Discurso do presidente da Conferência Episcopal Portuguesa na abertura da 184.ª Assembleia Plenária

Senhor Núncio Apostólico, Senhores Arcebispos e Bispos, Reverendos Padres, Senhoras e Senhores:

Dirijo-vos breves palavras de abertura duma sessão que, na circunstância e na temática, traz motivos de particular relevo.

Reunimo-nos a seguir à feliz canonização dos Papas João XXIII e João Paulo II, dos quais temos memórias bem “ao vivo”, nos respetivos pontificados. Lembramo-nos certamente das imagens do Concílio Vaticano II, que o primeiro convocou e a cuja primeira sessão presidiu, transmitidas já pela televisão, com a reforçada presença do catolicismo universal nas nossas vidas e empenhamentos eclesiais. Tais imagens, que retemos na memória e no coração, bem como tudo o referente ao “Bom Papa João”, são para nós uma lembrança sempre motivadora, para uma herança conciliar ainda em fase de receção e pleno cumprimento.

Do Papa Wojtyla, temos memórias mais próximas, tanto no tempo como na geografia, quer nas suas visitas a Fátima quer a várias das nossas Dioceses, além das vezes que o vimos em Roma e noutros lugares do mundo. De tudo ressalta a força da sua contagiante convicção e o grande impulso para a “nova evangelização” que igualmente queremos levar por diante, na centralidade de Jesus Cristo “Redentor do homem”, para O recebermos assim, e O levarmos aos outros, com “novo ardor, novos métodos e novas expressões”.

Com o Papa Francisco, que tão feliz e oportunamente os canonizou, e com a intercessão destes dois grandes Pontífices, ainda mais levaremos por diante a “renovação da pastoral da Igreja em Portugal”, a que nos propusemos na nota pastoral de abril do ano passado.

 

Desde a nossa última reunião, faleceram dois membros muito estimados do Episcopado Português, a quem estamos agradecidos pelo respetivo ministério, largo no tempo e na contribuição: D. Joaquim Gonçalves, que foi Bispo de Vila Real e o Cardeal D. José da Cruz Policarpo, que foi Patriarca de Lisboa e Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa em vários e marcantes mandatos. Deus os recompensará pelos seus muitos trabalhos e pela participação ativa e estimulante que sempre tiveram na nossa Conferência.

Foi nomeado e tomou posse como Bispo do Porto, o Senhor D. António Francisco dos Santos, que era Bispo de Aveiro. A grande generosidade e clarividência pastoral com que tem exercido o ministério, garante-lhe excelente continuação na diocese portucalense.  

Tomou posse do cargo de Bispo das Forças Armadas e de Segurança o Senhor D. Manuel Linda, esclarecido que foi o seu estatuto no quadro eclesiástico-militar competente, de acordo com o artº 17 da Concordata entre a Santa Sé e a República Portuguesa, de 18 de maio de 2004. Desejamos-lhe as maiores felicidades neste importante serviço, que conjuga, com a devida autonomia dentro dum Estado secular e democrático, duas instituições centrais da sociedade portuguesa – Igreja Católica e Forças Armadas e de Segurança – em benefício dos cidadãos crentes e da coletividade em geral.

   Em Quinta-Feira Santa, foram nomeados para Bispos Auxiliares de Braga e de Lisboa, respetivamente os Senhores D. Francisco José Senra Coelho e D. José Augusto Traquina Maria. Augurando-lhes fecundo ministério, estamos certos que as duas dioceses muito ganharão com o seu bem demonstrado zelo pastoral.

 

Vivemos entretanto, com os nossos concidadãos, o 40º aniversário da revolução de 25 de abril de 1974, que possibilitou a instituição do regime democrático em Portugal, em que felizmente vivemos e em cujo aprofundamento nos comprometemos.

Na verdade, quer no programa do Movimento das Forças Armadas, quer na Constituição de 1976, encontramos uma geral consonância com o que a própria Conferência Episcopal Portuguesa tinha referido na Carta Pastoral de 4 de maio de 1973, nos seguintes termos: «Ao olhar para o mundo contemporâneo, no qual a Igreja se encontra e age, não pode ela permanecer indiferente perante múltiplas situações de injustiça que impedem o correto desenvolvimento dos homens, tais como: a condição infra-humana em que tantos vivem, diminuídos por graves carências alimentares, habitacionais, sanitárias, de emprego, educacionais e culturais; a existência de limitações, não raro injustificadas, ao pleno exercício dos direitos e garantias fundamentais das pessoas e dos grupos; o agravamento de numerosas formas de alienação, de medo e de mentira; a expansão de uma economia que não está ao serviço de todos e cujo móbil primário é o lucro; a difusão de motivações que induzem a satisfazer necessidades não verdadeiramente sentidas nem conducentes à genuína realização humana; a oferta e aceitação de condições de trabalhos despersonalizantes, nas quais o homem é equiparado à máquina, com prejuízo da sua capacidade criadora; a implantação de estruturas urbanas em que faltam condições dignas de alojamento, de acesso aos locais de trabalho e aos equipamentos coletivos; o alastramento de formas de marginalidade, algumas criminosas e imorais; e a crescente insatisfação da juventude que não encontra padrões de vida ajustados às suas reais necessidades» (Conferência Episcopal Portuguesa, Carta Pastoral no décimo aniversário da “Pacem in Terris”, 4 de maio de 1973. Documentos pastorais 1967-1977, p. 113-114).

Sendo verdade que os Bispos portugueses tinham bem presente a situação do país em 1973, temos de concluir, agora nós em 2014, que muito se fez entretanto e na esteira da Revolução de Abril para responder às lacunas referenciadas. Mas ainda faltará outro tanto, para que sejam definitivamente ultrapassadas aquelas e outras que sobrevieram, no atual condicionalismo socioeconómico e cultural. A nossa gratidão aos obreiros da democracia portuguesa tem de acrescentar-se com o empenho permanente no seu reforço, em tudo e para todos.

 

Dentro dos pontos de agenda desta assembleia plenária, destaco apenas um nestas palavras de abertura, pelo seu relevo muito especial. Trata-se da reforma dos Manuais de Educação Moral e Religiosa Católica. No quadro concordatário que nos rege de há dez anos para cá, e em que, designadamente, «a República Portuguesa, no âmbito da liberdade religiosa e do dever de o Estado cooperar com os pais na educação dos filhos, garante as condições necessárias para assegurar, nos termos do direito português, o ensino da religião e moral católicas nos estabelecimentos de ensino público não superior, sem qualquer forma de discriminação» (Concordata, artº 19, § 1), compete-nos concretizar sempre mais e melhor as finalidades da disciplina. Finalidades já aprovadas pela Conferência Episcopal e que convém lembrar: A Educação Moral e Religiosa Católica visa «a formação global do aluno, que permita o reconhecimento da sua identidade e, progressivamente, a construção de um projeto pessoal de vida. Promove-a a partir do diálogo da cultura e dos saberes adquiridos nas outras disciplinas com a mensagem e os valores cristãos enraizados na tradição cultural portuguesa».

Também por esta via pedagógica, desejamos colaborar na construção duma sociedade que, sendo plural, deve contar com a contribuição de cada uma das partes que inclui, mormente quando se trata do legado vivo da tradição católica, tão presente na vida nacional e decerto das gerações passadas para as presentes e futuras.

Outros temas se incluem na agenda desta Assembleia Plenária, além da eleição para os órgãos da CEP num novo triénio. Disso mesmo se dará conta no comunicado final.

Fátima, 29 de abril de 2014

D. Manuel Clemente, patriarca de Lisboa

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