamização e sensibilização da sociedade portuguesa para o desafio da cooperação e do desenvolvimento dos países lusófonos. Na Guiné Bissau está desde 2001 a trabalhar nas áreas de formação e educação para o desenvolvimento. Foto: Lusa

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