Cumplicidades musicais e a ligação «íntima e profunda» entre Sergiu Celibidache e Anton Bruckner
Lisboa, 05 ago 2020 (Ecclesia) – A música acompanhou a vida do padre Adelino Ascenso, sendo companheira de noites partilhadas com artistas ou solitariamente quando jovem pintava e misturava as artes em momentos de profundidade.
“Passei noites inteiras a pintar e a escutar música, escutar mesmo. Quando eu, mais tarde, observava a pintura, vários pormenores da pintura levavam-me, no interior, a escutar a sinfonia que me tinha acompanhado durante a pintura, ao longo dessa noite”, recorda à Agência ECCLESIA o sacerdote com 66 anos.
O início desta relação terá começado na sua terra natal, junto de familiares que tocavam em “bandas filarmónicas”, e tornou-se “companheira inseparável”, quando veio para Lisboa e, mais tarde, quando viveu na Alemanha.
“Na Alemanha esta ligação profunda e íntima com a música foi alicerçada: houve vários anos seguidos em que frequentava as salas de concerto duas ou três vezes por semana e as grandes orquestras mundiais e os grandes maestros e solistas iam a Dusseldorf, onde vivia, num ambiente cultural muito intenso”, relembra.
A eleição do padre Adelino Ascenso vai para o maestro romeno Sergiu Celibidache a dirigir obras de Anton Bruckner: “Há como que uma ligação profunda, uma união entre Celibidache e Bruckner e isso é algo divinal”.
Também no campo musical o termo japonês «um tempo, um encontro» se verifica: “Muitas pessoas lamentavam a falta de gravações de obras dirigidas por Celibidache, mas, lá está, «Ichi-go-ichi-e»: um concerto dirigido por Celibidache era aquele momento único, intensíssimo. Ele nunca quis entrar no negócio discográfico porque dizia que um concerto é um acontecimento único onde há uma envolvência que não pode ser transmitida num estúdio”.
Ainda na Alemanha, o padre Adelino Ascenso conheceu um irlandês, David Adam, “grande melómano, frequentador regular dos festivais de Baireuth e de Salzburgo, casado com Irene, uma senhora alemã”.
“Tornámo-nos «companheiros da música». Íamos muitas vezes juntos a concertos e cheguei a acompanhá-lo ao Festival de Salzburgo, onde nos esgueirámos, secretamente, na sala de concertos para assistirmos ao ensaio da Sétima Sinfonia de Bruckner, pela Orquestra Filarmónica de Berlin, cujo regente, nesse ano, era, excecionalmente, Lorin Maazel, o que para mim foi uma satisfação suplementar, pois eu não simpatizava com Karajan”, conta.
Com David repetiam-se encontros ao som da música, do silêncio e da partilha intensa.
“Ele tocava piano e a primeira vez que fui a sua casa tocou o «Adagio da Sonata Patética» de Beethoven. A esposa fazia chá e deixáva-nos no gabinete de David. Escutávamos música, em silêncio, horas seguidas. A mãe dissera-lhe, quando ele era criança, «alimenta esse teu gosto pela música e nunca te sentirás só»”, relembra.
O padre Adelino Ascenso é o convidado, esta semana, do programa Ecclesia na Antena 1 da rádio pública, pelas 22h45, e das ‘Conversas aGOSTO’, publicadas online de segunda a sexta-feira, a partir das 17h00.
LS
«Conversas aGOSTO»: O amor aos livros do padre Adelino Ascenso (c/vídeo)