«Diálogos com Deus em Fundo»

Em boa hora, António Marujo resolveu dar formato de livro a um conjunto de entrevistas realizadas a pessoas que pensam a dimensão religiosa através da sua essência.

Palavras proféticas que não se perdem nas brumas do tempo. Em boa hora, António Marujo resolveu dar formato de livro a um conjunto de entrevistas realizadas a pessoas que pensam a dimensão religiosa através da sua essência. «Diálogos com Deus em Fundo» tem a chancela da Gradiva e dá voz a vozes que colocam pertinência nas perguntas audaciosas do entrevistador.

Dividida em quatro grandes blocos, a obra tira, da clandestinidade, alguns temas que caminham com os homens/mulheres da sociedade contemporânea. Com uma excelente apresentação, António Marujo conduz o leitor a uma visão holística da realidade.

Através dos blocos temáticos «Deus, Mistério e Fascínio»; «Uma palavra que nos ilumina»; «Dimensões da Mudança» e «Novas Humanidades» os cerca de vinte entrevistados dão luz ao pensamento religioso, bíblico e teológico. Como realça António Marujo, “o debate cultural não pode continuar a remeter para a clandestinidade essas vozes que, pela sua diferença, podem ser um contributo fundamental também para a definição das escolhas sociais”. Pelo contrário – acrescenta o autor – “religiões e culturas têm de se abrir mutuamente, para permitir que a condição humana seja vivida de forma mais digna por todas as pessoas”.

As entrevistas oferecem autênticas pedras preciosas que merecem ser digeridas lentamente. As cerca de 300 páginas estão cheias de pérolas cravadas no texto. Não quero ser injusto para alguns entrevistados – todos mereciam uma pequena citação – mas vou retirar alguns excertos.

Frei Bento Domingues revela que a «Igreja tem de viver em comunhão, mas na diferença. E isso nunca será fácil. Haverá sempre a tentação de um grupo querer excluir o outro, de anatemizar” (página 39). Na mesma página, o dominicano disse (março de 1995) ainda: “O que acontece hoje é que se tolera tudo a determinadas linhas de pensamento e a outras não”.

Para o biblista franciscano, Joaquim Carreira das Neves, a mariologia “também tem de ser revista, tal como outras questões como o bispo de Roma, o pecado… estamos no princípio” (página 51). Na entrevista, o franciscano sublinha: “A verdadeira Igreja não pode pegar exclusivamente em Paulo”. 

A professora de literatura, Isabel Allegro de Magalhães considera que a arte é o que, como linguagem simbólica, “mais se aproxima do religioso, por causa da tentativa de criar outros mundos possíveis, dando forma à interrogação sobre o que é o viver”. (Pág. 64). Por sua vez, o padre João Resina Rodrigues (falecido em junho de 2010) realça: “Em todos os momentos de crise, crescem os movimentos de direita. Na Igreja, nunca os seminaristas foram tão conservadores como de há 20 anos para cá” (pág. 83).

As intuições e propostas do Papa Francisco indicam que outro rumo é possível. Esta obra tem o pulsar da Igreja pretendida pelo Papa argentino.

LFS

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