«Conversas do Silêncio»: «Ninguém é culpado de não se poder despedir» – Hugo Lucas

Psicólogo clínico do Instituto de São João de Deus sublinha impacto da pandemia no processo de luto

Lisboa, 24 nov 2020 (Ecclesia) – Hugo Lucas, psicólogo clínico do Instituto de São João de Deus (ISJD), disse à Agência ECCLESIA que pandemia tornou “muito difícil de gerir” os processos de luto, com questões acrescidas quando há sentimento de “culpabilidade”.

“Aqui não existe culpa e é este o exercício que tem de ser feito, trabalhado. Ninguém é culpado de não se poder despedir, de não controlar esta situação, os potenciais agravamentos, as circunstâncias”, refere o convidado desta semana nas ‘Conversas do Silêncio’, que decorrem ao longo de novembro.

O especialista destaca o impacto das mudanças nos rituais e as limitações impostas pela pandemia no momento de despedir-se de familiares e amigos, situações que vão para lá de condicionantes ou opções individuais.

“Este processo é absolutamente doloroso para os familiares, as pessoas não têm como poder despedir-se, dizer adeus”, indica.

Hugo Lucas trabalha há 18 anos no contexto de acompanhamento de pessoas em luto e diz não se recordar de “situações em que as pessoas não se tenham conseguido despedir por imposição interna”.

“É um momento marcado por uma franca aprendizagem, de todos nós, enquanto familiares de amigos de alguém que está infetado ou no contexto da nossa prática como profissionais”, assinala.

O psicólogo clínico elogia o trabalho “meritório” dos profissionais de saúde, que assumem a tarefa suplementar de facilitar a comunicação entre doentes e famílias, “muitas das vezes uma última chamada, um último telefonema”.

O impacto é agravado, em muitos casos, pela evolução muito repentina da Covid-19, uma situação que acaba por ser quase “inqualificável” para quem a vive, em termos de luto.

“É, quase sempre, algo traumático, pelo que a experiência nos diz, e faz-se acompanhar de reações emocionais”, precisa.

Há uma natureza traumática em todo este processo: as sensações de alterações do sono, pesadelos, muita raiva, muita culpa, querer falar e não conseguir, um sentimento de desamparo e descrença total, diria mesmo de quase desespero espiritual”.

O ISJD criou um conjunto de “guias rápidos” para ajudar as famílias no contexto da doença e do luto, no contexto das equipas de apoio psicossocial do Programa Humaniza.

“Este processo do luto tem de ser ajudado. As pessoas precisam de se permitirem recordar, falar da perda, expressar as suas emoções”, sustenta Hugo Lucas.

No mês de novembro a Agência ECCLESIA apresenta as ‘Conversas do Silêncio’, publicadas online pelas 17h00 e emitidas no programa Ecclesia, na Antena 1 da rádio pública, pelas 22h45, de segunda a sexta-feira.

OC

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