Ensino Especial em Portugal

Vêm estas linhas a propósito da latente controvérsia e preocupação criada pelo Decreto-Lei 3/2008, de 7 de Janeiro que, recorda-se, pretende reformar o ensino especial em Portugal. Este diploma, na sua actual forma escrita, redefine os apoios especializados a prestar no sistema educativo, para fazer face às necessidades dos alunos com necessidades educativas especiais. Nesse quadro, inviabiliza que os alunos sejam encaminhados para os estabelecimentos de ensino especial, alegando uma justificada política de inclusão, passando essa oferta a existir nos estabelecimentos de ensino regular. Sabemos da generosidade do legislador e, queremos crer, da melhor intenção intelectual do académico ou técnico que o suporta. Inclusão, como é óbvio, é não só palavra que nos preocupa, a nós pais em relação aos nossos filhos diferentes, mas é acto que permanentemente nos ocupa. É disso que cuidamos quando, demoradamente, aos seus 15 ou 16 anos lhes explicamos como ver um preço ou receber um troco, ir confiantemente a um local ou tomar um autocarro de uma paragem à próxima. Condições essenciais de realização da sua autonomia, pelo que da sua felicidade, independentemente da sua e da nossa longevidade. Convenhamos, pois, que dificilmente alguém questione que da inclusão quem quer que seja se ocupe tanto como nós próprios, seus pais. Ocorre porém que, em relação ao modelo daquele diploma legal, não só não estão criados no terreno os apoios nele previstos, como, além disso, são excluídas das escolas de referência ou das unidades de ensino e de apoio nele previstas as respostas específicas para as perturbações do desenvolvimento, a deficiência mental e as perturbações da personalidade e do comportamento. Todos estes alunos serão incluídos nas turmas do ensino regular e serão pontualmente apoiados por docentes de ensino especial. Esta modalidade de apoio é completamente distinta do modelo de ensino em que estes alunos estavam integrados nos estabelecimentos de ensino especial ou para os quais poderiam e deveriam ser encaminhados os novos alunos: turmas específicas, número reduzido de alunos, intervenções especializadas, relação de grande proximidade e ambientes não massificados. Foi no ambiente destes estabelecimentos de ensino especial que os nossos filhos com aquelas particulares características de deficiência e de diferença fizeram as suas árduas conquistas de aprendizagem. Privá-los e privar os vindouros desta opção seria condená-los a uma opção única, que por isso não seria opção, como de facto não é resposta para todos. É por isso que, sem prejuízo do valor incontestável do princípio da inclusão, na dimensão prática do modelo de organização escolar a inclusão tem de ser um direito de opção, ao par dos estabelecimentos de ensino especial. Para muitas crianças, esse é o espaço das suas conquistas e realizações, configurador de inclusão futura. Por isso, importa que o diploma preveja, de novo, a existência dos estabelecimentos de ensino especial no sistema de ensino para crianças e jovens com necessidades educativas especiais. Até porque a luta por este direito é fronteira com um outro dever: o dever da responsabilidade social que a todos nós está acometido na luta por este direito de opção para todas as crianças com estas características (nossas filhas, de outros ou ainda não nascidas). Fernando Magalhães, Plataforma de Pais pelo Ensino Especial

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